A diversidade étnica e cultural, a dimensão territorial, a situação econômica e a boa receptividade dos brasileiros aos estrangeiros atraem para o País imigrantes de várias partes do mundo. Grande parte busca no País melhores oportunidades de emprego, educação e melhores condições de vida. Segundo dados da PF (Polícia Federal), hoje vivem no País mais de um milhão e cem mil estrangeiros, entre as mais diferentes categorias previstas em lei, como permanentes, temporários, refugiados, anistiados, asilados e os que vivem nas fronteiras.
No Distrito Federal, o número de estrangeiros que residem aqui é de 17.393, de acordo com dados da PF. Os cinco Estados com maior número de estrangeiros são São Paulo (557.383 mil), Rio de Janeiro (232.413 mil), Paraná (52.468), Rio Grande do Sul (47.844) e Minas Gerais (30.875). O estado com menor número de imigrantes é o Tocantins (788).
No entanto, diferente daqueles estrangeiros que tentam uma vida melhor nos estados brasileiros por se identificarem com a cultura ou por gostarem do País, existe um grupo de imigrantes que luta por uma “vida livre” dentro do Brasil. São os chamados refugiados.
De acordo com o Conare (Comitê Nacional para os Refugiados), ligado ao Ministério da Justiça, pode pedir refúgio no Brasil o indivíduo que sofre, em seu país de origem, perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas e que se encontra fora de seu país ou de sua residência habitual e que não possa ou não queira voltar para seu local de origem.
Também é concedido refúgio ao cidadão estrangeiro que sofreu, em seu país de origem, grave e generalizada violação de direitos humanos e que, por isso, teve de deixá-lo. Dados do Conare de julho de 2014 mostram que existem no País 6.588 refugiados. As cinco nacionalidades que mais receberam o status de refugiados no Brasil até este período, segundo levantamento do Ministério da Justiça, foram Síria (1.250), Colômbia (1.236), Angola (1.066), República Democrática do Congo (688) e Líbano (391).
O Ministério da Justiça não sabe informar quantos imigrantes, na condição de refugiados, vivem hoje no Distrito Federal. Isso porque, de acordo com o órgão, uma vez concedido o refúgio, o estrangeiro pode viver em qualquer parte do País — o que dificulta esse tipo de levantamento. Mas dados da Polícia Federal apontam que, dos mais de 17 mil estrangeiros que vivem no DF atualmente, 10.200 são permanentes, 7.081 temporários, 66 residentes, 30 vivem na fronteira e quatro provisórios.
Como é o pedido de refúgio
O processo de solicitação de refúgio não é tão simples quanto parece. Primeiro o indivíduo, assim que chega ao Brasil, deve pedir o registro junto à autoridade migratória do Departamento de Polícia Federal nos aeroportos, portos ou na fronteira terrestre por onde ele entra no País.
Depois, o Comitê Nacional para Refugiados, responsável por conceder o pedido, decide em primeira instância sobre a solicitação. Caso seja negada, o estrangeiro pode pedir recurso junto ao Ministério da Justiça no prazo de 15 dias, contados a partir do recebimento da notificação. Se o MJ não conseguir localizar esse estrangeiro para entregar a notificação, a decisão é publicada no Diário Oficial da União e o prazo para contagem de interposição de recurso começa a ser contado. A decisão do Ministério da Justiça é irrecorrível.
Concedido o pedido de refúgio, o estrangeiro poderá trabalhar no País. O MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) expede sua carteira provisória – como determina a lei 9.474/97, que trata dos refugiados no Brasil — para o exercício de atividade remunerada. De acordo com dados do MTE, foram emitidas 14.669 carteiras de trabalho para estrangeiros no Brasil de janeiro a julho de 2014. No DF, neste mesmo período, foram 228. As nacionalidades que mais receberam o documento na capital federal foram Gana e República do Haiti.
O pedido de refúgio é estendido ao cônjuge, pais e filhos dos estrangeiros e aos membros que dependerem dele economicamente, desde que se encontrem no território nacional. Não pode pedir refúgio os indivíduos que já possuem proteção ou assistência por parte de algum organismo ou instituição das Nações Unidas que não seja o Acnur (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados).
Também não podem solicitar refúgio os estrangeiros que tenham cometido crimes contra a paz; de guerra contra a humanidade; crime hediondo; e participado de atos terroristas ou tráfico de drogas.
Perda do registro e assistência
De acordo com a lei, o registro como refugiado cessa em algumas condições, entre elas: se o indivíduo voltar a ter a proteção de seu país; recuperar sua nacionalidade; adquirir nova nacionalidade e ter a proteção do país dessa nova nacionalidade; e voltar a se estabelecer no país que permaneceu por medo de ser perseguido, além de outros casos estabelecidos pela Lei nº 9.474/97.
O indivíduo também perde sua condição de refugiado se tiver apresentado falsas declarações no momento em que recebeu o registro; agido contra a segurança nacional ou a ordem pública; saído do território nacional sem prévia autorização do governo brasileiro. Além disso, de acordo com o MJ, o refugiado não goza de imunidades penais. Se praticar algum crime, é preso e responde penalmente pelo caso. Após a condenação e o cumprimento da pena, ele poderá ser expulso do País.
Segundo o Conare, a integração total dos refugiados é feita por ONGs (Organizações Não Governamentais) que, por meio de convênio celebrado com o Acnur, administram recursos destinados aos programas referentes a inserir essas pessoas na comunidade acolhida. Tantos os refugiados que já possuem registro quanto os que aguardam julgamento do pedido têm acesso ao SUS (Sistema Único de Saúde) e à educação pública.
Pedido de permanência
Os refugiados poderão solicitar concessão de permanência definitiva no Brasil. O processo é feito via Ministério da Justiça e o pedido deve ser feito de acordo com algumas condições, como: o indivíduo deve residir no País por pelo menos seis anos como refugiado; ser profissional contratado por instituição instalada no Brasil; ser profissional de capacitação reconhecida por órgão da respectiva área de atuação; e estar estabelecido com negócio próprio de capital próprio.
Imigrantes em “Samamgana”
A situação delicada como vivem no Brasil e o medo de perderem o registro fazem com que muitos que pedem refúgio tenham medo de se expor. O R7 tentou conversar com alguns refugiados que vivem no DF para saber como é sua vida na capital federal, mas nenhum quis se pronunciar.
Apesar de não estarem no País na situação de refugiados, outros imigrantes também têm planos de viver para sempre no Brasil. Os ganeses Emmanuel, 38 anos, e Ruph Ador Awlim, 25, estão no Distrito Federal há pouco mais de quatro meses. Encontraram na Copa do Mundo a oportunidade de entrar no Brasil e aqui permanecer.
Eles dividem uma casa simples em Samambaia Norte, no Distrito Federal, com outros treze amigos também de Gana. Emmanuel e Ruph possuem carteira de trabalho, mas, por não falarem português, ainda não conseguiram trabalho. Por isso, todos os sábados, eles fazem aulas do idioma.
Os dois saíram de Gana principalmente por questões econômicas. Hoje vivem com a ajuda da Administração de Samambaia, que entrega alimentos para os estrangeiros. Os ganeses gostam de viver em Samambaia e já batizaram a região como “Samamgana”, por causa dos 250 ganeses, de acordo com dados da Administração Regional, que vivem hoje no local.
Ruph deixou os pais e irmãos para viver no Brasil. Emmanuel, a mulher e os dois filhos. Ambos pretendem trazer os parentes para viver no País.
— O Brasil é bom. Quero o visto definitivo para poder trazer minha família para viver aqui, diz Emmanuel.
O visto dos ganeses acaba em um menos de um ano e eles afirmam que querem permanecer no País. Sobre Gana, eles criticam a falta de oportunidade de trabalho, os graves problemas econômicos do país e a corrupção.
— Tínhamos a vontade vir e vimos na Copa do Mundo a oportunidade de ficar no Brasil, conta Rulph.
Especialista comenta imigração no Brasil
O professor de Direito Internacional da Unb (Universidade de Brasília) Márcio Garcia afirma que a receptividade do povo brasileiro é um dos principais atrativos para imigrantes que procuram por novas oportunidades fora de seu país de origem. Outro fator que contribui, segundo o professor, para o Brasil ser o destino dos estrangeiros está no fato de as fronteiras do Norte serem muito fechadas.
— Europa e Estados Unidos, por exemplo, são muito restritivos. A Europa, sobretudo, por questões econômicas porque senão esse contingente de pessoas estaria indo para a Europa, não pelo relacionamento interpessoal, mas pela qualidade de vida.
Segundo ele, a quantidade de imigrantes hoje no Brasil não tem incomodado os brasileiros, mas esse quadro pode mudar futuramente, quando eles se sentirem “ameaçados” pela oferta da mão de obra no mercado de trabalho.
— Se essa coisa [vinda dos imigrantes para o País] continuar no ritmo que vem, pode ser que, mais adiante, alguém pode não gostar tanto porque é uma mão de obra que disputa espaço. Se a integração dessas pessoas não for algo pensado, como os motivos pelos quais elas saíram de seu país de origem, para quais estados elas vão, se existe uma política especialmente desenhada para colher esse contingente de pessoas. Se não for algo pensado, pode ser que no futuro possamos ter problema.
Em relação à questão específica dos refugiados no Brasil, Márcio Garcia reforça que a condição deles é diferente de outros imigrantes porque, em seu caso, há perseguição de direitos individuais. O professor também acredita que a Lei nº 9.474/97 deve ser considerada uma “lei modelo no mundo” por garantir a proteção humanitária.
— A lei brasileira é, para mim, paradigma a título de considerar, sobretudo, o direito comparado. O que a gente tem alguma dificuldade é na condição do acolhimento dos refugiados. Então, eu acho que deveria ter uma política pública de inserção porque geralmente eles ficam nos grandes centros urbanos que, apesar de ter muitas convergências de oportunidades, também têm grandes problemas.