Em 4 anos, universidade ampliou vagas e melhorou conceito acadêmico. Folha salarial subiu 21%; em 2015, 60% dos investimentos foram cortados.
Relatório divulgado pela Universidade de Brasília (UnB) neste mês, com dados acadêmicos e financeiros dos últimos quatro anos, mostra que a instituição conseguiu melhorar a qualidade do ensino e da pesquisa, mas corre risco de regredir por falta de dinheiro. Em 2015, de cada R$ 10 previstos para investimento, apenas R$ 4 foram aplicados de fato.
“Quando o relatório ficou pronto, os resultados foram excepcionais. São da universidade, não da administração. Evidentemente, temos dados que não são como a gente gostaria, mas a avaliação geral é positiva”, afirmou o reitor da universidade, Ivan Camargo, que tenta reeleição para o cargo em novembro.
Um dos principais indicadores positivos obtidos pela UnB entre 2011 e 2015 foi o conceito máximo (5) no Índice Geral de Cursos do Ministério da Educação. A avaliação arredonda qualquer resultado decimal para cima – a nota “real” da UnB, em 2015, foi 4,015.
“Devemos satisfação ao MEC, que é quem financia a universidade, e passamos para a nota 5. Mas ainda está muito perto da nota 4, ainda tem espaço para crescer muito. A meta é ser a melhor universidade da América Latina, mas não é algo de curto prazo, e sim para dez anos”, afirma Camargo.
Outro indicador usado pela UnB para medir o desempenho acadêmico é a “produtividade” da pesquisa, sobretudo nos cursos de mestrado e doutorado. O reitor da universidade diz reconhecer que o critério pode ser problemático e que, como dizem acadêmicos e especialistas em educação, a produção em série pode comprometer a reflexão dos estudantes.
“Em média, temos 1,2 mil dissertações de mestrado, 450 teses de doutorado [por ano], me parece uma vitalidade enorme. Concordo integralmente com a crítica, não podemos virar ‘produtores de paper’. É preciso fazer uma análise qualitativa, mas a publicação em períodos internacionais e as citações da nossa produção [em outros trabalhos], por exemplo, são significativas”, diz.
Os dados de evasão mostrados no relatório também chamaram a atenção da reitoria. Entre 2011 e 2015, a taxa de estudantes que não chegam ao fim do curso permaneceu estável, passando de 10,9% para 10,8%. Na prática, o número indica que 1 em cada 10 vagas da UnB são “desperdiçadas” ao longo da graduação.
Questionado Camargo diz que a UnB tenta criar uma “rede de acolhimento” para evitar que o aluno seja desestimulado por reprovação ou falta de infraestrutura para pesquisa, por exemplo. “Quando fui decano de Graduação [no começo dos anos 2000], o grande motivo de evasão eram problemas econômicos. Desestrutura a família, o estudante perde esse apoio e abandona o curso.”
Investimento comprometido
Para reduzir a evasão, consolidar a expansão universitária da década passada e garantir a ascensão nos rankings nacionais e mundiais, é preciso investimento. Em um cenário de crise e sem expectativa de aumento nos aportes do MEC, a UnB teve que frear todos os planos de construir prédios, renovar laboratórios e ampliar a oferta de vagas.
Entre 2014 e 2015, o investimento total da UnB passou de R$ R$ 105,3 milhões para R$ 88,46 milhões em uma queda de 16%. A redução deve ser ainda mais intensa em 2016, já que o orçamento previsto caiu e o contingenciamento determinado pelo Ministério do Planejamento subiu de 50% para 60%.
“Temos déficit de professores e servidores. Eu acho que será muito difícil expandir o número de vagas e dar aumento real do salário”, diz Camargo. Enquanto os investimentos em estrutura caíram, entre 2011 e 2015, o gasto com a folha de pagamento cresceu 21%.
O número não foi causado por algum aumento nas contratações, e nem por um ganho real no salário-base. Segundo o reitor, a escalada nos gastos com pessoal foi causada pelo aumento da qualificação profissional e pelo impacto da aposentadoria. Para cada R$ 4 que a UnB empregou em 2015, R$ 3 foram para pagar salários.
“O número de professores com doutorado vem aumentando. Há um crescimento [do custo] por causa do peso dos aposentados e outro pela qualificação crescente. Eu fico preocupado porque, se o governo deixa de ampliar o investimento, ou corrige só pela inflação, não vai dar”, afirma.
A pressão salarial não preocupa a reitoria no curto prazo, segundo Camargo. A UnB não enfrenta greve de professores há quatro anos mas, com a estagnação dos investimentos federais e a baixa expectativa de crescimento, a negociação fica mais difícil a cada ano.
“Se comparamos o salário com o do juiz, vamos dizer que ganhamos pouco. Mas se a gente comparar com os salários de universidades públicas europeias, temos salários comparáveis”, diz Camargo. Em média, um professor adjunto chega à UnB com salário inicial de R$ 9 mil. O valor aumenta conforme o tempo na instituição, o grau de formação e o número de disciplinas ministradas.
Renda e custos
Diferentemente da maioria das universidades e faculdades públicas, que dependem exclusivamente do MEC, a UnB tem “renda própria” com o aluguel de prédios externos e de apartamentos para alunos, professores e servidores dentro do campus Darcy Ribeiro. Entre 2011 e 2015, o rendimento anual passou de R$ 31,6 milhões para R$ 35,6 milhões. A UnB passou a cobrar mais dos inquilinos.
“A gente passou muito tempo sem ajuste na taxa de ocupação. Servidores, professores e técnicos-administrativos ocupavam com taxas irrisórias, de 10% a 15% do valor de referência. Passamos para 50%, 55% e indicamos que vai chegar, em algum tempo, a 100% do valor de referência. Houve um enorme impacto, vários desocuparam”, diz Ivan Camargo.
A discussão sobre o custo-benefício das propriedades da UnB se estende por décadas e parece longe de uma solução. Há grandes áreas, como a quadra 207 Norte, à espera de construção ou venda à iniciativa privada. O único consenso aparente, até o momento, é de que o patrimônio não poderá ser desfeito para bancar custeio (salários, manutenção e insumos).
“Precisamos melhorar as condições de trabalho, investir na estrutura, nos laboratórios. Pela dificuldade de custeio, negligenciamos de certa forma a infraestrutura. Acho que não vamos conseguir dinheiro da União para investir em infraestrutura, em função da crise, então precisamos dessa receita própria”, diz o reitor.
O relatório acadêmico de 2011 a 2015 também mostra que o custo por aluno caiu. Em 2011, cada estudante exigiu gastos de R$ 15.250. Em 2015, o número caiu para R$ 9.840. Ao falar sobre os números, Camargo garantiu que eles não indicam precarização ou falta de investimento, mas “racionalização” dos gastos.
“Aí, tem várias coisas. Uma delas não tem nada a ver com a parte acadêmica, é o custo do Cespe [centro de seleção que organiza provas e concursos da UnB e de outros órgãos], que era dentro da universidade. Tudo entrava no custo do aluno. Agora que o Cespe é uma organização social, ele não entra”, diz. O Hospital Universitário de Brasília também saiu das planilhas da UnB e, agora, é gerido por uma empresa pública federal (Ebserh).