Juiz também criticou a proposta de reforma política que implementa o “distritão” e cria um fundo bilionário para financiar campanhas com verba pública
O juiz Sergio Moro, que conduz os processos da Operação Lava Jato na primeira instância em Curitiba, afirmou nesta terça-feira que este “não é um momento de vacilações” e que se preocupa com retrocessos que podem vir da falta de vontade política dos poderes Executivo e Legislativo em enfrentar a corrupção.
Moro também defendeu a manutenção do efetivo da Polícia Federal para que a Operação Lava Jato continue a todo vapor. Nos últimos meses, integrantes da força-tarefa de Curitiba foram remanejados para outros postos, a equipe foi reduzida e houve um contingenciamento no orçamento destinado à corporação como um todo.
“Não é o momento de vacilações para chegar a esse caso [a Lava Jato] até o final. Valeria a pena ter um efetivo maior”, afirmou Moro, em evento organizado pela Rádio Jovem Pan em um hotel no centro de São Paulo.
O juiz disse que o combate à corrupção não dispende tantos gastos e que compensa diante dos valores devolvidos à Justiça. No início de julho, a PF anunciou o encerramento do grupo de delegados e agentes dedicados exclusivamente à Operação Lato Jato. Na época, a instituição explicou que eles iriam compor a Delegacia de Combate á Corrupção e Desvio de Verbas Públicas.
Moro ressaltou que é preciso ter integridade para que o combate à corrupção não seja feito de maneira seletiva. “É importante que haja uma agenda suprapartidária. Quando começa a se discutir que corrupção é coisa de esquerda, é coisa de direita, você está fazendo jogo político”, disse o juiz, que fez um apelo para que a sociedade civil “force” o Congresso a emplacar esse tipo de agenda.
Reforma política
O magistrado também fez críticas às propostas de reforma política em discussão no Congresso, como a criação do fundo bilionário para financiar campanhas com verba pública e a implementação do sistema conhecido como “distritão“. “Com todo respeito ao Parlamento, essa reforma política não é uma verdadeira reforma política. Tem que ser pensada de maneira diferente para se enfrentar esse problema.”
O juiz ainda afirmou que foi acertada a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de vetar as doações empresariais, mas ponderou que a proibição poderia ser flexibilizada, como por exemplo barrar a contribuição de empresas que contratam com o poder público e impor limites de até 100.000 reais aos repasses.
Sobre a criação do fundo de 3,6 bilhões de reais para bancar campanhas, que deve ser votado na Câmara nesta semana, o juiz disse que a democracia tem custo e que simpatiza com a ideia de financiamento público, mas não como uma fonte exclusiva de patrocínio aos partidos.
Apesar de tratar de temas que são muito mais da seara política do que jurídica, Moro afirmou que não tem perfil para exercer cargo eletivo e que, apesar de considerar a política “uma das profissões mais belas”, foi enfático ao dizer que irá reiterar “quantas vezes forem necessárias” que não será candidato à Presidência da República. Dada a sua popularidade em função da Lava Jato, o juiz tem sido colocado constantemente em pesquisas eleitorais.
Condenação em segunda instância
Além da reforma política, Moro fez um discurso enfático em defesa do cumprimento de pena a partir de condenação em segunda instância, entendimento que ainda divide ministros do Supremo Tribunal Federal e que tem suscitado projetos legislativos no sentido contrário.
O juiz considerou a mudança de jurisprudência, respaldada em votações apertados no Supremo no ano passado, como uma “reforma essencial para a efetividade da Justiça criminal” e para acabar com a impunidade entre os “barões da corrupção”.
Ponderando que sua intenção não era pressionar o STF, Moro afirmou “receberia com grande surpresa” se a corte revertesse essa decisão por entendê-la como o “maior legado” deixado pelo ministro Teori Zavascki, morto em um acidente aéreo no início deste ano, defensor da medida.
O juiz foi bastante aplaudido pela plateia, formada em sua maioria por advogados, promotores, empresários, jornalistas e representantes da Polícia Militar e Civil do Estado de São Paulo. Também havia um grupo de tietes de Moro devidamente uniformizadas com camisetas de apoio à Lava Jato que compareceu ao evento só para vê-lo.