O desfile do grupo especial do carnaval carioca deste ano começa com a tradicional escola na noite de domingo (11/2)
O desfile do grupo especial do carnaval carioca deste ano, na noite de domingo (11/2), começa com a escola Imperatriz Leopoldinense, do bairro de Ramos, na zona da Leopoldina, no norte da capital fluminense, contando os 200 anos do Museu Nacional. Para chegar até lá, a escola conta com o esforço de uma grande equipe.
À frente do trabalho incessante da escola está Regina Cairo, de 72 anos e há 44 envolvida com a Imperatriz. De lá para cá, chegou a se afastar da escola por um período, mas há 30 anos é funcionária da agremiação, onde o trabalho não para durante o ano todo.
Dona Regininha, como é chamada, está à frente do trabalho incessante do barracão da Imperatriz na Cidade do Samba, na região portuária da capital. “É muito bom trabalhar dentro de uma escola de samba. A gente fica aqui o ano inteiro. Somos registrados pela escola. Aqui você tem seus amigos, uma função. É uma responsabilidade”, contou.
Na rotina da escola de samba, após o desfile, o movimento no galpão para o ano seguinte começa a esquentar em abril e se intensifica com o passar dos meses. Quando chega perto do carnaval, cerca de 230 pessoas trabalham no local. Dona Regininha admitiu que em alguns barracões, o estresse às vésperas do desfile pode ser grande, principalmente para as escolas menos organizadas. Mas a ansiedade é geral. “Quando está chegando pertinho, é terrível”, opinou.
O trabalho nos barracões é retomado após o desfile com a desmontagem dos carros alegóricos, separando o que pode ser aproveitado de materiais, como ferragens e madeira. O esforço diminui os custos do ano seguinte. Com o enredo definido, são feitos o planejamento da compra de materiais e a avaliação os recursos financeiros disponíveis para cobrir os gastos.
Além disso, é necessário contratar os especialistas que vão trabalhar nas alegorias, entre ferreiros, escultores, eletricistas e os responsáveis pelos mecanismos que serão utilizados para dar movimento na decoração dos carros.
Para este ano, o batalhão aumentou, com a contratação de engenheiros que acompanharam cada modalidade de engenharia envolvida nas alegorias. Essa foi uma das determinações do Ministério Público do Trabalho que, após uma fiscalização, interditou os barracões da Cidade do Samba entre outubro e novembro, até que tudo fosse providenciado.
Dona Regininha bota ordem no local e as solicitações são as mais diversas, desde atender às necessidades dos profissionais responsáveis pelo desenvolvimento das alegorias até ver o que é necessário para os materiais que serão usados na confecção das fantasias no ateliê montado no quarto andar do barracão. Apesar da correria, ela diz que no fim sempre dá certo.
“É um filho que tem de nascer. Tem dia e hora para acontecer. Às vezes a coisa é bem mais fácil do que a gente pensa. Ai, meu Deus, não vai dar! Mas acaba dando tempo. Nunca vi não dar certo”, contou, acrescentando que, perto do dia do desfile, no entanto, os profissionais que trabalham no barracão ficam mais nervosos, com medo dos atrasos.
Cuidar ainda da alimentação dos profissionais é outra atribuição de Dona Regininha, que administra um refeitório que funciona em todos os turnos. “Temos um café da manhã, damos almoço e uma janta, uma sopa para eles irem alimentados, embora não façam serão até tarde. A gente tem a preocupação de dar a alimentação para eles chegarem em casa já mais forradinhos. Tem gente que mora longe. Tem horário para tudo, parece jardim de infância”, disse, achando graça.
Para a funcionária da Imperatriz, o trabalho feito ao longo do ano credencia a escola na luta pelo título de campeã de 2018. A Verde e Branco conquistou o campeonato oito vezes: em 1980, 1981, 1989, 1994, 1995, 1999, 2000 e 2001.
Enredo
Este ano, o enredo Uma Noite Real no Museu Nacional homenageia o museu instalado na Quinta da Boa Vista, na zona norte do Rio. Criado por dom João VI em junho de 1818, ainda com o nome de Museu Real, o Museu Nacional é a mais antiga instituição científica do Brasil e o maior centro de visitação sobre história natural e antropológica da América Latina.
Segundo o carnavalesco Cahê Rodrigues, além da homenagem ao museu, o enredo também chamará atenção para o estado precário de suas instalações. “Quem visitou o museu há pouco tempo sabe as condições em que se encontra. O museu clama por ajuda, assim como várias instituições no país, mas a gente está falando de um bicentenário de um museu histórico. Qualquer barulho que a gente faça na imprensa para que alguém olhe com mais carinho para aquela instituição é necessário. Não é qualquer dia que uma instituição no Brasil completa 200 anos”,disse.
Cahê contou que, quando levou a proposta do enredo para a direção da Imperatriz, ela foi logo aceita. Ele relatou que os profissionais do museu se emocionaram em saber que as comemorações do bicentenário começariam com o desfile de uma escola de samba na Marquês de Sapucaí.
“Eles já tinham uma agenda de eventos que começa em junho, mas não podiam imaginar que uma escola de samba como a Imperatriz pudesse exaltar a sua história. Claro que o carnaval tem o poder de mídia e de divulgação, de agregar valores. Eles vislumbraram a possibilidade de uma repercussão gigantesca e é o que está acontecendo. Tem pessoas que nunca passaram pela Quinta da Boa Vista que estão frequentando. Tem componentes da escola com mais de 60 anos que nunca foram ao museu e o visitaram agora por conta do enredo da Imperatriz”, disse, empolgado com a possibilidade de a escola levantar uma bandeira da cultura nacional. “Isso realmente é o carnaval fazendo a sua parte na sociedade”, completou.
Tradição
O diretor de carnaval Wagner Araújo lembrou que a Imperatriz é uma escola muito ligada à comunidade, que em grande parte tem renda mais baixa, e este ano volta a passar na Marquês de Sapucaí com um enredo contando a história de reis, rainhas, príncipes e princesas, como foi em alguns anos em que levou o título.
Essa temática já é uma tradição, pois, segundo o diretor, agrada aos componentes da escola, que gostam de se sentir bem-vestidos. Em alguns momentos, outros temas não foram tão bem recebidos na comunidade.
“Já fizemos alguns carnavais em que a fantasia impressionou a comunidade negativamente, porque eram roupas simples”, afirmou Araújo, lembrando que o cuidado com as fantasias ocorreu até nos anos em que a escola teve os enredos sobre o jogador Zico, os cantores Zezé de Camargo e Luciano e o líder sul-africano Mandela.
Dona Regininha concorda. “Eu gosto de ver a suntuosidade da coisa. A Imperatriz acostumou a gente assim, a ver carnavais bonitos. Eu venho de carnavais com Arlindo Rodrigues, um mestre. Este tipo de enredo eu gosto”, acrescentou.
Desfile da comunidade
A Imperatriz Leopoldinense vai este ano para a avenida com 2600 componentes no chão e 110 nas alegorias. Como não tem ala comercial, a escola paga todas as fantasias, que são distribuídas para pessoas que frequentam a agremiação e para comunidades da zona da Leopoldina, próximas à quadra.
Wagner Araújo destacou que, durante anos, as alas das escolas vendiam as fantasias por preços elevados e apenas baianas, os ritmistas da bateria, a velha guarda, as alas infantis e os passistas ganhavam o figurino. A mudança, segundo ele, foi para melhor. Os componentes entram na avenida mais identificados às escolas e cantam o samba com mais força, um bom caminho para conseguir notas mais altas no quesito evolução.