A quatro meses das eleições de 2018, o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) abriu o cofre para quitar dívidas de uma área estratégica, especialmente para quem sonha em se manter no comando do Palácio do Buriti. Em edição extra do Diário Oficial do DF na quinta-feira (21/6), a Secretaria de Comunicação liberou o pagamento de R$ 4.015.697,78 a três agências de publicidade. O valor se refere a campanhas institucionais do GDF feitas ainda em 2014.
As agências de publicidade têm papel de destaque em campanhas, pois cabe a elas trabalhar a imagem dos clientes. Essas empresas recebem recursos do governo e produzem peças veiculadas em diversas mídias, como outdoors e veículos de grande circulação. Os políticos que amargam baixos índices de popularidade costumam investir pesado em propaganda na tentativa de reverter a má impressão do eleitorado.
A maior dívida a ser paga é com a Agnelo Pacheco Criação e Propaganda Ltda., no valor de R$ 2.204.680,62. Em seguida, vem o saldo em aberto com a CCA Comunicação e Propaganda Ltda., da ordem de R$ 1.353.516,31. Por fim, a Propeg Comunicação S/A – que ainda presta serviço para o GDF – tem a receber R$ 457.500,85.
No texto publicado no DODF, a Subsecretaria de Administração Geral da Secretaria de Comunicação determina a emissão das notas de empenho, de liquidação e previsões de pagamento aos credores. As normas e condições desses pagamentos estão previstos no Decreto nº 39.014/2018.
Prioridades questionáveis
A liberação de recursos a poucos meses da campanha chamou a atenção de Alexandre Bandeira, mestre em administração pela Universidade de Brasília (UnB) e diretor da Strattegia Consultoria.
Para o especialista, o pagamento às agências de publicidade demonstra que as prioridades de Rollemberg são diferentes dos anseios da população. O GDF tem débitos pendentes em áreas como saúde e transporte público, e os R$ 4 milhões poderiam ajudar a mitigar os problemas estruturais dessas setores.
“É estranho o fato de o GDF ajustar pendências com empresas de comunicação às vésperas do pleito eleitoral, marcado para 7 de outubro. Para quem não tem nada a perder, é uma tentativa de frear a produção de pautas negativas”, diz Bandeira.
A gestão Rollemberg tem falhado em áreas cruciais, como saúde, educação e segurança. E não deve mudar a sua imagem com base em propaganda, segundo o especialista.
É preciso ter prestado um bom serviço. Liquidar faturas não muda, da noite para o dia, a imagem de gestores. Existe uma máxima importante: quanto melhor o governo, menor a necessidade de se investir em comunicação. O povo percebe o benefício. Não precisa ser convencido de que ele existe“
Contradição
Para o professor e cientista político da UnB Aurélio Maduro de Abreu, a liberação dos recursos contradiz o mantra que Rollemberg vem repetindo, de que não tem dinheiro em caixa.
“O governo deveria dar transparência de quanto recurso tem em caixa e o quanto poderia pagar. Passou quatro anos dizendo que não tinha dinheiro, mas, casuisticamente, achou recurso para pagar empresas que prestaram serviço do governo anterior. O que a sociedade clama é transparência”, disse Abreu.
O outro lado
Segundo o secretário de Comunicação do DF, Paulo Fona, os pagamentos vêm sendo feitos desde 2016, inclusive em outras áreas, como saúde, educação e obras. “Esse é o padrão: quitar o que o governo anterior deixou”, ressaltou o secretário.
A reportagem entrou em contato por telefone e e-mail com as empresas CCA Comunicação e Propaganda Ltda; Propeg Comunicação S/A e Agnelo Pacheco Criação e Propaganda para esclarecimentos sobre as dívidas. Ninguém quis se pronunciar oficialmente.
No entanto, sob a condição de anonimato, o gestor de uma das empresas comentou a decisão do GDF. “Um atraso de quatro anos traz muitos transtornos para a empresa. Tivemos que demitir funcionários e acabamos fazendo o repasse para os veículos de comunicação fora da data”, afirmou.
Segundo ele, muitas vezes a empresa é quem transfere os valores para os veículos de comunicação a partir da confecção de publicidade e isso acaba gerando um “efeito cascata”. “Deixamos de fechar com o GDF e estamos só com entidades privadas no momento. Confirmamos o pagamento, mas o atraso é prejudicial para toda a cadeia”, completou.
Dívidas
Com as chamadas Dívidas de Exercícios Anteriores (DEAs), o GDF calcula um rombo de aproximadamente R$ 54 milhões só com publicidade. O valor refere-se aos gastos com a área deixados pela gestão do petista Agnelo Queiroz. Ainda segundo o Executivo, somados todos os setores, como saúde e educação, o déficit chega a R$ 1,2 bilhão.
A dívida com fornecedores herdada pelo governo Rollemberg era de aproximadamente R$ 1,2 bilhão. Em três anos, foram quitados cerca de R$ 853 milhões, segundo a Secretaria de Fazenda. A expectativa do Executivo local é sanar o restante até o fim do mandato.
No entanto, muitas empresas ainda reclamam da falta de pagamentos. Na área de tecnologia da informação (TI), credores cobram em torno de R$ 150 milhões referentes a contratos assinados pela gestão anterior, de acordo com o presidente do Sindicato das Empresas de Serviços de Informática do Distrito Federal (Sindesei-DF), Marco Túlio Chaparro. Só no âmbito da saúde, o débito é estimado em R$ 10 milhões.
“Tem muita dívida de 2014 que algumas companhias estão começando a receber. A gente não sabe por que exatamente agora, coincidentemente em ano de eleição”, afirma Marco Túlio Chaparro.
Ainda há passivos com empresas da construção civil. Segundo o presidente da Associação Brasiliense de Construtores (Abrasco), Afonso Assad, a dívida do governo petista é de R$ 110 milhões: R$ 50 milhões junto à Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap); R$ 50 milhões do Serviço de Limpeza Urbana (SLU); e R$ 10 milhões das secretarias de Saúde, Educação e Infraestrutura. De acordo com Assad, os empresários esperam receber em breve.
Pagamento
Dos mais de R$ 300 milhões a serem pagos ainda em 2018, R$ 180 milhões são de despesas da Secretaria de Saúde, informou a Fazenda. O restante diz respeito a valores devidos em áreas como infraestrutura, mobilidade, educação, na Novacap e no SLU e comunicação. Além de recursos para a Saúde, sendo desembolsado R$ 50 milhões em 2018.
A coordenadoria de Tecnologia da Informação da Secretaria de Saúde informou que “as dívidas com as empresas de TI são relacionadas a processos de improbidade das gestões anteriores, mais especificamente aos ligados a escândalos como o da Caixa de Pandora e entre 2010 e 2014, quando o GDF foi afetado pela falta de recursos”.
No caso das empresas de transporte, o débito do GDF está em torno de R$ 122 milhões. A administração anterior deixou um passivo de R$ 96 milhões. Desse total, R$ 56 milhões foram pagos e R$ 40 milhões estão sub judice, de acordo com dados do Transporte Urbano do Distrito Federal (DFTrans).