Novos dados revelam que 1,4% das crianças entre 9 e 10 anos apresentam algum transtorno alimentar, como anorexia e compulsão alimentar
Apesar de ser considerado um problema adolescente, os transtornos alimentares podem surgir na infância. Aliás, o número de crianças que apresentam esses distúrbios é maior do que se imaginava. Segundo um estudo publicado na revista JAMA Pediatrics, a incidência de anorexia e compulsão alimentar pode ser até 14 vezes maior do que os dados divulgados por pesquisas anteriores.
Outro dado interessante é que, nessa fase, o número de meninas e meninos afetados é semelhante. Enquanto na puberdade e na idade adulta, os transtornos alimentares são mais comuns no sexo feminino. Esse informação surpreende, pois existe uma crença geral de que anorexia e bulimia são “problemas de menina”, quando, na verdade, também afetam o sexo masculino desde muito cedo.
Para Aaron Blashill, que liderou a pesquisa, o principal motivo para essa aparição precoce é o fato de que as crianças estão mais suscetíveis a apresentar transtornos psicológicos, como ansiedade e depressão, que podem desencadear ou piorar os sintomas de distúrbios alimentares. Um estudo anterior realizado pela Universidade Columbia, nos Estados Unidos, já havia apontado que comorbidades psiquiátricas na infância estão amplamente associadas ao desenvolvimento de outras doenças psicológicas.
Outra explicação para o fenômeno pode estar relacionada aos padrões de beleza e ao conceito de felicidade. Um levantamento feito em 2014 pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo mostrou que 46% das meninas entre 10 e 24 anos acreditam que pessoas magras são mais felizes. Essa mesma pesquisa mostrou que 77% das jovens paulistas estão propensas a desenvolver distúrbios alimentares. Diante disso, é necessário que os pais e médicos fiquem atentos aos primeiros sinais para conseguir evitar que o problema se agrave.
Primeiros sintomas
Um estudo publicado no passado, realizado por pesquisada da Universidade Newcastle, no Reino Unido, mostrou que crianças que apresentam dismorfia corporal – problema em que o indivíduo tem uma imagem distorcida e crítica do próprio corpo – tendem a manifestar sintomas sutis aos nove anos de idade. Para até 60% das meninas, essa idade pode cair para seis anos.
Se os sintomas não forem notados nesta fase, é possível que ao chegar aos 12 anos as crianças já tenham desenvolvido uma condição mais grave, o que pode dificultar o tratamento. Por causa disso, os pesquisadores envolvidos no novo estudo ressaltaram que os adultos precisam aprender a reconhecer os sinais precoces do problema para evitar graves consequências.
“Os pais devem tentar ser discretamente conscientes do comportamento alimentar dos filhos em relação à comida. Eles frequentemente falam sobre fazer dieta? Parecem preocupados com a gordura do corpo ou têm vergonha da própria aparência? Esses pensamentos podem ir e vir rapidamente, mas quando surgem ao mesmo tempo e não vão embora, os pais não devem hesitar em discutir suas preocupações com um médico.”, alertou Elizabeth Evans, principal autora da pesquisa anterior, ao Daily Mail.
Novas descobertas
Para chegar aos novos dados, a equipe da Universidade de San Diego, nos Estados Unidos, analisou mais de 4.500 crianças entre 9 e 10 anos que participaram do estudo de Desenvolvimento Cognitivo do Cérebro Adolescente (ABCD) em 2016 e 2017. Os distúrbios avaliados incluíam anorexia nervosa, bulimia nervosa e compulsão alimentar. Outros transtornos menos comuns foram agrupados em uma mesma categoria. O diagnóstico de transtorno alimentar foi determinada através do pai ou responsável.
A análise indicou que 1,4% dos participantes tinham algum transtorno alimentar diagnosticado – esse número é 14 vezes maior em comparação com dados divulgados anteriormente (0,1%). Deste total, 0,6% sofria de compulsão alimentar, 0,1% tinha anorexia e 0,7% apresentou outros distúrbios menos conhecidos. Os pesquisadores destacaram que nenhuma das crianças foi diagnosticada com bulimia.
A equipe ainda ressaltou que o sexo só se torna um fator de risco para alguns transtornos alimentares durante a adolescência. “Pesquisas anteriores com adolescentes entre 13 e 18 anos não encontraram diferenças sexuais na prevalência de anorexia nervosa. No entanto, surgiram diferenças para a bulimia nervosa e compulsão alimentar periódica, com maior prevalência nas meninas”, explicou Blashill.
Bulimia versus anorexia
A bulimia nervosa é caracterizada pela compulsão alimentar, seguida de arrependimentos. Apesar de apresentar peso normal (ou mesmo sobrepeso), o paciente tenta se livrar do que ingeriu através do uso de laxantes ou vômito intencional. Pacientes com esse distúrbio sofrem com dor de estômago, diarreia, tontura e fraqueza – provocados pela perda de líquidos -, além de erosão do esmalte dos dentes – causado pela agressão do suco gástrico durante o vômito. Esse problema é mais comum em jovens entre os 16 e 25 anos.
Já anorexia nervosa é mais comum em adolescentes entre 12 e 18 anos, sendo caracterizada pela perda constante de peso – com índice de massa corporal (IMC) abaixo de 17,5 -, especialmente porque o indivíduo come muito pouco (ou nem come) para conseguir emagrecer. Pela falta de ingestão de alimentos, há risco de desnutrição severa que pode causar parada cardíaca, falência de órgãos e insuficiência renal; todas essas doenças podem levar à morte. Segundo especialistas, esse é o transtorno mental com maior índice de mortalidade.
Fonte: Portal Veja