A artista se dedica à arte há mais de 30 anos. Recentemente um dos principais espetáculos da atriz e diretora completou a centésima apresentação
A arte pode aparecer em diferentes formas e é um dos instrumentos de comunicação mais antigos do ser humano. Música, poesia, interpretação, expressão corporal, acrobacias… O teatro, por vezes, tem uma ou várias delas em uma única peça. O fundamental é transmitir a mensagem que se pretende e levar emoção à audiência. As diversas possibilidades conquistam artistas, como Maíra Oliveira, que faz do palco a sua casa.
A artista, natural de Brasília, recebeu influência de berço. Filha de Ary Pára-Raios, fundador da companhia teatral Esquadrão da Vida, nasceu com a dramaturgia no sangue. “Eu descobri que era atriz aos 16 anos enquanto ensaiava Na rua com Romeu e Julieta com a companhia do meu pai. Entendi, ali, que essa era a minha história. Nem sei se é uma escolha minha, na verdade é quem eu sou. É o meu grande amor”, revela.
Mas a história não começou ali. Ary fundou a companhia em 1979 e produzia peças de rua sem texto até 1993. Nesse período, o grupo saía com os rostos pintados espalhando alegria para quem por eles passava. Maíra, ainda criança, deu ali os primeiros passos. “Meu pai foi meu mestre. Foi ele que me mostrou o que é o teatro”, explica.
“Eu comecei no Esquadrão, mas depois decidi fazer vestibular para a Universidade de Brasília em artes cênicas. Eu já era atriz e trabalhava com a companhia, mas senti uma necessidade interna de ter essa experiência diferente da que tinha com meu pai”, confessa Maíra, que se dividia entre os estudos e o trabalho com o grupo teatral. “Quando entrei na faculdade, eu tinha certeza que a minha história era com o Esquadrão, adoro estar na rua”, complementa.
De lá pra cá, ela não parou mais e, após a morte do pai, manteve o Esquadrão da Vida ativo. Hoje, aos 42 anos, já se apresentou em todas as regiões do país, mas não esconde a cidade preferida. “Minha identificação é com Brasília. Nunca tive o desejo de me mudar para um grande centro. Nossa cena é jovem, mas cresce cada vez mais como centro cultural”, explica.
Resistência
A peça Quando o coração transborda, que chegou à centésima apresentação no último fim de semana, conta a história do Esquadrão da Vida e da relação de Maíra Oliveira com o pai Ary Pára-Raios. “Eu escolhi comemorar a ocasião em Brasília e no Espaço Renato Russo. É um espaço de resistência, que faz parte da história do grupo, foi recém-reformado e sobrevive sem a ajuda do poder público. É uma alegria estar lá”, celebra.
Maíra conta que, antigamente, o local era apenas um galpão e abrigou muitos momentos vividos pelo pessoal do Esquadrão desde o início da década de 1980. Ideias, brigas, ensaios e até a escolha para o nome. “O nome Esquadrão da Vida surge em oposição ao Esquadrão da Morte da ditadura (militar). Nós estávamos ali para combater a ‘caretice’. Era subversivo dizer que fazia parte do grupo”, destaca.
Futuro
“A cidade conta com o FAC (Fundo de Apoio à Cultura). Os editais são muito importantes. Tenho contato com pessoas de cerca de 500 grupos de teatro no Brasil e, quando conto que recebi dinheiro do governo para produzir minhas apresentações, eles duvidam. Mesmo colegas de estados com mais dinheiro, como São Paulo, não têm essa possibilidade”, revela.
O investimento contribui para que o cenário cultural se expanda na capital federal. Maíra revela que outros colegas, assim como ela, também escolheram ficar em Brasília. “Roberto Corrêa é um dos melhores violonistas do Brasil e do mundo, trabalha em peças comigo e decidiu seguir na cidade”, relata.
Dificuldades
Segundo Maíra, a realidade do artista não é simples. Amigos têm resistência à atividade da atriz. “As pessoas me perguntam o que eu faço. Digo que sou atriz e eles respondem, ‘tá, mas o que você faz para viver?'”, relata. “Muita gente tem dificuldade em entender que é o meu trabalho. Quando não estou me apresentando, estou ensaiando, produzindo”, completa.
Para ela, o cenário ainda piorou recentemente. “Hoje vejo o futuro sem muito otimismo. Me vejo tateando no escuro frente a ações como fim do Ministério da Cultura. Os artistas são colocados como ‘aproveitadores do Estado’, mas o teatro nasceu junto com a humanidade”, desabafa.
No entanto, ela se mostra resistente e se inspira no pai. “Ele não teve uma vida fácil. Costumava dizer que tínhamos que matar um leão por dia. Não teve uma vida fácil, mas viveu as delícias do teatro, morreu jovem (aos 64 anos), mas fazia o que gostava”, conclui. Fonte: Portal Correio Braziliense