Mesmo com o clima ainda tenso entre o Palácio do Planalto e o Congresso, existe um discurso alinhado de integrantes do Executivo e do Legislativo em favor da aprovação da proposta da reforma da Previdência. Foi o que se viu nesta quarta-feira (22/5) no seminário “Por que a reforma é crucial para o futuro do país?”, promovido pelo Correio Braziliense e pelo Estado de Minas, e que contou com as participações do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia.
O evento contouainda com a presença de atores importantes no cenário político, empresarial e técnico, e o debate teve um nível elevado. Especialistas mostraram em planilhas a dramaticidade do cenário fiscal e a urgência dessa reforma que tramita na comissão especial da Câmara. Durante as apresentações, Guedes e Maia mostraram, em painéis diferentes, sintonia. E trocaram elogios. Ambos demonstraram estar empenhados em tirar a reforma do papel e demonstraram otimismo na aprovação.
O chefe da equipe econômica de Jair Bolsonaro sinalizou que, mesmo com alterações pontuais, a expectativa de economia esperada, de R$ 1,2 trilhão em 10 anos, deverá ser mantida. O ministro defende que esse valor é necessário para que o governo implemente o sistema de capitalização, ou o que ele agora chama de “poupança garantida”, para os trabalhadores mais jovens. “Estou absolutamente confiante na aprovação da reforma da Previdência”.Maia, defensor da reforma, destacou que o salário elevado dos servidores empurrou o país apara esse desequilíbrio fiscal que exige a reforma da Previdência. Entretanto, reconheceu que será difícil manter os estados na reforma, apesar de continuar defendendo um sistema único. “Não adianta resolver parte da doença do corpo, porque se deixar a outra parte doente, morre o corpo inteiro. A federação é um sistema”.
Pelos mais pobres
O ministro da Economia, Paulo Guedes, mostrou que tem fôlego para defender a reforma da Previdência. Tanto que falou por quase uma hora na abertura do seminário “Por que a reforma é crucial para o futuro do país?”, realizado pelo Correio e pelo Estado de Minas, com o apoio da Confederação da Agricultura e a Pecuária do Brasil (CNA), da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).
Durante a explanação, Guedes não poupou críticas aos opositores da reforma e reforçou que o atual sistema já é injusto para com os mais pobres. “A Previdência atual é uma fábrica de privilégios. Tira dos menos favorecidos e transfere aos mais ricos. O que estamos querendo fazer é reduzir as desigualdades. E é evidente que o lobby contra a reforma está aqui em Brasília. Não é o Brasil”, afirma. Nesse sentido, ele defendeu que servidores públicos, incluindo políticos e juízes, também precisarão contribuir mais para a Previdência, e que isso não é confisco. Guedes ressaltou que eles precisarão trabalhar por mais tempo para se aposentarem, pois a idade média dos mais pobres é justamente a sugerida na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) — de 65 anos para homens e de 62 anos para as mulheres. A idade média de aposentadorias no funcionalismo é inferior a 50 anos.
Ao mostrar o desequilíbrio das contas públicas, o ministro reforçou o discurso de que o país gasta mal os recursos públicos, pois eles não foram devidamente empregados para o benefício da população nas últimas décadas. “O governo virou um aparato de transferência de renda. O Orçamento público foi capturado pelas corporações públicas e também pelos piratas privados”. Guedes afirmou que está “absolutamente confiante” de que a reforma da Previdência será aprovada pelo Congresso sem muitas alterações, porque a parte política “fará a sua parte” e manterá o impacto em torno de R$ 1 trilhão em 10 anos. Segundo ele, esse valor é o combustível para o sistema de capitalização, que ele denominou de “poupança garantida”.
Ele, inclusive, pediu ajuda da imprensa e denominou de “fake news” as informações de que a reforma vai prejudicar os mais pobres e de que a capitalização no Chile fez as pessoas se suicidarem. “O sistema de repartição causa mais suicídio no Brasil do que o de capitalização no Chile, e muito mais em Cuba. Essas são verdades que a mídia tem que filtrar, apurar e transmitir também”, aponta.
Questão fiscal
Para Guedes, sem resolver a questão fiscal, que passa pela reforma, o país não voltará a crescer, pois uma das maiores despesas de hoje é a Previdência, que custa R$ 750 bilhões por ano. “Gastamos, hoje, mais com idosos do que com os nossos jovens”, criticou ele, lembrando que o orçamento da Educação é de R$ 70 bilhões, ou seja, 10 vezes menos do que os gastos com aposentadorias.
O ministro voltou a comparar o sistema de aposentadoria atual a um avião com várias bombas-relógio armadas, como a questão demográfica, os privilégios e o sistema de financiamento do regime de Previdência — “que mata o emprego” porque o custo de um trabalhador para o empregador é o dobro do salário que ele recebe. Além disso, ele lembrou que, cada vez mais, diminui o número de jovens que contribuem para pagar os benefícios dos idosos. “O sistema está quebrado. Daqui a 40 anos serão dois jovens para cada idoso. Aí, o avião vai cair para nossos filhos e netos. Não poderemos seguir com essa ameaça”, alertou.
Guedes reforçou que o segundo passo do governo, após a reforma da Previdência, será privatizar, e os recursos serão destinados para reduzir a dívida pública. Ele voltou a lembrar que a conta de juros da dívida está, atualmente, em torno de R$ 400 bilhões por ano. “Com as privatizações, vamos travar essa despesa, que é uma vergonha para o Brasil”, afirmou. O ministro ressaltou que o terceiro maior gasto do governo federal é a despesa com pessoal, que também será atacada, pois 40% dos servidores vão se aposentar nos próximos cinco anos. Nesse sentido, ele defendeu a redução da máquina pública, diminuindo o número de certames para novas contratações. “Vamos travar os concursos. Vamos ter uma classe burocrática de mais qualidade, com menos gente mais bem paga e mais produtiva”, frisou.
Produtividade
“O Brasil é uma anomalia”. Com essas palavras, o economista Paulo Tafner buscou definir o país e a necessidade da reforma da Previdência, em outro painel do seminário do Correio. Na avaliação do especialista em Previdência e pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), da Universidade de São Paulo (USP), essa anomalia existe porque o país gasta muito, como um país rico, mas ainda é pobre e, nesse sentido, vai quebrar antes mesmo de “cometer suicídio”.
“Estamos cada vez mais perto dos países mais pobres e insistimos em nos comportar como se ricos fôssemos”, alerta. De acordo com Tafner, esse quadro dramático das contas públicas existe porque as despesas com a Previdência crescem R$ 50 bilhões por ano, e o deficit das aposentadorias dos sistemas público e privado correspondem a 5% do PIB. Para piorar, o bônus demográfico está acabando — termina em 2021, segundo ele. Esse período, iniciado nos anos 1960, é considerado áureo para qualquer economia, porque havia, desde então, muito mais gente trabalhando do que idosos e crianças.
Logo, isso ajudaria no aumento da produtividade do país, mas o Brasil desperdiçou a oportunidade. Ao longo da época do bônus, lembrou Tafner, foram adotadas medidas populistas desde os governos militares, e escolhas erradas acabaram sendo tomadas ao longo das últimas décadas. Agora, é preciso acelerar as reformas para não perder o restinho desse período. Para piorar, o processo de envelhecimento da população está mais acelerado no Brasil do que em outros países, seja na América Latina, seja na Europa, seja na Ásia.
“O Brasil escolheu ficar velho e pobre”, lamenta. Ao comparar com outros países que aproveitaram o bônus, conseguiram melhorar a produtividade e enriqueceram, como a Coreia do Sul, que tinha a renda per capita parecida com a do Brasil na década de 1970. Conforme dados apresentados por Tafner, o país será um dos 10 países com a população mais envelhecida do mundo no próximo século, mas não se preparou para esse cenário. “Aproveitamos o bônus com os militares mais populistas, mas o fato é que o populismo custou pela crise de inflação (da década de 1980). A produtividade despencou e já perdemos o bônus. Ele andou e a produtividade não andou. O bônus acaba e sepultamos o caixão de forma definitiva”.
Fonte Correio Braziliense