Mais uma peça no quebra-cabeça sobre a morte de Juscelino Kubitschek foi encaixada, ontem, pela Comissão da Verdade de São Paulo, com o depoimento do motorista Josias Nunes de Oliveira, de 69 anos, acusado à época de ter provocado o acidente que causou a morte do ex-presidente. Ele contou que recusou uma mala de dinheiro oferecida por dois homens que foram de motocicleta a sua casa para que assumisse o crime. “Queriam que eu me declarasse culpado e disseram que, se eu não pegasse o dinheiro, bateriam em mim”, afirmou. Oliveira dirigia um ônibus de viagem no momento do desastre, em 22 de agosto de 1976, e foi absolvido duas vezes em processo que ouviu nove passageiros que estavam presentes no veículo conduzido por ele.
Segundo o presidente da Comissão da Verdade, vereador Gilberto Natalini (PV), o depoimento prestado ontem por Oliveira reforça a desconfiança na versão oficial. Nela, o Chevrolet Opala em que JK viajava de São Paulo para o Rio de Janeiro teria sido fechado pelo ônibus da Viação Cometa — dirigido por Josias —, cruzado o acostamento e atingido por uma carreta. “Havia uma articulação forte tentando mostrar que o Juscelino morreu em um acidente e tentando incriminar o motorista. Nós, cada vez menos, acreditamos nisso”, afirma Natalini. Contudo, em entrevista concedida ao Estado de Minas, em junho do ano passado, Josias Oliveira disse acreditar que a morte do ex-presidente não havia sido obra de um atentado. “Foi acidente. Acidente mesmo. O duro é que ele (JK) estava com a passagem de avião no bolso”, afirmou, na primeira vez que falou para a imprensa desde a época do acidente. Juscelino iria para Brasília e seguiria para o sítio em que morava em Luziânia (GO), mas foi convocado para uma reunião no Rio e mudou de planos.
Na semana passada, o governo de Minas reuniu-se com a Comissão da Verdade de São Paulo e decidiu acatar o pedido para que nova investigação seja feita em um fragmento metálico encontrado no crânio de Geraldo Ribeiro, motorista que dirigia o carro em que estava JK, funcionário do ex-presidente por 36 anos. Uma perícia no corpo chegou a ser feita em 1996, constatando que havia um pequeno orifício na cabeça. O laudo oficial relata que se tratava de um pedaço de prego do caixão que perfurou o crânio de Geraldo, mas a comissão pediu que nova exumação seja feita para apurar a questão. Na entrevista que concedeu ao jornal mineiro no ano passado, Josias disse: “Não teve nenhuma explosão antes (do acidente). Se alguém atirou no motorista, eu não vi, mas acredito que é muito difícil”.
Sofrimento
Na audiência de ontem, Josias, que vive de aposentadoria em Indaiatuba, no interior de São Paulo, chorou mais de uma vez e afirmou que quer ser indenizado pelo sofrimento que passou. Em seu depoimento, ele falou que não houve acidente envolvendo o ônibus. Gilberto Natalini considerou relevante a informação. Para o vereador, outro ponto importante do depoimento do motorista foi a parte em que ele lembrou do laudo do processo que dizia haver tinta do carro em que estava o ex-presidente na lateral do coletivo, indicando uma batida.
“Quando foram verificar, a tinta era da Rodoviária de São Paulo e não tinha nada a ver com o ônibus. E o laudo não estava nem assinado. Havia uma movimentação de militares para abafar a história”, relatou Natalini. Além de Josias, o primo de JK e ex-deputado federal Carlos Murilo Felício dos Santos deve ser ouvido pela comissão.
(foto:Carro em que ex-presidente estava)