Quatro anos após a última reforma trabalhista, o governo federal defende uma nova reformulação nas regras das relações de trabalho. Para isso, a gestão Jair Bolsonaro encomendou um estudo que propõe, entre outras medidas, a liberação do trabalho aos domingos e a proibição do reconhecimento de vínculo de emprego entre prestadores de serviço e aplicativos, como Uber e 99.
Tais medidas só serão possíveis se o Congresso Nacional aprovar alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e na Constituição Federal. Por isso, um grupo instituído pelo Ministério do Trabalho e Emprego, comandado por Onyx Lorenzoni, preparou sugestões para minutas de projetos de lei e emendas à Constituição. O texto já foi concluído, mas ainda está sob avaliação.
São ao menos 330 mudanças em dispositivos legais. Há a inclusão de 110 regras — entre artigos, parágrafos, incisos e alíneas —, a alteração de 180 e a revogação de 40 delas.
No ‘bolo’ de sugestões há a previsão de teste de gravidez antes da dispensa da trabalhadora mulher, limitação da chamada substituição processual aos associados de um sindicato, admissão de sindicatos por empresa ou setor produtivo, entre outras, como a legalização do locaute. Isto é, a recusa por parte da entidade patronal em ceder aos trabalhadores os instrumentos de trabalho necessários para a sua atividade.
A principal das mudanças, porém, é a relacionada aos domingos. Se ela for aprovada, um trabalhador poderá ter direito a folgar nesse dia apenas uma vez a cada dois meses. A proposta não é nova. A medida já havia sido tratada na tramitação da MP que deu origem à Lei de Liberdade Econômica. A ideia, no entanto, foi rejeitada pelo Senado.
A sugestão do GT altera o artigo 67 da CLT e diz que “não há vedação ao trabalho aos domingos, desde que ao menos uma folga a cada 7 (sete) semanas do empregado recaia nesse dia”.
“Hoje, para trabalhar aos domingos e feriados, é necessário: estar na lista de atividades autorizadas pela Secretaria Especial do Trabalho [convertida em ministério], ou possuir autorização de entidade sindical, mediante convenção ou acordo coletivo”, diz trecho do relatório, argumentando que a medida pode trazer benefícios para os níveis de emprego.
Advogados pessimistas com mudanças
Advogados trabalhistas ouvidos pelo Jornal do Commercio, no entanto, discordam desse ponto de vista. “A mudança no trabalho aos domingos é um retrocesso social. Foram anos e anos de conquistas de direitos, garantindo o repouso a cada três domingos trabalhados. Quando isso é retirado de forma abrupta do trabalhador é, de fato, um retrocesso”, defende João Galamba, advogado trabalhista e sócio do escritório Galamba Félix.
Na mesma linha, a advogada Cíntia Fernandes, especialista em direito do trabalho e sócia do escritório Mauro Menezes & Advogados, “a nova regra inverteria o conceito de que o trabalho aos domingos é excepcional para ‘é sempre possível”’.
Ela diz também que a nova reforma tende a ter desempenho semelhante à anterior, que, segundo ela, após quatro anos de sua aprovação confirma a incompatibilidade do discurso sobre o aumento da empregabilidade mediante a supressão de direitos.
“A ideia da reforma era modernização, flexibilização e geração de empregos. Ocorre que, depois de quatro anos, vemos que não trouxe os avanços esperados, pelo contrário, diante de todo cenário, temos o aumento do desemprego e a precarização das relações de trabalho. Assim, aumentaram a informalidade e a falsa pejotização”, afirma ela.
A sugestão da realização do teste de gravidez em mulheres antes de eventual dispensa “como forma de proteção à garantia de emprego da gestante”, porém, é bem recebida pos especialistas, mas eles afirmam que o assunto ainda deve ser alvo de bastante debate.
“Hoje essa é uma questão entendida como discriminatória, inclusive com a existência de uma lei que veda a realização de exames de sangue ou urina no empregador dispensado”, explica o advogado Luiz Heinze, do escritório H&W Advocacia, reconhecendo que a sugestão visa diminuir as inseguranças jurídicas e evitar reclamações trabalhistas futuras.
Na avaliação da advogada Anna Carolina Cabral, especialista em direito do trabalho, do escritório Queiroz Cavalcanti Advocacia, a medida não é necessária para proteção das mulheres grávidas. “Atualmente, as empregadas gestantes já têm proteção da lei. Então, essa iniciativa até poderia aumentar a proteção das gestantes, mas ela não seria indispensável para esta finalidade”, conclui.
O que está sendo estudado?
- Não reconhecer vínculo de emprego entre prestadores de serviços e aplicativos;
- Liberar trabalho aos domingos para todas as categorias;
- Responsabilização do empregado, quando treinado e equipado, pela falta de uso do equipamento de proteção individual em caso de acidente de trabalho;
- Previsão de teste de gravidez antes da dispensa da trabalhadora mulher;
- Ajustes nas regras do trabalho intermitente;
- Limitação da chamada substituição processual aos associados de um sindicato;
- Quitação de acordo extrajudicial seria completa, e o juiz, proibido de homologá-lo parcialmente;
- Indenização por danos morais com o o teto dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social como parâmetro, em vez do salário do trabalhador, como previa a reforma de 201;
- Aplicação do IPCA-E em vez da TR, como previa a reforma de 2017, ou da Selic em correção monetária de créditos trabalhistas;
- Aplicação de leis trabalhistas novas aos contratos vigentes a fim de evitar questionamentos como os feitos em relação à reforma de 2017;
- Liberdade sindical ampla, proposta por meio de PEC;
- Descartar como obrigatório o uso dos conceitos de categorias e sistema confederativo para conceituação de sindicatos;
- Admitir sindicatos por empresa ou setor produtivo;
Fonte: Uol