Fosse qualquer jogo que não um clássico, talvez o Atlético-MG tivesse conseguido nesse domingo uma vitória mais tranquila. Mas clichês existem por um motivo. “Não há favorito”, “jogo de detalhes”, “clássico é clássico”, vice-versa. Foi na base da emoção, do sufoco, com tons de dramaticidade e, claro, o velho toque de polêmica típico de jogos assim. O Galo levou a melhor sobre o Cruzeiro, conseguiu a vitória que faltou em 2021 e segue em lua de mel com uma torcida que não se cansa de comemorar.
Estatisticamente falando, não há como negar a superioridade do Atlético sobre o Cruzeiro ao longo da partida. O time de Turco Mohamed finalizou quase o triplo de vezes do rival (21 x 7), teve mais posse de bola (52,8% x 47,2%), desarmes, passes, cruzamentos, dribles… Mas dada a disparidade atual entre os dois times, o torcedor sabe que o Galo deveria ter jogado mais.
E talvez até tivesse, se uma das três chances claras no início do jogo tivesse se convertido em gol. Mas nem Jair, nem Savarino e muito menos Hulk conseguiram balançar as redes do rival na avalanche dos 10 minutos iniciais. O Cruzeiro resistiu, e aos poucos foi conseguindo cadenciar o ritmo do confronto.
Nos demais minutos do primeiro tempo, sobraram divididas ríspidas e princípios de confusão típicos de um clássico do tamanho de Galo e Cruzeiro. Ao mandante, tecnicamente superior, faltou talvez esquecer que se tratava de um jogo assim, colocar a bola no chão, e ter paciência para buscar espaços na defesa rival. Intervalo de jogo: 0 a 0.
“Quem errar menos vai sair vitorioso”
A frase acima é de Guilherme Arana, no intervalo. Quase um clichê frequentemente usado em jogos decisivos e, claro, clássicos. Um dito que costuma se transformar em realidade, mas não no caso do jogo desse domingo. Na loucura dos 50 minutos finais de jogo, o Galo foi quem errou mais, mas também quem saiu vitorioso.
Fora o susto gigantesco na dividida entre Everson e Edu, que terminou na entrada da ambulância no gramado para conduzir o atacante a um hospital (ele está bem), o roteiro dos primeiros 20 minutos do segundo tempo apresentava um Galo que ficava mais com a bola, mas errava no terço final e sofria para encontrar espaços na (bem postada) defesa azul.
Foi aí que a torcida atleticana decidiu gritar pelo nome de Eduardo Vargas, logo acionado por Turco Mohamed. Com ele, entrou Ademir. As mesmas mudanças da partida contra o Flamengo na Supercopa, que surtiram o mesmo efeito decisivo. Mas antes da glória, veio a decepção.
Uma falha geral da dupla de zaga atleticana fez com que Vitor Roque abrisse o placar de forma surpreendente para o Cruzeiro. Com a tranquilidade (e espaço) de um veterano, o jovem de 17 anos se posicionou bem entre Nathan Silva e Godín (que jogaram em posicionamento invertido, com o uruguaio pela direita e o prata da casa no lado esquerdo), antecipou Everson e fez o primeiro gol do clássico.
Gol seguido imediatamente por um grito forte e estrondoso das arquibancadas, mas não da minoria cruzeirense: “Vai pra cima deles, Galo!”. E o Galo foi, na base do abafa. Mais na pressão numérica de um time todo no campo de ataque do que na inspiração de quem conseguia criar boas jogadas.
Quem se destacava era Eduardo Vargas, que entrou para atuar como um meia, auxiliando Nacho na armação. Aos 27, o chileno descolou ótimo cruzamento para Hulk, de cabeça, carimbar o travessão. Foi Vargas também quem, aos 40 minutos, iniciou a jogada que terminou em “assistência” do mesmo Nacho para o pênalti (polêmico) assinalado em cima de Hulk, na disputa com Oliveira.
Com a tranquilidade de sempre, o camisa 7 foi para bola e saiu para o abraço. Primeiro gol de Hulk em clássicos pelo Atlético. Com ele em campo, aliás, o atleticano não sabe o que é ver o time perder há 17 partidas.
O empate aos 40 minutos (que mantinha o time na liderança do Mineiro) já parecia suficiente, mas Ademir entrou em cena querendo mais. Aos 48, o Fumacinha fez boa jogada individual e obrigou Rafael a fazer linda defesa. Três minutos depois, fez o Mineirão tremer ao desviar para as redes o cruzamento “com a mão” de Guilherme Arana.
Galo 2 a 1. Uma vitória improvável, emocionante, num jogo que, antes do apito inicial, parecia apontar para uma festa alvinegra mais tranquila. Mas se “clássico é clássico”, “não tem favorito” e vice-versa, o Mineirão mostrou que clichês existem porque costumam guardar um tom de verdade.
Não importa a fase, Cruzeiro e Atlético sempre será Cruzeiro e Atlético. Um clássico capaz de parar uma cidade, não importa o momento de cada lado ou a relevância da partida. No fim, levou a melhor aquele torcedor que não para de comemorar desde 2021, e que se não conseguiu vencer o rival no ano mais importante de sua história, começa 2022 sem nenhum motivo para se queixar.