Se o Brasil conseguir avançar no saneamento básico, os ganhos serão contabilizados em várias áreas. Nos municípios em que os índices de tratamento de água e coleta de esgoto são ruins, trabalhadores faltam ao emprego, alunos deixam de frequentar a escola e há um número maior de internados nos hospitais.
Nas 10 cidades com melhores índices de tratamento de água e esgoto, há 6,3 internações por mil habitantes por doenças provocadas pela falta de saneamento básico. Nas 10 piores cidades, esse número sobe para 16,7 internações por mil habitantes.
“O Brasil teve uma negligência histórica (com saneamento)”, afirma Gesner Oliveira, sócio da consultoria GO Associados e ex-presidente da Sabesp. “É uma tragédia social metade da população não ter esgotamento sanitário.”
De forma geral, a universalização do saneamento pode resultar em R$ 1,4 trilhão de benefícios socioeconômicos para o Brasil até 2040, segundo o Instituto Trata Brasil. Apenas a melhoria da produtividade do trabalho traria um impacto positivo de R$ 437,9 bilhões. Haveria ainda aumento da renda com turismo e valorização do mercado imobiliário e reduções no gasto com saúde
“Existe uma correlação direta entre o acesso ao saneamento e a redução do atraso escolar”, afirma Luana Pretto, presidente do Instituto Trata Brasil. “Quando há saneamento básico, o aluno fica menos doente, se dedica mais aos estudos, provavelmente vai ter uma melhor nota no Enem e, consequentemente, uma renda maior no futuro.” Descontando a despesa com investimentos, o ganho líquido seria de R$ 815,7 bilhões.
Metas ambiciosas
As metas definidas pelo marco do saneamento para água tratada e coleta de esgoto são consideradas ambiciosas. Para dar conta de cumpri-las, a Associação e o Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon/Sindcon) estima que serão necessários R$ 893,3 bilhões em investimentos até 2033. Entre 2023 e 2026, portanto no atual governo, o País precisará de R$ 308,1 bilhões para alcançar esse montante.
“É importante garantir a continuidade da harmonização e qualificação da regulação pela ANA, que dá a estabilidade institucional e jurídica e é fundamental para atrair investimentos e garantir qualidade na prestação dos serviços de saneamento básico”, afirma a CEO da BRK, Teresa Vernaglia. A empresa pagou R$ 2 bilhões em outorga pela concessão dos serviços de água e esgoto da região metropolitana de Maceió (AL) em setembro de 2020 – foi o primeiro leilão depois da aprovação do marco.
Somente neste ano, os leilões previstos devem garantir R$ 24,45 bilhões em investimentos, segundo a Abcon. “Há um conjunto de projetos que estão no BNDES. Em tese, esses projetos em curso devem seguir, representando uma parte importante (dos investimentos)”, diz Percy Soares, diretor da entidade.
Além de encaminhar com clareza o papel da Agência Nacional de Águas e Saneamento (ANA), a avaliação dos especialistas é de que o marco ainda precisa de ajustes. “O marco foi essencial para destravar a abertura do mercado. Agora, ele precisa de aprimoramentos”, diz Marilene Ramos, diretora de relações institucionais e sustentabilidade do Grupo Águas do Brasil, que venceu o leilão de concessão dos serviços de saneamento de um dos blocos da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae) no fim de 2021. “Uma questão central é a forma de organização da regionalização, e dar mais flexibilidade para esse modelo.”
A regionalização dos municípios é estabelecida por uma lei definida em cada Assembleia Legislativa. A formação dos blocos unindo municípios de alta e baixa atratividade para os investidores é importante para garantir o sucesso dos leilões.
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