As bactérias super-resistentes se tornaram um problema grave para a saúde mundial. Os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês) dos Estados Unidos estima que 23 mil pessoas morram por ano no país vítimas de bactérias resistentes aos antibióticos. Atualmente, cerca de dois milhões de pessoas estão infectadas.
A Organização Mundial da Saúde chama a atenção para o problema desde o ano 2000: a resistência aos antibióticos seria a catástrofe da saúde do futuro. Os antibióticos – drogas que combatem bactérias que causam doenças – são a base da medicina moderna. Mas se esses remédios não surtirem mais efeito, infecções de ferimentos ou doenças como pneumonia, escarlatina ou sífilis podem se tornar novamente tão perigosas como já foram no passado.
“Perderíamos a possibilidade de oferecer tratamentos que hoje são o padrão. Transplantes, a substituição de articulações do quadril ou quimioterapias para câncer funcionam apenas quando o paciente pode ser protegido de infecções. A dimensão do problema é muito maior do que havíamos entendido antes”, alerta Otto Cars, professor da Universidade de Uppsala, na Suécia.
Sempre que um antibiótico é administrado, as bactérias a serem combatidas mudam e desenvolvem resistências para lutar contra a droga. Assim, quanto mais antibiótico é usado, mais resistência é gerada. Essa relação é conhecida desde 1940, mas a ameaça não foi levada a sério por muito tempo.
Para Otto Cars é diretor da rede global ReAct, organização que reúne pesquisa, política, medicina e sociedade civil em um trabalho conjunto contra a resistência aos antibióticos. Na opinião de Cars, amplas informações sobre agentes patogênicos, antibióticos e a formação da resistência já foram divulgadas por institutos de pesquisa. No entanto, falta uma sequência prática.
Apesar de especialistas terem alertado há muitos anos sobre o uso excessivo de antibióticos, eles são usados largamente na criação de animais para prevenir doenças – ou para acelerar seu crescimento. Em seres humanos, o uso inadequado de antibióticos também é preocupante. “Na China, por exemplo, crianças que tenham um simples resfriado são tratadas com antibióticos intravenosos”, conta Cars. “Naquele país, o consumo anual é de 138 gramas por pessoa. Na Suécia é em torno de sete gramas. É um excesso no uso dessas drogas”.
Nos países da União Europeia, a lei determina que antibióticos só podem ser vendidos com prescrição médica. Em farmácias da Grécia ou da Itália, no entanto, eles são comercializados livremente. Nos Estados Unidos, de acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças, metade dos antibióticos prescritos é desnecessária ou usada incorreta. Os médicos indicam geralmente os antibióticos de largo espectro que, em vez de atacarem um alvo específico, são eficientes contra vários tipos de bactérias. Isso incentiva a resistência das bactérias ao remédio.
“Suposições sobre que tipo de bactéria está causando a infecção são comuns”, critica Otto Cars. “E quando a suposição está errada, o paciente recebe um antibiótico que não o ajuda. Por isso os pesquisadores precisam a todo custo desenvolver métodos de diagnóstico mais rápidos.”
Atualmente, testes em laboratórios são feitos para determinar a natureza exata dos agentes patogênicos. São necessários de dois a três dias para determinar precisamente qual o tipo de bactéria, um prazo longo demais para pacientes que precisam de ajuda. Embora existam testes que avaliam o genoma dos agentes infecciosos e possam trazer resultados em menos tempo, ainda são exames caros e por isso pouco usados por clínicos gerais.
A pesquisa de novos antibióticos que possam ter efeito contra essas variantes das bactérias avança lentamente. Para o diretor do programa de Saúde Global e Acesso à Tecnologia da Escola de Políticas Públicas de Sanford, Anthony So, a indústria farmacêutica falha nos incentivos.
“Os investimentos na pesquisa são altos e o sucesso é incerto. Antibióticos de largo espectro, por exemplo, prometem um rendimento maior que um remédio contra um agente patogênico específico, que pode não ser tão frequente”, argumenta So. Além disso, antibióticos são geralmente administrados por um curto período, diferente de remédios para a pressão alta, diabetes ou HIV, que podem ser usados por vários anos e, por isso, são significantemente mais lucrativos.
Arturo Quizphe, da Universidade de Cuenca, no Equador, quer difundir o entendimento de que as bactérias super-resistentes representam um problema social e ambiental. Ele acredita que o uso responsável e com propósito dos antibióticos só vai acontecer quando as pessoas tiverem consciência de que as bactérias são uma parte importante da natureza.
“Sempre falamos de bactérias associadas a doenças e queremos nos livrar delas o quanto antes. Mas apenas uma parte delas causa doenças e muitas outras são importantes e necessárias para as pessoas. No intestino, na boca, no estômago. E ainda sabemos muito pouco sobre elas. Sabemos quase nada, por exemplo, sobre como reagem à poluição ambiental”, discute Quizphe.
Ele reuniu seus alunos e artistas para um projeto de educação e arte sobre bactérias. Os estudantes devem difundir informações sobre os microorganismos através de concursos de fotos ou teatro de rua. Em 2014, pesquisadores britânicos querem implementar um projeto parecido. Com o lema “Tome cuidado e não antibióticos”, planejam educar estudantes sobre micróbios, higiene e remédios. “Bactérias são organismos vivos e estão na terra a muito mais tempo que nós, humanos”, comenta Quizphe. “Se são atacadas, elas vão resistir. E têm o direito de resistir.”