Edital previa exigências para mulheres; não há equivalente para os homens. Secretaria de Segurança classificou medida como ‘cautela desnecessária’.
O governo do Distrito Federal informou nesta quinta-feira (28) que vai retirar a exigência de exames ginecológicos invasivos para as candidatas aprovadas no concurso do Corpo de Bombeiros. O edital publicado no início do mês causou polêmica porque previa a apresentação de laudo do Papanicolau, exame que só pode ser feito em mulheres com vida sexual ativa.
As regras do concurso também previam que candidatas virgens teriam de comprovar que não tiveram o hímen rompido. O Papanicolau, cientificamente conhecido como colpocitopatologia oncótica, ajuda na prevenção de doenças como câncer de colo do útero e HPV.
Em nota a Secretaria de Segurança Pública afirmou “compreender a cautela da instituição em relação à saúde das candidatas”, mas disse que a medida preventiva é “excessiva” e será retirada do edital.
O documento deve ser publicado no Diário Oficial do DF nesta sexta-feira (29). Segundo o governo, será suficiente que a candidata apresente um laudo, assinado por ginecologista ou obstetra, que comprova a ausência de restrições listadas no edital – tumor de mama ou inflamação pélvica, por exemplo.
O edital em vigor nesta segunda não faz exigências de exames específicos para homens. Em nota enviada pela manhã, a corporação disse que não considerava a medida discriminatória e afirmou que o objetivo era aferir “a condição física e laboral dos candidatos”.
Pedido controverso
A comissão do concurso afirmou que “não necessariamente” uma alteração no exame vai excluir uma candidata e que os dados seriam mantidos em sigilo. O concurso oferece 779 vagas e salários que variam entre R$ 5,1 mil e R$ 11,6 mil. As inscrições foram abertas no dia 18 de julho e seguem até 18 de agosto. A prova é prevista para o dia 9 de outubro.
Para a banca, não há necessidade de exames semelhantes para homens. “Sobre o exame de próstata, informamos que se trata de um exame preventivo indicado pelo médico aos homens a partir dos 40 anos de idade, sendo esta idade superior ao limite exigido para ingresso nos quadros da corporação”, disse. Também não há solicitações de exames para doenças sexualmente transmissíveis, nem mesmo HPV.
Especialista em concursos públicos, o advogado Fábio Ximenes disse considerar a exigência uma “atrocidade”. “Fere o direito à intimidade, sim, da candidata. Viola diversos princípios administrativos e constitucionais, como o princípio da isonomia, fere o princípio constitucional da discriminação, porque não pode haver discriminação de nenhum gênero, nem para homem, nem para mulher. Já aconteceu outras vezes e é totalmente imoral. É inconstitucional o edital cobrar esse tipo de conduta da candidata.”
O advogado afirma ainda que os testes são irrelevantes para determinar a aptidão das candidatas à profissão. “Se a gente for apreciar se isso [os resultados] seria relevante para o cargo, não é. Não impede o exercício de cargo de bombeiro ou policial ou qualquer cargo. Isso não tem relação nenhuma com as atribuições do cargo de bombeiro. Isso já é explicitamente antiético. A exclusão de candidatos por esse tipo de conduta seria totalmente contra a Constituição.”
Outros casos
Exigências semelhantes já foram questionadas anteriormente. Após receber denúncias, a Defensoria Pública acionou o estado de São Paulo em 2014 para acabar com a obrigação para candidatas aos concursos do governo.
Em 2015, a Justiça do Acre suspendeu o concurso para oficiais da Polícia Militar que trazia uma série de proibições aos candidatos, incluindo tatuagens na cabeça, pescoço e nos braços; cicatrizes “antiestéticas”; e ocorrência de testículo único, salvo em casos congênitos.
Também em 2015, a Justiça Federal determinou que a Marinha alterasse o edital de um concurso de admissão na Escola Naval que vetava a inscrição de candidatos casados, em união estável ou com filhos. O edital também previa desligamento de mulheres que engravidarem durante o curso de graduação.