São Paulo — Os economistas dizem que explicar a queda da poupança do Brasil não é tarefa simples. Pela lógica, com o crescimento da população – e do total de cidadãos em idade economicamente ativa -, a taxa deveria ter aumentado de forma significativa, de acordo com Samuel Pessoa, economista e pesquisador do Ibre-FGV.
No entanto, o economista diz que o Brasil desperdiçou o “bônus demográfico” e viu sua poupança cair em um terço desde os anos 1970. Na época, a taxa de reservas brasileira girava em torno de 23%; hoje, está abaixo de 15%.
A comparação com os anos 1970 faz sentido porque a época retrata uma realidade anterior à atual, em relação a três fatores: demografia (na época, a população era mais jovem), Previdência (o total de contribuintes era bem superior ao de beneficiários) e de contas públicas (o gasto primário da União girava em torno de 11%, metade do atual).
O hipotético Estado de bem-estar social criado pela Constituição de 1988 deu garantias à população, estabelecendo uma série de “redes de segurança”, incluindo seguro-desemprego e Bolsa Família, argumenta estudo realizado por Pessoa.
Os benefícios instituídos pelo Estado reduziram a percepção de risco para o aposentado. O Brasil está hoje entre as dez que mais gastam com Previdência em uma lista de 101 países, segundo levantamento do pesquisador do Ibre-FGV.
O custo dessa conta que não fecha, segundo o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, levou a um forte déficit da administração pública – principal responsável pela queda geral do índice da poupança.
Ele pondera, porém, que as reservas privadas não subiram de patamar, contribuindo também para o problema. Para Pessoa, isso gera uma ciclo perverso: “Um país não cresce de forma sustentável sem poupar.”
A China é considerada por economistas uma base válida de comparação com o Brasil porque ajuda a derrubar uma noção equivocada: a de que o brasileiro não poupa porque ganha pouco. Hoje, a renda média de chineses e brasileiros ainda é semelhante.
“O que muita gente chama de reforma da Previdência, eu vejo como uma mudança cultural”, diz Ricardo Brito, professor do Insper e autor de um estudo que compara os dois países. “Na China, quem se aposenta consegue, com o benefício público, um porcentual baixíssimo do que ganhava na ativa. Eles são obrigados a guardar dinheiro para a velhice”, explica o professor do Insper.
No Brasil, uma pesquisa feita pela FenaPrevi em 2018, mostrou que só 38% dos brasileiros dizem estar dispostos a separar parte da renda para uma reserva extra para a aposentadoria.
Professor da USP, Hélio Zylberstajn, diz que a introdução do modelo de capitalização – um dos pilares do projeto do governo para a Previdência – poderá ajudar a mudar esse quadro. “Hoje, a ideia das pessoas é: ‘minha aposentadoria está lá, garantida’. Com a capitalização, a cabeça das pessoas terá de funcionar de outra maneira. O desenho do sistema influencia na disposição em poupar.”