Brasilienses celebram Dia D em homenagem a Carlos Drummond de Andrade
Festejado desde 2011 no Brasil e em Portugal, o Dia D, que celebra Carlos Drummond de Andrade, é comemorado anualmente no Sebinho. O escritor foi um dos primeiros a ver o croqui de Brasília
Esta quinta-feira (31/10) é o dia dele. O Dia D. Dia de Drummond. Se na Irlanda, todos os anos, comemora-se o Bloom’s Day, em 16 de junho, data em que se passa o romance Ulysses, de James Joyce, aqui no Brasil nós decretamos o 31 de outubro, data de nascimento de um dos nossos maiores poetas, como o dia D, o dia de celebrar a obra do poeta, cronista, tradutor e funcionário público Carlos Drummond de Andrade, representante maior das letras brasileiras.
Comemorada desde 2011 pelo Instituto Moreira Sales (IMS), com o objetivo de difundir a obra do poeta, a data foi adotada pelo Sebinho Café (406 Norte) desde o primeiro ano, por incentivo do professor da UnB Alexandre Pilati, um drummondiano especialista. Outra data comemorativa lançada pelo IMS, e adotada pelo Sebinho, é o Dia Dela, ou Hora de Clarice (10 de dezembro, aniversário da escritora). O Sebinho também comemora o Bloom’s day todos os anos.
O poeta nascido em Itabira (MG) tinha um carinho pela nova capital do país. No poema Confronto, Drummond fala sobre Brasília por meio da antítese oferecida pela periferia, mais precisamente Ceilândia (leia quadro).
Antônio Carlos, jornalista e produtor cultural do Sebinho, comenta que, no primeiro ano, a atividade reunia cerca de 70 pessoas no auditório do subsolo. Nove anos depois, o público chega a mais de 600 pessoas. Para a festa desta sexta-feira (31/10), 70 mesas da área externa estão reservadas. “Tornou-se um verdadeiro acontecimento da vida cultural da cidade”, afirma.
Tradutor
A cada ano, o evento se dedica a explorar uma faceta diferente do versátil poeta. Neste ano, o tema escolhido foi Drummond tradutor. Carlos Drummond, além de traduzir a alma brasileira para estrangeiros, também verteu inúmeros poemas de outras línguas para o português. No programa, haverá leituras de versos do autor, traduções de outros poemas e até os traduzidos para outras linguagens, como dança e música.
A partir das 19h, após a abertura musical do pianista Guilherme Carvalho, haverá declamação do poema A flor e a náusea, pelo poeta Pedro Tierra. Antônio Carlos Queiroz, seu anfitrião, palestrará sobre o Drummond tradutor, seguido pela professora Germana Henriques. A também professora Michele Alvarenga lerá poemas traduzidos pelo poeta, na tradução e no original. E haverá leitura de outros poemas traduzidos por Drummond, além de um varal poético, aberto ao público.
Duas atividades se destacam na programação: a performance da companhia de dança Margaridas, que apresentará coreografias baseadas em poemas do escritor mineiro; e o anúncio dos poetas vencedores do concurso literário que, neste ano, chega à terceira edição. As juradas Marina Mara, Paula Ziegler e Luciana Barreto chegaram ao veredito na noite da última terça-feira, após a leitura dos 32 poemas de tema livre inscritos para esta edição.
Os nomes dos três vencedores ou vencedoras, é claro, só serão divulgados durante o evento. “Ficamos surpreendidas com a qualidade dos poemas, o que não é tão comum nesse tipo de concurso”, destaca Marina Mara, que organiza bienalmente o projeto Declame para Drummond.
*Estagiário sob a supervisão de José Carlos Vieira
Drummond e a cidade
Carlos Drummond de Andrade, mineiro nascido em Itabira em 1902, formou-se na escola de Odontologia e Farmácia de Belo Horizonte, mas, em vez de seguir a profissão, tornou-se funcionário público e poeta, tendo se ligado ao movimento modernista e deixando uma marca indelével na poesia brasileira. Como não poderia deixar de ser, Drummond também deixou pegadas na capital do país. O Correio separou algumas curiosidades.
“O urbanista”
Drummond trabalhou por 12 anos perto do urbanista Lucio Costa, embora não se falassem muito, no mesmo corredor de órgão público de urbanismo no Rio de Janeiro. Um belo dia, narra Drummond em uma crônica, Lucio apareceu e colocou sobre sua mesa um papel com uns rabiscos, que pareciam uma cruz ou um avião. Era o esboço do Plano Piloto, que, pouco tempo depois, venceria 25 concorrentes no concurso que definiria Brasília, com texto revisado por Drummond.
“Da quebrada”
Outro patrimônio do Distrito Federal que traz a marca de Drummond é a biblioteca pública de Ceilândia, que foi batizada como o nome do poeta. A homenagem não é de todo despropositada. No poema Confronto, Drummond fala sobre Brasília e a periferia pulsante da capital. “A suntuosa Brasília, a esquálida Ceilândia contemplam-se./ Qual delas falará primeiro?”, dizem os primeiros versos do poema.
“O girafista”
Em 1981, o poeta escreveu sobre Brasília mais uma vez na divertida crônica A solidão do Girafo, publicada no Jornal do Brasil. O texto se refere ao episódio em que a girafa macho Raio de Luz teve de ser enviado do Jardim Zoológico do Rio de Janeiro para o Jardim Zoológico de Brasília, posto que se encontrava solitário e a única fêmea disponível encontrava-se por aqui. “Vai, Raio de Luz, vai até Brasília e procura lá a tua namorada, que te dará prazer e filhos”, escreveu.
Confronto
A suntuosa Brasília, a esquálida Ceilândia
contemplam-se.
Qual delas falará primeiro?
Que tem a dizer ou a esconder uma em face da outra?
Que mágoas, que ressentimentos prestes a saltar
da goela coletiva e não se exprimem?
Por que Ceilândia fere o majestoso orgulho da flórea Capital?