Após a consolidação dos celulares, os smartwatches –relógios “inteligentes” em bom português — são uma das principais apostas do mercado de tecnologia. Mas em 2015, ter um smartwatch faz sentido para a maioria das pessoas? Se tem uma empresa que pode responder isso é a Apple, que praticamente inventou o mercado de smartphones e de tablets com o iPhone e o iPad, respectivamente. Agora é a vez do Apple Watch, cujas vendas no Brasil começam nesta sexta-feira (16).
Apesar de apresentar possibilidades interessantes de interação com um novo gadget que não o celular, o relógio da Apple por enquanto não traz um custo-benefício atraente o suficiente para o usuário médio. É em suma um supérfluo caro –estiloso, sem dúvida, mas ainda assim um supérfluo.
O mercado de smartwatches como um todo é assim, mas o da Apple traz o “fator Apple” de inflação que piora o cenário. O Watch mais barato custará R$ 2.899 no Brasil. O modelo testado pela reportagem foi um Sport na cor “azul meia-noite” (um tipo de azul marinho), com corpo de 42 mm e que custa R$ 3.299, –mais caro que um iPhone 6 de 16 GB, de R$ 3.199– à venda no site da Apple e nas Apple Stores do Morumbi Shopping, em São Paulo; e do Village Mall, no Rio de Janeiro.
Além do alto preço, ele depende bastante da conexão via Bluetooth com um iPhone atualizado –ou seja, nada de Androids– com a versão mais recente do sistema operacional iOS 9. E por ora, quase tudo que ele faz, o iPhone faz melhor e mais rápido, tirando um pouco do sentido do relógio ser um “facilitador” para os recursos móveis.
Design ao estilo Apple
Se o típico consumidor da Apple é fisgado pelo visual limpo, o Apple Watch segue a tradição da empresa. O corpo é quadrado, mas os cantos arredondados, materiais e padrão de cores formam um conjunto elegante e harmônico, longe do visual “tijolão” de outros smartphones e que lembra um pouco os iPhones. Com 30 gramas, não deverá pesar ou incomodar no pulso para quem já está acostumado com relógios comuns.
As personalizações de relógio são bonitas e cheias de firulas interativas, como os tradicionais ponteiros, galeria de fotos, passagem do tempo – um vídeo de 24 horas em algumas capitais do mundo, como Londres, Paris e Xangai– um modelo 3D do planeta Terra e um mostrador modular, que além das horas têm calendário com agenda, temperatura da cidade e calorias consumidas (veja mais sobre isso abaixo).
O relógio com 42 mm é mais recomendado para pulsos mais largos. Para a maioria das mulheres, que têm pulsos mais finos, talvez o modelo com 38 mm sirva melhor.
O modelo Sport testado tem corpo de alumínio e pulseira de borracha, mas há Apple Watches mais caros com pulseiras de couro e aço inoxidável. A versão mais faraônica, com corpo de ouro, custará até R$ 135 mil no país. Há ainda uma linha limitada da fabricante francesa de relógios Hermès, com pulseira de couro que dá duas voltas no pulso.
Navegação confusa
A interação no watchOS –o sistema operacional do Apple Watch– se dá via tela sensível ao toque ou por dois botões físicos na lateral: uma coroa que gira e também é “pressionável”, e outro botão para ativar contatos telefônicos ou desligar o relógio. A tela principal é uma “nuvem de apps” circulares que pode ser movida ou receber zoom para a escolha do aplicativo em questão.
Ao dar de cara com os apps, o processo comum é usar o dedo para navegar pelos ícones, e depois clicar em um deles também com o dedo — é possível usar o recurso de zoom ao girar a “coroa”. Alguns desses movimentos são difíceis de executar com precisão basicamente por conta da tela diminuta. Esta, aliás, também recebe toque por pressão, com resultado de resposta igualmente irregular.
Ao ser girado, o botão da coroa permite rolar entre menus e opções específicas em cada aplicativo. Pressionando-a, é como o botão home dos celulares: volta para a tela de apps ou alterna para o mostrador do relógio. Mas dentro de cada app o processo do que se deve fazer também é pouco intuitivo: rolar as opções com o dedo na tela ou com a coroa é um dos principais dilemas.
Há ainda algo fundamental para usar o Apple Watch com todo o seu potencial: além de pareá-lo com um iPhone 5 ou superior, sendo necessário o iOS 9 instalado, é necessário habilitar as funções ditado (na tecla com microfone no teclado do iPhone) e Siri, assistente pessoal por voz (na área de Ajustes do celular). A Siri no Watch é quem captura o que o usuário quer “digitar” e converte em texto.
Mas isso também traz inconveniências: nos testes às 9h30 em uma avenida movimentada de São Paulo, Siri só “ouve” com o relógio bem próximo à boca, bem ao estilo caricato do detetive dos quadrinhos Dick Tracy. Fora isso, costuma ser preciso em frases e palavras comuns ao português, mas no app de Mapas, ao falar “obter itinerário para o UOL”, com destino à sede da empresa na cidade, ele transformou “UOL” em “all”, “au” e “ou”.
Telefone “de pulso”
Com o relógio devidamente pareado com um iPhone, é possível fazer ligações telefônicas com alguma limitação. A maior delas é não ser possível discar números diretamente no Apple Watch. Ele liga para os contatos pré-salvos na agenda do celular. Quando liga, o seu amigo te ouve bem, mas a voz do outro lado não fica em um volume muito alto e novamente é preciso aproximar o relógio do rosto.
O recurso de avisar a chegada de e-mails e mensagens SMS é bem útil; afinal, é mais prático sentir uma vibração e virar o pulso para a mensagem do que puxar o celular do bolso apertado, destravar a tela e só então abrir o aplicativo. Já para responder, nada de teclado: é via Siri, emoticons ou mensagens genéricas de texto pré-salvas, como “oi, tudo bem”, “obrigado” e “Nos falamos mais tarde”.
Sem Whatsapp e Facebook
O ecossistema do iOS é bastante completo, mas o mesmo ainda não pode ser dito do watchOS. Até o momento, as maiores ausências ainda são o Facebook, o Waze e o Whatsapp. Mas já é possível se divertir um pouco com o Facebook Messenger, Twitter, Evernote e Instagram, além de alguns jogos, utilitários e notícias.
O UOL já tem uma versão para o relógio do seu PlacarUOL, com resultados dos jogos de futebol. É bom lembrar, porém, que todos esses apps servem mais para visualização e uma ou outra operação mais simples. Para algo mais complexo, melhor ir de iPhone mesmo.
Personal trainer de pulso
Outro uso que promete ser chamariz de vendas para o relógio em um futuro próximo é o monitoramento da saúde do usuário. Além de medir os batimentos cardíacos, o app de Atividade consegue medir o quanto você gastou de calorias, tempo de exercício e o período em que ficou em pé.
O melhor é que o produto calcula qualquer atividade, não apenas as de “academia”; correr para pegar o ônibus e levantar uma mesa em casa também são medidos, promete a Apple. É quase uma “gamificação” da saúde, o que pode atrair até os “geeks” mais adeptos do sofá e da cadeira no computador.
Mídia, mapas e etc.: tudo desconfortável
Há outros truques no dispositivo a serem explorados e melhorados. O app de câmera é nada mais que um segundo visor (com botão de disparo) para o que está na frente da câmera traseira do iPhone; ajuda em selfies mais complexas ou fotos à distância. O de fotos mostra só as imagens favoritas no rolo da câmera do celular.
No de mapas, o tamanho de tela é um grande problema: as informações ficam espremidas, o zoom para ler o mapa tira um pouco dos referenciais ao redor, e ele não raro sai do aplicativo se você não ficar levantando o pulso o tempo todo. E não há mensagem por voz indicando as mudanças de direção.
Com o de música é até possível dar play, pause, pular músicas e controlar volume, mas a música sai do celular –para ouvir diretamente do relógio, é necessário sincronizar as músicas com o celular e ainda de um fone headset com bluetooth.