Energia obtida por fusão é potencialmente mais limpa que obtida por fissão.
Experimento conseguiu gerar mais energia do que foi gasta.
Cientistas anunciaram nesta quarta-feira (12) um importante avanço na longa busca do desenvolvimento da fusão nuclear, o que para alguns representa o sonho de uma fonte de energia limpa e ilimitada.
Presente no Sol e em muitas outras estrelas, a fusão implica na liberação de energia por meio da união de núcleos atômicos, diferentemente da provocada pela fissão nuclear, princípio físico da bomba atômica e da energia nuclear usada atualmente nas usinas, que envolve a quebra do núcleo dos átomos.
Décadas de trabalho sobre a fusão tentaram superar um obstáculo gigantesco: a enorme quantidade de energia necessária para desencadear o processo. No entanto, experiências de laboratório, descritas nesta quarta-feira por um grupo de cientistas nos Estados Unidos, permitiram fazer grandes avanços na superação desses obstáculos.
Em artigo publicado na revista “Nature”, cientistas americanos afirmaram ter sido os primeiros a obter mais energia de uma reação de fusão do que a absorvida pelo combustível usado para provocá-la.
Eles fixaram 192 feixes de laser na direção de um ponto mais estreito do que a largura de um cabelo humano para gerar energia suficiente para comprimir uma minúscula cápsula de combustível a um tamanho 35 vezes menor que o original.
Com duração de menos de um bilionésimo de segundo, a reação liberou energia equivalente à armazenada em duas baterias AA (17 mil Joules) na última experiência realizada em novembro de 2013.
Apesar de “modesta”, segundo os pesquisadores, a liberação de energia foi maior do que a energia absorvida pelo combustível, estimada entre 9 mil e 12 mil Joules.
“Isto é o mais próximo que se chegou” do sonho de gerar energia viável resultante de uma fusão, disse Omar Hurricane, chefe da equipe que realizou o estudo na estatal National Ignition Facility (NIF), da Califórnia.
A energia é dez vezes superior à alcançada anteriormente, embora haja alguns obstáculos. Não se trata de uma reação sustentada, o tão buscado momento de “ignição”, e a pergunta sobre a eficiência energética, ou seja, a liberação de uma energia superior à consumida para lançar o processo, permanece sem resposta.
Neste caso, os feixes de laser liberaram 1,9 milhão de Joules de energia – o equivalente a uma pequena bateria de carro -, dos quais só entre 9 mil e 12 mil Joules foram absorvidos pelo combustível.
“Só algo da ordem de 1% da energia que usamos com o laser termina no combustível, ou até menos”, disse a co-autora do estudo, Debbie Callahan. “Há muito espaço para continuarmos avançando”, prosseguiu.
O método precisa ser aperfeiçoado e o rendimento deve ser 100 vezes melhor “antes de que possamos chegar ao ponto de ignição”, acrescentou Hurricane.
“Honestamente, não podemos dizer quando alcançaremos uma ignição. Estamos trabalhando como loucos para conseguir. Nossos conhecimentos teóricos nos dizem que se continuarmos nesta direção, temos uma possibilidade”, prosseguiu.
A ignição também requer auto-propagação, por meio da qual as primeiras partículas fundidas causam o calor e a pressão necessários para gerar outras, criando assim novas partículas e melhorando o rendimento.
Os últimos experimentos no NIF, um feito em setembro do ano passado e o outro em novembro, foram os primeiros a lançar provas de que “as partículas deixam um pouco de energia atrás delas”, disse Hurricane.
A fusão nuclear é o oposto da fissão, que implica a divisão de átomos, um princípio no qual se baseiam as bombas atômicas e as usinas nucleares, que apresenta como riscos a proliferação nuclear, assim como os rejeitos perigosos e duradouros.
Os núcleos de deutério e trítio – ambos isótopos obtidos a partir do hidrogênio – podem, ao contrário, se fundir para criar partículas mais pesadas.
Em teoria, a energia gerada através da fusão não resultaria em rejeitos perigosos nem contaminaria a atmosfera. Além disso, o combustível é encontrado com maior abundância: na água do mar, que cobre mais de dois terços do planeta.
O procedimento requer temperaturas extremas e pressões equivalentes às encontradas no nosso sol e em outras estrelas ativas.
Para concretizar este objetivo, Hurricane e sua equipe dispararam seus raios laser contra um cilindro de ouro de dois milímetros de diâmetro, recoberto por dentro por uma camada congelada de combustível de deutério e trítio.
Os feixes de luz entraram através de buracos por um lado e se focaram como raios que impactaram a cobertura externa da cápsula e provocaram sua implosão, algo equivalente a reduzir uma bola de beisebol ao tamanho de uma ervilha.
O processo gera uma pressão 150 bilhões de vezes superior à exercida pela atmosfera terrestre e uma densidade de 2,5 a 3 vezes superior à do núcleo solar, disseram os cientistas. Segundo o cientista especializado Mark Herrmann, do Pulsed Power Sciences Center, de Albuquerque, trata-se de “um avanço significativo na pesquisa sobre a fusão”.
(Foto: ilustrativa)