Devido à crescente demanda mundial por veículos elétricos, alternativa para a redução das emissões de carbono, as baterias que fornecem energia para esses carros também são cada vez mais procuradas. Por isso, cientistas buscam aprimorar as versões tradicionais, feitas de íons de lítio, tanto para reduzir o tempo de carregamento, quanto para prolongar a vida útil. Dois novos projetos — um liderado pela Universidade Boise State em parceria com a Universidade da Califórnia e outro pela Universidade de Cambridge — pretendem impulsionar a evolução dessa fonte de energia.
Os avanços em pesquisa e desenvolvimento resultaram em baterias de lítio mais eficientes. Porém, essa evolução já não comporta mais a necessidade de carregamentos mais rápidos. A equipe de pesquisadores das universidades Boise State e da Califórnia, ambas nos Estados Unidos, apostou em uma nova abordagem para solucionar esse problema: um material de alto desempenho a ser usado no eletrodo — a superfície que possibilita a troca de elétrons — da bateria.
O composto utilizado é o pentóxido de nióbio. Durante a alimentação da bateria, os íons de lítio se movem do eletrodo positivo (cátodo) para o negativo (ânodo). O ânodo mais comum é feito de grafite, que é muito denso em energia, mas tem limites para aceleração do carregamento porque o metal de lítio pode se acumular na superfície do grafeno. Esse efeito, conhecido como chapeamento, afeta o desempenho da bateria e pode causar curto-circuito, superaquecimento, incêndio e explosões.
O fenômeno não acontece quando o dispositivo tem um eletrodo feito com a solução proposta pelos cientistas americanos. “Óxidos metálicos de intercalação, como o material a partir do pentóxido de nióbio, são alternativas promissoras de ânodo devido ao risco reduzido de revestimento de lítio em baixas tensões”, explica Claire Xiong, professora de pós-graduação da Universidade Boise State e principal autora do estudo.
Para o projeto-piloto, os cientistas construíram um pequeno dispositivo de bateria em formato circular, como uma moeda, com os eletrodos de pentóxido de nióbio. O material tinha uma estrutura amorfa — um arranjo desordenado de átomos. Quando a célula foi carregada e descarregada várias vezes, a estrutura desordenada se transformou em uma ordenada, cristalina. Até então, esse formato nunca havia sido relatado na literatura científica.
Segundo os criadores, em comparação com o arranjo desordenado, a estrutura cristalina inédita permitiu o transporte mais fácil e rápido de íons de lítio para o ânodo durante o carregamento, o que indica a possibilidade de uso do material de alto desempenho para agilizar o carregamento de energia. Outras medições sinalizaram mais uma vantagem: a mudança de composição nos eletrodos permitiu um maior armazenamento de carga.
Para Xiong, ela e os colegas chegaram a uma abordagem completamente nova para criar eletrodos de bateria de íons de lítio. “A inovação tecnológica está relacionada a partir de uma fase de maior energia, como um material amorfo. O simples ciclo do material com lítio nos permite criar arranjos cristalinos que exibem propriedades aprimoradas além daquelas feitas por meios tradicionais, como reações de estado sólido”, afirma a autora.
Inteligência artificial
Também com o objetivo de aprimorar o uso de baterias, uma equipe da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, trabalha em um algoritmo de aprendizado de máquina que promete ajudar motoristas, empresas e fabricantes a tirarem o máximo de proveito desse dispositivo. A ideia é usar inteligência artificial para sugerir rotas e padrões de direção que minimizem a degradação do aparelho.
Primeiramente, o grupo desenvolveu uma alternativa não invasiva de sondar as baterias, obtendo informações sobre a sua saúde. O sistema fornece “biomarcadores” do estado do dispositivo enviando pulsos elétricos de alta dimensão e medindo a resposta a eles. Depois, esses sinais elétricos foram programados em um algoritmo que previu como diferentes padrões de controle de veículos afetariam o funcionamento da bateria.
Alpha Lee, líder da pesquisa, afirma que a maioria dos modelos de previsão da saúde da bateria assume que ela é sempre operada da mesma maneira. “Esses modelos não podem ser aplicados a veículos na estrada, que, normalmente, são usados de forma diferente no dia a dia”, diferencia.
Os resultados dos testes com 88 baterias comerciais de carros elétricos mostraram que a inteligência artificial conseguiu prever como a bateria responderia no próximo ciclo de uso a depender da rapidez que fosse carregada e da velocidade que o carro atingiria quando voltasse a funcionar.
No experimento, detalhado no periódico científico Nature Communications, a equipe também identificou que, para fazer um prognóstico preciso do dispositivo, o algoritmo não dependia de informações sobre o uso anterior. Além disso, poderia sinalizar quando houvesse possibilidade de erro na previsão.
O líder da pesquisa explica que o estudo é interessante porque esse equipamento geralmente se degrada abruptamente: “Em um veículo, se uma bateria morrer no meio de uma viagem, seria ruim. Da mesma forma, em um contexto de armazenamento estacionário, a energia bombeada para a bateria não é necessariamente a mesma que pode ser extraída”. O monitoramento contínuo da integridade da bateria, portanto, é necessário para garantir que o sistema esteja realmente acondicionando a quantidade esperada de energia.
Longo prazo
Alexandre Lasthaus, engenheiro eletrônico e professor do curso de engenharia mecatrônica da Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo, aponta dificuldades enfrentadas por quem trabalha com esses dispositivos antes de eles chegarem ao mercado. “Estão apostando que, com a alta demanda de veículos elétricos e o grande volume de produção, os custos vão cair. Mas ainda faltam sugestões para mudar a composição da bateria, que continua sendo de lítio, um material caro. Outro ponto é a questão de peso e tamanho, que ainda é muito grande em relação ao resto do carro”, indica.
Na avaliação do especialista brasileiro, os projetos americano e o britânico, ainda que incipientes, são tentativas de melhorar esse campo de produção tecnológica. “Eu não sei se são coisas revolucionárias, mas os pesquisadores estão tentando, cada um dentro da sua área, contribuir para que melhore o desempenho das baterias, principalmente de carros. Esses não são estudos que vão trazer alguma coisa a curto prazo”, afirma.
Por Correio Braziliense