Um grupo de cientistas americanos e italianos está desenvolvendo um sistema para prever e detectar terremotos por meio de aplicativo de celular. O software “My Quake” (Meu Terremoto, em inglês) foi idealizado em 2008 na Universidade da Califórnia em Berkeley, em parceria com a Universidade de Nápoles Federico II, e vem sendo aprimorado desde então. O projeto foi apresentado na terça-feira (26) pelo sismólogo Richard Allen, durante o VI Fórum Mundial de Ciência, no Rio.
Segundo o especialista, hoje o programa – que usa dados de GPS e algoritmos – consegue detectar em tempo real tremores de magnitude 5 ou maior em um raio de 10 km. O próximo passo será aumentar a sensibilidade do dispositivo para identificar abalos sísmicos de magnitude 3 em um raio de até 100 km.
“Se a intensidade e a duração dos terremotos puderem ser previstas com minutos de antecedência, isso já pode ser suficiente para que as pessoas procurem um lugar seguro. Nesses casos, segundos muitas vezes já podem fazer alguma diferença”, destacou.
Para Allen, sempre vai existir o “elemento surpresa” em situações como desastres naturais, mas esse sistema de alerta pode servir como uma ferramenta para ajudar a população na hora de agir.
“O que não podemos é usar programas assim para nos tornar mais complacentes e não fazer nada. As pessoas precisam ser treinadas e aprender como proceder nesses momentos, pois também é responsabilidade delas”, disse.
Na opinião do sismólogo, saber desses eventos previamente não deve criar reações de pânico, e modelos já implantados no Japão demonstram isso. Allen cita, ainda, o Chile como um bom exemplo de país que tem se preparado cada vez melhor para tremores de terra, com prédios mais seguros e uma população mais atenta.
“A implementação do nosso sistema ainda é um desafio, mas já há empresas interessadas. Fizemos testes no Japão e até 90% dos voluntários manifestaram estar dispostos a usar o aplicativo”, contou.
De acordo com o climatologista japonês Yuichi Ono – do Instituto Internacional de Pesquisa sobre Ciência de Desastre (IRIDeS), criado na Universidade de Tohoku após o tsunami de 2011 –, apenas os desastres naturais mais graves são reportados às autoridades, deixando os menores de fora das estatísticas. Também não se sabem se morrem mais homens ou mulheres nesses episódios, apontou o especialista.
“São os governos locais e federal que devem coletar os dados. Os sistemas de alerta de terremoto e tsunami no Japão já melhoraram, menos pessoas morrem agora”, afirmou. Hoje, o IRIDeS conta com cem pesquisadores, e recentemente enviou especialistas para as Filipinas, que têm sofrido com a passagem do tufão Haiyan.
A pesquisadora da Universidade de Ciência de Tóquio Reiko Kuroda, membro do Conselho de Ciência do Japão, acrescentou que eventos como o tsunami de março de 2011, que deixou milhares de mortos e atingiu a usina nuclear de Fukushima, fizeram a população do país ficar mais cética em relação à contribuição da ciência. Para Ono, a opinião pública perdeu totalmente a confiança na comunidade científica.
Segundo o climatologista Gordon McBean, presidente do Conselho Internacional de Ciência (ICSU, na sigla em inglês) e professor da Western University no Canadá, os desastres naturais se concentraram, entre 1980 e 2012, 52% na Ásia, 27% na África, 12% na América do Norte, 7% na Europa e 2% na América do Sul.
Os países onde houve o maior número de mortos nesse período foram Bangladesh, Índia, Honduras e Japão. Só no ano passado, nas Filipinas, foram registrados 33 desastres ligados ao clima, entre ciclones, erupções de vulcões, enchentes e terremotos.
A maioria dos incidentes relatados no mundo tem sido de natureza hidrológica, meteorológica ou climatológica. Para McBean, que ajudou a formular o mais recente relatório científico do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a intensidade das tempestades e furacões só deve aumentar daqui para frente.
“O que devemos reduzir é a exposição e a vulnerabilidade das populações”, destacou. De acordo com o climatologista, as maiores perdas econômicas decorrentes de desastres naturais estão nos países em desenvolvimento.
McBean também reforçou que as pessoas precisam de educação e treinamento para saber o que, quando e como fazer nesses episódios.
“Devemos trabalhar juntos, envolver a população. Muitas crianças japonesas morreram afogadas no tsunami de 2011 porque nunca haviam tido um treinamento antes”, lembrou o especialista, que coordena grupos de trabalho nas Filipinas, na Tailândia e no Laos.