Um grupo raro de pessoas — de 1% a 2% de toda a população — é considerado “imune” à infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). Elas têm no corpo mecanismos capazes de barrar a ação do vírus mesmo que expostas a ele em grande quantidade. Uma das principais descobertas em torno do tratamento contra a Aids está justamente em uma mutação que esses indivíduos possuem no gene CCR5 chamada CCR5-delta-32. Desde então, terapias são testadas e desenvolvidas com foco nessa característica especial.
Todas sem total sucesso até o trabalho de pesquisadores da Universidade de Pensilvânia, nos Estados Unidos, divulgado na edição de hoje da renomada revista científica New England Journal of Medicine.
Utilizando uma terapia genética personalizada, os cientistas foram capazes de bloquear o HIV e controlar o vírus sem o uso de medicamentos antirretrovirais. Além disso, o estudo mostra que é possível manipular células T do próprio paciente com HIV para imitar uma resistência que se dá naturalmente ao vírus com segurança e eficácia.
A equipe liderada por Carl June, do Departamento de Patologia e Medicina Laboratorial da Escola de Medicina Perelman da universidade, modificou geneticamente as células do sistema imunológico de 12 pacientes soropositivos. A tecnologia utilizada para construir com segurança o exército de células T modificadas é chamada “dedos de zinco” (ZFN, em inglês). Algo como uma “tesoura molecular” capaz de imitar a mutação CCR5-delta-32 que, ao ser induzida, reduz a expressão das proteínas membranares CCR5. Sem elas, o HIV não encontra seu receptor e, portanto, não pode entrar e infectar a célula, tornando os pacientes resistentes ao vírus.
Para chegar a esse resultado, as células modificadas foram infundidas de volta ao organismo dos voluntários. Seis pacientes foram retirados do tratamento com antirretrovirais e seis mantiveram a medicação normalmente. As infusões foram toleráveis e seguras para os indivíduos e as células T mutantes mostraram uma persistência no organismo superior ao que é observado nas originais.
Durante algumas semanas sob a interrupção do tratamento, as células T iniciais diminuíram no sangue, enquanto a redução das células modificadas foi significativamente menor. Os pesquisadores também observaram células modificadas no tecido linfoide associado ao intestino, que constitui um importante depósito de células imunitárias e reservatório de infecção por HIV — o que sugere que as estruturas modificadas estavam funcionando e trafegando normalmente no corpo.