Apesar de o Judiciário considerar a greve ilegal, agentes mantêm a radicalização do movimento e ainda fazem protesto diante do Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha, palco da estreia da Seleção Brasileira nas Olimpíadas
Quem esteve no Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha ontem à tarde para celebrar a estreia da Seleção Brasileira nas Olimpíadas se deparou com uma manifestação de policiais civis. Apesar de proibido pela Justiça, o protesto reuniu cerca de 1 mil servidores da corporação, que radicalizaram o movimento de luta por reajuste salarial. Os agentes decidiram enfrentar o Judiciário e o governo, interrompendo o atendimento em várias delegacias. Além disso, o grupo responsável pela atuação em caso de ataques terroristas se retirou do hotel onde estão hospedadas as delegações estrangeiras, o que ampliou a repercussão do movimento. O governo aguarda o fim da greve para voltar a negociar com a categoria, mas mudou de estratégia: a partir de agora, o GDF analisará os pleitos de PMs e bombeiros com as demandas dos policiais civis.
O protesto em frente ao estádio foi pacífico, mas houve momentos de tensão, especialmente quando a cavalaria se aproximou dos grevistas. Nos bastidores, o clima entre PMs e policiais civis é de conflito direto. Como a concessão do aumento pleiteado a todas as categorias da segurança pública é praticamente inviável por causa da crise financeira, as corporações se veem como inimigas na briga pelo reajuste salarial.
Delegados e agentes da Polícia Civil aprovaram a paralisação de 48 horas em assembleias realizadas na tarde da última quarta-feira. Pouco depois, o Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) recorreu à Justiça, e o desembargador Sebastião Coelho declarou a greve ilegal. “A deflagração de um movimento grevista por parte de policiais na data do primeiro jogo olímpico realizado na cidade não é consentâneo com o exercício da greve como instrumento legítimo de pressão. Não é possível que a segurança da população seja utilizada como moeda de troca nessa negociação”, argumentou o magistrado.
O desembargador mencionou, ainda, os riscos de atritos com a PM. “Eventual reunião de policiais civis nas cercanias do estádio nos dias de realização de partidas de futebol tem potencial para desencadear confronto entre forças de segurança, uma vez que outras polícias e até a Força Nacional estarão presentes para garantir a normalidade do evento”. A multa fixada foi de R$ 500 mil por dia de jogo e R$ 200 mil para datas sem partidas no estádio. O juiz também determinou a aplicação de multa de R$ 500 mil, caso houvesse manifestação no estádio.
Não estão descartados cortes de salário pelos dias não trabalhados. A Promotoria de Justiça Militar do MPDFT acompanhou ontem o protesto dos grevistas. O promotor Nísio Tostes classificou a paralisação e a manifestação no local do jogo como um ato de “extrema irresponsabilidade”. “Qualquer reivindicação salarial é permitida, mas deve ser feita dentro das regras constitucionais”, explicou. O MP atuou para identificar os participantes do movimento paredista e não descarta sanções aos envolvidos na paralisação.
Os policiais civis reivindicam a isonomia salarial com a Polícia Federal, que teve aumento de 37% em três parcelas proposto pelo Executivo federal. O GDF se dispôs a pagar 7% no próximo ano, 10% em 2018 e 10% em 2019, mas a oferta foi rejeitada pela categoria. Os policiais militares e bombeiros também reivindicam reajuste de 37% e ameaçam com Operação Tartaruga caso as negociações não avancem. “Quando fizeram um movimento parecido no ano passado, houve um grande número de processos, inclusive com condenações. Quem quiser entrar nessa aventura é bom contratar advogados, pois, certamente, haverá processo contra todos que aderirem a esse tipo de operação”, comentou o promotor Nísio.
Impacto
Os crimes cometidos no perímetro do estádio deveriam ter sido registrados na 5ª DP (Área Central). Mas o Correio esteve no local às 17h e o encontrou fechado. A unidade montada dentro da arena funcionou normalmente.
A secretária de Segurança Pública e da Paz Social, Márcia de Alencar, afirmou ontem que a greve da Polícia Civil não terá impactos graves no planejamento dos Jogos Olímpicos. “A paralisação estava prevista em todos os cenários de crise. Já houve reforço no plano de contingência com as outras forças. Teremos um reflexo na questão de serviços ordinários e nas investigações, mas esse não é um ponto que envolve a questão das Olimpíadas”, explicou. “A Secretaria de Segurança Pública tem muito respeito pela Polícia Civil e reconhece a sua importância. Majoritariamente, o contingente de segurança das Olimpíadas é formado por PMs, bombeiros e agentes do Detran”, ponderou.
O comandante da Polícia Militar, coronel Marco Antônio Nunes, também minimizou o impacto da greve. “A segurança não ficará desfalcada. Temos uma força reserva para esse tipo de cenário, que foi previsto”, reforçou. Sobre a disparidade entre policiais civis e militares, Nunes preferiu amenizar o caso. “Eles estão no movimento deles, e nós estamos trabalhando. A PM não faz greve. Independentemente de qualquer coisa, as duas polícias são irmãs. Não existe disputa”, finalizou o oficial.
Ameaça
Quem está à frente das negociações com a Polícia Civil é o chefe da Casa Civil, Sérgio Sampaio. Depois que os agentes radicalizaram o movimento, o governo retirou a proposta apresentada à categoria, mas o Buriti quer retomar as conversas com a PCDF. “A gente espera que a Polícia Civil aja com responsabilidade e retorne o quanto antes ao trabalho, para que possamos retomar as negociações. Até porque a greve foi considerada ilegal”, comentou Sampaio.