TSE começa a julgar na terça-feira se a chapa Dilma-Temer cometeu abuso de poder político e econômico para ser reeleita em 2014
Brasília – Se a então presidente Dilma Rousseff sofreu o impeachment mais pelo conjunto da obra do que por crimes fiscais pelos quais os parlamentares a condenaram, não será surpresa se, pouco mais de um ano depois, o sucessor dela no comando do país, Michel Temer, for apeado do cargo no julgamento pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por fatos que não estão no processo, diga-se, a delação dos irmãos Batista da JBS.
O TSE começa a julgar na terça-feira se a chapa Dilma-Temer cometeu abuso de poder político e econômico para ser reeleita em 2014.
De modo geral, os sete ministros da corte vão decidir se há provas de caixa 2 na campanha e, se sim, se foram capazes de desequilibrar a disputa a ponto de garantir a apertada vitória da dupla.
Numa campanha que teve gastos declarados de 350 milhões de reais, Dilma é acusada por delatores da Odebrecht e por seus ex-marqueteiros João Santana e a mulher dele, Mônica Moura, de terem recebido cerca de 150 milhões de reais de caixa 2 –e de ter participação ativa na contabilidade paralela da campanha. A ex-presidente poderá ser condenada a perder o direito a se candidatar a cargos eletivos e Temer, o mandato de presidente.
No início de abril, quando se tentou iniciar o julgamento mas foi adiado para tomada de novos depoimentos, o cenário era mais favorável a Temer, segundo aliados dele e envolvidos com o processo entrevistados pela Reuters nos últimos dias.
Motivos: a economia dava seus primeiros sinais de melhora, as reformas começavam a andar no Congresso e a crise política, apesar da megadelação da Odebrecht que envolveu importantes quadros no governo e no Legislativo, não havia entrado no gabinete presidencial.
Àquela altura, um ministro do TSE disse à Reuters, sob a condição do anonimato, que a corte não iria julgar somente com base nos autos, mas também olhando para a governabilidade do país sob Temer.
Dois meses depois, contudo, o clima virou. A partir da divulgação da gravação de uma conversa entre Joesley Batista e o presidente, Temer virou alvo de uma investigação no Supremo Tribunal Federal (STF) por obstrução de Justiça, corrupção passiva e organização criminosa e será, um fato inédito para um chefe de Executivo no exercício do cargo, interrogado pela Polícia Federal.
O presidente decidiu que não renuncia ao cargo, passou a contestar a validade da gravação, mas vê o andamento das reformas ficarem em suspense, com aliados no Congresso, que começaram negociações para sucedê-lo, esperando ao menos uma decisão do TSE para levar a cabo um desembarque geral do governo.
Na quinta-feira, entretanto, o presidente teve uma importante vitória com a divulgação do crescimento de 1 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre deste ano, encerrando um ciclo de oito quedas. A crise política, no entanto, pode atrapalhar essa retomada.
Nada desse clima consta do volumoso processo. Por isso, o presidente da corte, Gilmar Mendes, foi muito claro no recado da segunda-feira: “Não cabe ao TSE resolver crise política, isso é bom que se diga.”
Interlocutores do TSE e advogados também duvidam que a ida do ex-ministro da corte Torquato Jardim para o Ministério da Justiça pode ter qualquer influência no resultado do julgamento em relação a Temer. Auxiliares do presidente defenderam que o nome de Torquato poderá ajudar na interlocução com o TSE e com o STF no atual momento de crise por que passa o governo.
Nenhuma das partes envolvidas crava um prognóstico para o julgamento. Um advogado que fará sustentação no processo faz a seguinte análise reservadamente, para não se comprometer com a corte: o TSE não está dissociado do todo.
Se no dia do início do julgamento, os ministros chegarem à conclusão de que o presidente tem de ser cassado, segundo essa fonte, eles condenam. Se ainda houver dúvidas, em razão do avanço das investigações do caso JBS, haverá um pedido de vista. Mas se Temer der mostras de que tem força política para ficar no cargo, acrescentou a fonte, o tribunal julga rapidamente e inocenta-o.
A ação que será julgada foi proposta em dezembro de 2014 pelo PSDB e pela coligação Muda Brasil, encabeçada pela legenda e que tinha o senador Aécio Neves (PSDB-MG) como candidato.
O mesmo PSDB que é agora o principal aliado governo e peça-chave na sustentação do peemedebista na Presidência.