A expressão “alfabetização digital” costumava significar saber mandar e-mails ou digitar com um programa de processamento de texto.
Era um conhecimento muito exigido dos trabalhadores do conhecimento – pessoas que poderiam usar softwares específicos no trabalho e precisariam saber como lidar com eles de forma clara e natural.
Mas essa expressão evoluiu significativamente. Alfabetização digital agora significa conhecer as técnicas necessárias para ter sucesso em uma sociedade em que a comunicação e o acesso à informação dependem cada vez mais das tecnologias digitais, como plataformas online e telefones celulares.
O conceito engloba a ampla compreensão de uma série de ferramentas digitais que permitem que o profissional desempenhe suas funções, seja no escritório, de forma híbrida ou remota em todos os tipos de ambientes. Essas ferramentas incluem software colaborativo em tempo real, como aplicativos de bate-papo entre os profissionais, e ferramentas sofisticadas de trabalho assincrônico.
Atualmente, a alfabetização digital não é mais uma proposição funcional, mas sim uma mentalidade. No ambiente de trabalho moderno, espera-se cada vez mais que os funcionários adotem rapidamente qualquer tecnologia que venha com o seu trabalho e também que eles se adaptem às ferramentas e abordagens em constante evolução. Os profissionais também precisam usar a tecnologia de forma estratégica: desde trabalhar com seus telefones celulares pessoais até impulsionar programas de fluxo de trabalho colaborativos.
E, o mais importante, o conhecimento digital não é mais essencial apenas entre os trabalhadores do conhecimento. “Ele está sendo aplicado universalmente a quase todas as pessoas”, afirma Ying Zhou, diretora do Centro de Pesquisas sobre o Futuro do Trabalho da Universidade de Surrey, no Reino Unido.
Em 2019, um relatório do governo britânico demonstrou que pelo menos 82% das vagas de emprego anunciadas online exigiam conhecimentos digitais. E Zhou afirma que os profissionais que pararem de adquirir esses conhecimentos arriscam-se a ficar para trás.
“Cada nova tecnologia desenvolvida amplia as exigências de conhecimento dos profissionais”, segundo ela. “É uma corrida entre o conhecimento digital e a tecnologia: quanto mais a tecnologia avança, mais rapidamente precisamos atualizar nossos conhecimentos. O alvo está mudando a todo tempo.”
Por que todos precisam da alfabetização digital
“Alfabetização digital é um conceito amplo. Você pode trabalhar com aparelhos digitais de forma simples ou realizar tarefas muito complexas”, prossegue Zhou.
“Ela pode variar desde a impressão de uma nota fiscal em uma loja até o uso de processadores de texto e planilhas de cálculo, além de serviços avançados como web design, análise de dados, programação de computadores e criação de códigos”, afirma ela.
A demanda do mercado de trabalho por profissionais com conhecimento digital vem crescendo de forma consistente desde os anos 1980. Zhou menciona pesquisas que demonstram que, enquanto a exigência de técnicas de leitura e aritmética no mercado de trabalho britânico se estabilizou, o número de cargos exigindo conhecimentos digitais continuou a crescer.
Ao longo do tempo, os empregadores começaram a esperar um grau de conhecimento digital até para cargos não relacionados com a área técnica – desde operadores de armazéns que utilizam sistemas de gestão em nuvem até médicos que consultam pacientes de forma remota por vídeo e empreiteiros que gerenciam projetos de construção em aplicativos de colaboração móveis.
A tecnologia deixou de ser algo específico de alguns poucos setores.
“A alfabetização digital e a demanda dos empregadores por conhecimentos digitais evoluíram à medida que a economia e o mercado de trabalho foram sendo digitalizados”, segundo Danny Stacy, chefe de inteligência e talentos da plataforma de recursos humanos Indeed, com sede em Londres. “O que costumava ser um bônus agora é um componente fundamental de virtualmente todos os cargos.”
E essa exigência de alfabetização digital atingiu seu pico quando os empregadores adotaram padrões de trabalho híbrido ou remoto.
“Atualmente, os empregadores são muito mais capazes de identificar conhecimentos digitais específicos e indicar o nome do software que eles usam”, segundo Stacy. “Exige-se maior capacidade de uso de softwares específicos e ferramentas de gestão de projetos e do escritório, para que os funcionários possam trabalhar com mais eficiência.”
Mas o aumento da importância da alfabetização digital não significa que os profissionais precisem dominar todos os softwares existentes para conseguir um emprego. Na verdade, eles precisam ser confiantes na área digital; estar dispostos a experimentar novas tecnologias; adotar as ferramentas certas que podem facilitar as tarefas rotineiras e aumentar a colaboração no ambiente de trabalho; e também ter a flexibilidade e capacidade de adaptação para aprender novos processos.
E, atualmente, os profissionais precisam ter em mente que eles continuarão a atualizar seus conhecimentos digitais. Afinal, a expectativa quando um funcionário assume um novo cargo é que ele tenha o conhecimento digital necessário para a função ou que irá aprender – e rápido.
“O trabalho híbrido e remoto atingia apenas 5% do mercado de trabalho antes da pandemia”, afirma Zhou. “Agora, é cerca da metade de todos os profissionais. Independentemente do trabalho que você fazia anteriormente, o empregador agora espera que você assimile todo e qualquer conhecimento digital que seja necessário para a sua função.”
Como se antecipar
Uma notícia positiva é que os profissionais provavelmente já têm alguma alfabetização digital, mesmo se essa expressão for desconhecida para eles.
A onipresença da tecnologia significa que quase todas as pessoas enviam e-mails e outras mensagens, deslizam, clicam e rolam telas. Tudo isso frequentemente se traduz em conhecimentos tecnológicos no ambiente profissional. E, mesmo se os trabalhadores acharem que não atingiram o ponto que desejam ou precisam, existem formas de aprimorar esses importantes conhecimentos.
Quando seus funcionários precisam ser acelerados, as empresas muitas vezes oferecem treinamento para ajudá-los a adquirir qualquer conhecimento digital que seja necessário.
“Com a falta de profissionais, os empregadores estão demonstrando maior disposição do que antes para treinar e capacitar candidatos, em vez de buscar o produto final”, afirma Stacy.
Essa capacitação pode assumir a forma de treinamento no trabalho, aprendizado online ou cursos de desenvolvimento. Mas Zhou pondera que uma das melhores formas que os funcionários têm para aumentar sua alfabetização digital é simplesmente fazer o seu trabalho em um processo de tentativa e erro.
“O aprendizado informal, compartilhando o conhecimento com os colegas, é uma das formas mais comprovadas de adquirir novas habilidades”, afirma ele.
E o que as pessoas fazem fora do ambiente de trabalho também ajuda. Para os funcionários atrasados em sua alfabetização digital, o uso da tecnologia em casa oferece oportunidades para experimentar e aprender.
Conversar com um amigo em uma chamada de vídeo em vez de mensagem de texto, por exemplo, pode ajudar a familiarizar um funcionário com os aplicativos que ele usará no trabalho. Já o uso de redes sociais pode ajudá-lo a acostumar-se com as formas de comunicação mais informais que ele irá encontrar nas ferramentas de colaboração no local de trabalho.
Zhou afirma que, embora a maior parte dos profissionais no mercado de trabalho talvez não precise de conhecimentos de computação muito complexos no momento, a alfabetização digital é uma necessidade básica em constante crescimento. Isso significa que os profissionais que mantêm seu conhecimento tecnológico atualizado continuam a evoluir em um mercado de trabalho em constante mutação, que valoriza cada vez mais os conhecimentos digitais.
“Os conhecimentos digitais acabam oferecendo maior poder de barganha no mercado de trabalho”, afirma Zhou. “O ambiente profissional mudou a favor de quem tem maior alfabetização digital.”
Leia a versão original desta reportagem no site BBC Worklife.
Por BBC