Um grupo de deputados começou a discutir a possibilidade de adiar as eleições municipais de 2020 por causa do coronavírus. O primeiro turno está marcado para 4 de outubro e o segundo, para o dia 25 do mesmo mês. O Congresso aprovou, nesta semana, a decretação de estado de calamidade pública para que o país possa lidar com a crise causada pela doença. A preocupação dos deputados com as eleições é que as medidas restritivas impostas para evitar a disseminação do vírus impeçam a realização de atos previstos no calendário eleitoral, como as convenções partidárias.
Segundo o deputado Capitão Augusto (PL-SP), líder da bancada da bala na Câmara, os deputados debatem propostas que vão desde o adiamento de 60 a 90 dias da data prevista para as eleições 2020, em outubro, até o adiamento por dois anos e unificação do pleito municipal com o presidencial, em 2022.
Mas ele considera ser muito cedo para tomar qualquer decisão. “A gente não sabe a extensão ainda [da crise]. É muito precoce tomar uma decisão agora, tem que esperar umas duas semanas. Mas se a crise continuar, é uma solução a se pensar”, disse Augusto.
A preocupação, segundo o parlamentar, é com atividades de campanha que exigem um contato mais próximo com eleitores e aglomerações de pessoas, como as convenções partidárias e comícios, além do próprio dia de votação.
De acordo com o deputado Paulinho da Força (SD-SP), o tema ainda é apenas conversa de bastidor na Câmara. “Foi apenas uma conversa de uma hora em que não se tinha nada para falar”, afirmou.
Não é o momento de pensar em eleições 2020, dizem deputados
Parte dos deputados ouvidos pela reportagem defende que não é o momento para discutir eleições. “Nesse momento a preocupação tem que ser cuidar da vida das pessoas. Todo resto é secundário”, disse Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). “Esse debate vai chegar, mas ainda não é prioridade”, defende o deputado. “Ainda é cedo para esta discussão. É uma preocupação, mas não é um assunto que está na pauta”, disse Paulinho da Força.
Para o deputado Ricardo Barros (PP-PR), vice-líder do governo na Câmara, a discussão sobre adiar as eleições nem sequer tem cabimento. “O Congresso Nacional não pode prorrogar mandatos, não tem essa prerrogativa”, disse. “Se o Congresso pudesse prorrogar mandatos, o Lula ainda seria presidente”, ironizou Barros. Segundo ele, a Constituição não permite abrir esse precedente.
Para Barros, a discussão não passa de oportunismo. “É uma discussão patrocinada por aliados de gente que quer continuar no poder. Não tem nada a ver com saúde pública, é oportunismo”, afirmou.
O deputado paranaense, que foi ministro da Saúde no governo Temer, também afirma que não há previsão de que a crise do coronavírus dure até julho, quando começam as convenções. “Especialistas projetam o pico de contaminação em abril e o encerramento em junho”, disse. “É uma discussão descabida porque não haverá crise de coronavírus em julho, agosto, setembro e outubro”, disse Barros.
“É uma discussão sem nenhum propósito, inapropriada e inoportuna”, criticou Orlando Silva (PCdoB-SP). “O foco do Congresso Nacional não deve ser discutir eleições, e sim combater a pandemia”, defendeu. O parlamentar acredita ser “pouco provável” que o adiamento das eleições avance no Congresso.
O deputado Paulo Pimenta (PT-RS) classificou a discussão como “extremamente temerária”. “Sou totalmente contrário [a adiar as eleições]. Não podemos afetar o funcionamento regular institucional no país em nenhuma hipótese”, disse. “Não se pode afetar a normalidade democrática e institucional”, completou.
Iniciativa de alterar calendário deve vir do TSE, defende deputado
Para Orlando Silva, qualquer iniciativa de alterar o calendário das eleições 2020 deve vir do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Tem que ser coordenado pela Justiça Eleitoral, se tiver que ser feito”, defende.
Para o advogado da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst), Diego Campos, a alteração no calendário eleitoral é possível através de uma proposta de emenda à Constituição (PEC). “Se o Congresso, em conjunto com o TSE, entender que é o caso, porque haverá prejuízo por causa de uma situação extraordinária, me parece que seria possível”, avalia.
A PEC, segundo Campos, teria que alterar de forma temporária dois artigos da Constituição: o artigo 29, que estabelece a data para realização das eleições (primeiro domingo de outubro); e o artigo 16, que determina que “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.
“Me parece que o mais correto seria fazer uma PEC para colocar uma regra temporária só para esse pleito”, explica o membro da ABDConst.
Campos, porém, considera o debate prematuro. “Penso que ainda é prematuro pensar nisso. É uma possibilidade, mas não se sabe a extensão disso [da crise do coronavírus]. No momento, não sei se essa situação seria palatável de decidir agora”, diz.
“Não sofro antes da hora”, diz ministro do TSE
O vice-presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, disse ao jornal O Estado de São Paulo que não “sofre antes da hora”, acredita que até outubro a pandemia do coronavírus “estará sob controle” e avalia que não há motivos para cogitar qualquer adiamento nas eleições municipais deste ano.
“Nós estamos em março. As eleições são em outubro. Não há por que cogitar de qualquer adiamento. Tenho a firme expectativa de que até lá a situação do novo coronavírus estará sob controle. Se não estiver, aí será o caso de se pensarem alternativas. Eu trabalho com fatos, e não com especulações. E não sofro antes da hora. Na vida, a maior parte das coisas que a gente teme não acontecem”, disse Barroso.
O ministro assumirá o comando da Corte Eleitoral em maio deste ano, substituindo Rosa Weber, e chefiará o tribunal durante as eleições. “Estamos cumprindo todos os cronogramas. A Justiça Eleitoral zelará para que tudo funcione da melhor maneira possível”, frisou Barroso.
Em nota, o TSE afirmou que “está atento e analisa o cenário atual com cuidado e atenção”. A Corte tem tomado medidas para prevenir o contágio, como realização de sessões presenciais apenas a cada 15 dias, criação de um gabinete de crise, estabelecimento de plantão extraordinário na Justiça Eleitoral e cancelando os eventos previstos para o mês de março.
“Informamos ainda, que de acordo com a Secretaria Geral da Presidência do TSE, o cronograma eleitoral está sendo cumprido e que, até o momento, o calendário eleitoral não sofreu alterações. Qualquer mudança nesse cenário será imediatamente informada”, disse o órgão em nota.
Nesta terça-feira (17), a presidente do TSE, Rosa Weber, adiou a realização das eleições suplementares para o Senado que aconteceriam no estado em 26 de abril. O despacho não marcou uma nova data para o pleito, que será deliberada oportunamente.
Segundo o TSE, a decisão “tem o objetivo de prevenir a expansão da pandemia do novo coronavírus, fundamentada em orientações das autoridades sanitárias que desaconselham a aglomeração de pessoas – como comumente acontece em dias de votação –, para se evitar a propagação do vírus”.
Já nesta quinta-feira (19), o TSE decidiu, por unanimidade, que não é possível alterar o prazo para filiação a um partido político para concorrer às eleições de 2020, mesmo com a crise do novo coronavírus.”
Veja as principais datas das eleições 2020
Até 3 de abril: janela eleitoral – período para trocar de partido para concorrer à eleição sem incorrer em infidelidade partidária;
4 de abril: Prazo para que novos partidos sejam registrados na Justiça Eleitoral para lançar candidatos;
15 de maio: Início da arrecadação de doações por pré-candidatos;
20 de julho a 5 de agosto: Convenções partidárias para escolha de candidatos;
15 de agosto: Prazo para registro de candidaturas;
16 de agosto: Início da propaganda eleitoral;
28 de agosto: Horário eleitoral gratuito em rádio e TV;
4 de outubro: Primeiro turno da eleição;
25 de outubro: Segundo turno para municípios com mais de 200 mil eleitores;
18 de dezembro: Diplomação dos eleitos”