Requerimento fala em ‘audiência conjunta’; político não confirmou presença. Suposto articulador de propina será chamado a depor, sem data prevista.
A CPI da Saúde na Câmara Legislativa do Distrito Federal aprovou nesta quinta-feira (21) um pedido de acareação entre o vice-governador, Renato Santana, e a presidente do sindicato dos servidores de saúde (SindSaúde), Marli Rodrigues. O procedimento foi sugerido em razão das contradições identificadas entre os depoimentos de um e outro à comissão, nesta quinta.
Oficialmente, o requerimento aprovado chama a acareação de “reunião conjunta”. O termo foi alterado para evitar a rejeição de deputados da base governista e do próprio vice-governador. Na prática, a reunião deve funcionar da mesma forma.
Um dos pontos contraditórios entre os dois depoimentos se refere a um dos áudios divulgados, em que Santana conversa com Marli e cita suposta autorização oficial para o pagamento da propina. “Autorizou a pagar 10% de propina. Eu não autorizei, mas o assunto chegou para mim”, diz ele.
Na manhã desta quinta, Marli afirmou que Santana atribuía a “autorização de propina” a Rodrigo Rollemberg. Confrontado, o vice disse “repudiar veementemente” a fala da sindicalista, mas não informou se outra pessoa seria responsável por esse aval.
Em função do cargo, o vice-governador não deve ser convocado, e sim, convidado. Isso significa que ele pode faltar à audiência sem apresentar justificativa. Em resposta ao deputado Wasny de Roure (PT), autor do pedido de acareação, Santana adiantou que não deve atender ao novo chamado da CPI.
“Eu acredito na competência da nossa Polícia Civil, que vai elucidar esse caso, como já elucidou uma centena de outros no prazo que a gente e que essa comissão precisa. Não quero concordar [com a acareação] nesse primeiro momento. Num segundo momento, se a investigação não resultar em nada, eu me disponho”, declarou Santana.
O requerimento foi aprovado com apenas dois votos favoráveis, dos deputados Wasny de Roure (PT) e Wellington Luiz (PMDB). Bispo Renato (PR), Cristiano Araújo (PSD) e Lira (PHS) se abstiveram, e Roosevelt Vilela (PSB) votou contra.
A comissão também aprovou a convocação de Marcelo Pereira da Silva, citado nos depoimentos pelo nome Marcelo Radical. A data não foi marcada. Segundo Santana, ele foi apontado por empresários como um “articulador” que prometia pagamento preferencial de faturas pendentes na Secretaria de Fazenda, em troca de propina. Silva abriu processo por calúnia contra o vice-governador.
Pela manhã, também foram aprovadas as convocações do ex-subsecretário de Logística e Infraestrutura de Saúde Marcos Junior e do atual ocupante do cargo, Marcello Nóbrega; do ex-secretário de Saúde Fábio Gondim; do ex-assessor de imprensa da Casa Civil Caio Barbieri e do médico Ivan Castelli, indicado para assumir a Saúde no início do governo Rollemberg, mas que acabou recusando o convite.
Áudios
Em entrevista na tarde desta quinta, Rollemberg disse que Marli Rodrigues “vai pagar muito caro” pelas denúncias “difamatórias e caluniosas” sobre o suposto pagamento de propina no GDF. Em depoimento à CPI, a dirigente sindical disse que o chefe do Executivo e a mulher dele, Márcia Rollemberg, têm ligação com irregularidades.
“É um absurdo que uma presidente de um sindicato, de forma leviana, sem apresentar nenhuma prova, sem apresentar nenhum fato concreto, faça acusações contra pessoas que têm a vida honrada. [Com] Pessoas assim nós vamos dialogar na Justiça. Eu tenho certeza que ela vai pagar muito caro pelas informações difamatórias e caluniosas que fez hoje à CPI.”
Questionada pelos deputados sobre qual a ligação de Rollemberg e da mulher com a suposta irregularidade, Marli se negou a dar detalhes, alegando que atrapalharia investigações em curso pelo Ministério Público do DF e pelo Ministério Público de Contas. Ela afirmou ter entregue todas as gravações e documentos aos órgãos.
Segundo Rollemberg, Marli e o sindicato são contra a mudança no modelo de administração nas unidades de saúde que o governo quer implantar. O chefe do Executivo disse que a implantação das organizações sociais como gestoras de hospitais e centros de saúde tem sido combatida por “interesses poderosos e milionários”.
“Nós enfrentando interesses corporativos para atender bem a população, com as organizações sociais, para levar médico onde não tem médico, levar enfermeiro onde não tem enfermeiro, e tem gente que não quer melhorar a saúde. E essas pessoas certamente estão buscando desacreditar o governo, mas não conseguirão”, disse.
Depoimento à CPI
Nesta quinta, a presidente do SindSaúde, Marli Rodrigues, entregou à CPI da Saúde da Câmara Legislativa um “organograma” manuscrito e um DVD com gravações que ela diz comprovarem um suposto esquema de propina na pasta. O conteúdo das gravações não foi revelado.
Questionada pelo deputado Reginaldo Veras (PDT), Marli disse que o ex-subsecretário de Infraestrutura e Logística da Secretaria de Saúde Marcos Júnior fez o documento enquanto explicava a ela as supostas irregularidades na pasta. Ela afirmou que ficou com o documento depois da conversa, que ocorreu em maio.
Em conversas com o vice-governador, Renato Santana, e com o ex-secretário de Saúde Fábio Gondim, reveladas na semana passada pela revista “IstoÉ”, Marli diz saber de um suposto esquema de pagamento de 30% de propina na Secretaria de Saúde.
Depois do vazamento das conversas, o governador Rodrigo Rollemberg determinou à polícia e à Corregedoria do GDF a abertura de investigações. O governador disse que já havia pedido apuração da Secretaria de Fazenda quando Santana relatou a ele, há cerca de três meses, a suposta cobrança de propina na pasta, mas que nada havia sido confirmado na época.
Marli também citou o subsecretário de Logística e Infraestrutura da Secretaria de Saúde, Marcello Nóbrega, como envolvido em supostas irregularidades, mas não disse que desvios ele teria cometido.
Veja abaixo a íntegra da nota da Secretaria de Saúde:
“Em relação aos fatos apresentados nesta quinta-feira (21), na Câmara Legislativa, a Secretaria de Saúde esclarece:
– Não é verdade que haja qualquer preferência na ordem dos pagamentos realizados pela secretaria. Alguns são priorizados em função do interesse público na manutenção da prestação dos serviços contratado, devidamente justificado em todos os processos. Exemplos são a alimentação dos pacientes nos hospitais, pagamentos de UTI e a aquisição de medicamentos.
– Não é verdade que houve, na gestão iniciada em 2015, aquisição de kits de dengue no valor unitário de R$ 55. Desde o início deste governo foram feitas duas compras de teste rápido de dengue, ao custo de R$ 9,30 a unidade. Em um primeiro momento foram adquiridos 6 mil kits, que totalizaram R$ 55,8 mil e, posteriormente, 6,5 mil unidades, que totalizaram R$ 60,4 mil. Neste momento, tramita na pasta um novo processo para a compra de mais 40 mil testes a R$ 8,48 a unidade.
– Não é verdade que a rede está desabastecida de marca-passos. Houve uma aquisição, em 2015, de 200 aparelhos, que foram entregues à pasta em fevereiro. Ao todo, foram investidos R$ 841,5 mil, valor que engloba os marca-passos, geradores, eletrodos e conjunto de introdutor para eletrodos.
– Que a portaria 276, de 2 de dezembro de 2015, está em vigor e delega novas atribuições ao diretor executivo do Fundo de Saúde do Distrito Federal. Esta norma faz parte da reestruturação da Secretaria de Saúde que alterou a estrutura administrativa. Assim, o Fundo de Saúde tornou-se responsável pelas despesas e a Subsecretaria de Administração Geral (Suag) passou a ter como atribuição, dentre outras coisas, a administração, tramitação de processos licitatórios e contratações. Tal medida foi tomada para garantir a segregação de funções, o que é recomendado por todos os órgãos de controle.
– Não é verdade que a Secretaria de Saúde dispõe de um contrato, no valor de R$ 12 milhões anuais, para fazer a manutenção de 1,7 mil veículos. Este serviço é prestado por meio de um contrato corporativo do governo de Brasília por meio da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão com a Ticket Car. Trata-se de ata de registros de preços, cujo valor anual máximo é R$ 11.897.987,58. O gasto mensal máximo pode chegar a R$ 991.498,97. O governo de Brasília nunca chegou perto de atingir esses limites anual ou mensal. Na verdade, até o presente momento, tem gerado economia ao governo.
– Que Marcello Nóbrega é economista, tem qualificação e experiência para o cargo que ocupa e nunca foi motorista da senhora Márcia Rollemberg.
– Ao contrário do que foi alardeado e prometido durante a última semana, a sindicalista não apresentou nenhuma prova das denúncias que fez.”