A defesa não negou as pedaladas, nem os decretos para liberar verbas, mas alegou que isso não justifica o afastamento da presidente.
Em Brasília, a defesa da presidente Dilma rebateu, nesta quinta-feira (31), às acusações de crime de responsabilidade na comissão de impeachment da Câmara.
A defesa não negou as pedaladas, nem os decretos para liberar verbas – mas alegou que isso não justifica o afastamento da presidente e que não é crime.
A defesa do governo foi feita pelo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, e pelo jurista Ricardo Lodi Ribeiro. Eles insistiram que essas manobras chamadas de pedaladas fiscais não aumentaram as despesas do governo, apenas adaptaram onde o recurso seria aplicado.
E o jurista alegou que mesmo se estivesse errado, esse procedimento seria classificado como desrespeito à lei de responsabilidade fiscal e não como crime de responsabilidade. E, segundo ele, isso não dá base para o pedido de impeachment.
O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, contestou as acusações feitas pelos juristas que pediram o impeachment da presidente Dilma. Disse que o governo não cometeu ilegalidade ao abrir crédito suplementar e que esses créditos não significaram aumento de gastos, mas um remanejamento de recursos.
“A criação de um crédito suplementar não implica necessariamente nem gera automaticamente um aumento de despesa. Nenhum dos seis decretos mencionados no pedido do processo de impeachment modificou a programação financeira de 2015. Um exemplo que acho mais adequado é o de uma ida ao supermercado, você vai com uma lista do que precisa comprar: arroz, feijão, macarrão, molho de tomate. O que é o seu limite financeiro? É o tanto de dinheiro que você tenho no bolso. É o tanto de dinheiro que eu tenho pra gastar naqueles itens da lista do supermercado. Ao caminho do supermercado, alguém da sua família te liga e fala assim: ‘Olha, em vez de comprar 1 kg de arroz, compre 2 kg. Você muda a lista de supermercado, muda a dotação orçamentária. Mas você continua com R$ 100 no bolso. Se você for comprar mais 2 kg de arroz, você vai ter que comprar menos das outras coisas. É essa a diferença entre o crédito suplementar e o limite financeiro de pagamento. O que os decretos fizeram foram aumentar as alternativas que o governo tem para aplicar o mesmo valor financeiro fixado no decreto de contingenciamento”, explicou o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.
O ministro também rebateu as acusações das pedaladas fiscais, quando o governo atrasou o repasse de recursos do Tesouro para bancos públicos, que tiveram de arcar temporariamente com o pagamento de programas sociais. No pedido de impeachment, os juristas disseram que, na prática, o governo fez empréstimos com bancos públicos, porque teve de pagar juros para compensar os atrasos. Nelson Barbosa explicou que as operações eram como contratos de prestação de serviços.
“Nesse contrato de prestação de serviços, o governo tem uma programação de quanto vai ser o desembolso de cada mês, e passa os recursos pro agente financeiro. Em determinado mês, em determinada semana, pode ocorrer que o valor que tem que ser transferido para a população não é exatamente igual ao valor que o governo transferiu para o agente financeiro. Pra lidar com isso, existe uma coisa chamada conta suprimento, em que acumula diferenças ou a favor da União ou a favor dos bancos públicos. E essa conta deve ser sanada periodicamente. Mas é um procedimento necessário. Ao longo de 2013 e principalmente no primeiro semestre de 2014, o valor dessa conta suprimento durante alguns meses ficou com valor excessivamente negativo contra a União e por um período longo de tempo. Essa metodologia de pagamento não foi objeto de questionamento por parte do TCU ao analisar as contas de 2011, de 2012 e de 2013. Foi objeto de questionamento do TCU em 2015, ao analisar as contas de 2014. O que é perfeitamente normal. Então, ao analisar as contas de 2014, o TCU entendeu necessário fazer um aprimoramento dessa metodologia para que esses repasses não levassem a acúmulos de saldos excessivos, sejam a favor da união, seja a favor dos agentes financeiros. E o governo atuou pra regularizar essa situação”, afirmou Barbosa.
O ministro da Fazenda concluiu a defesa da presidente explicando por que considera que não há base legal para o pedido de impeachment.
“No caso dos decretos de crédito suplementar, em primeiro lugar, eles estavam de acordo com a legislação em vigor prevista no artigo 4 da Lei Orçamentaria de 2015. Em segundo lugar, a criação de um crédito suplementar não implica necessariamente um aumento de despesa financeira porque esses créditos suplementares não alteraram o limite financeiro, não alteraram o decreto de contingenciamento de 2015. Muito pelo contrário, eles foram adotados depois de o governo aumentar o corte de despesas. No caso das chamadas operações em questionamento pelo TCU, o governo questionou a interpretação do TCU – a partir do momento em que a determinação do TCU se tornou formal e final, a partir de um acórdão por parte do TCU, imediatamente o governo mudou a metodologia de pagamento de equalização de taxas de juros, imediatamente o governo mudou a metodologia de reembolso do FGTS e pagou todos os valores de exercícios anteriores apontados pelo TCU”, concluiu o ministro Nelson Barbosa.
Em seguida, o professor de Direito Tributário da Universidade do Estado do Rio (Uerj), Ricardo Lodi Ribeiro, passou a dar explicações. Disse que o governo não descumpriu a meta de superávit primário.
“Em momento algum, no ano de 2014, ou no ano de 2015, nós tivemos o descumprimento da meta primária. E por uma razão muito fácil de entender: antes do final do exercício financeiro, no ano de 2015, o Congresso Nacional aprovou o PLN número 5 de 2015 e o PLN nº 5 reduziu a meta primária, admitindo um déficit de até R$ 100 bilhões. Então, na verdade, no momento em que o Congresso Nacional aprova uma lei alterando a meta do superávit primário, aquela condição que estava prevista na Lei de Orçamento, ela não será realizada”, explicou o jurista Ricardo Lodi Ribeiro.
O professor também argumentou que os atrasos nos repasses aos bancos não foram empréstimos.
“Imaginem os senhores que alguém contratasse um arquiteto para fazer um projeto de reforma para a sua residência. O projeto foi entregue no prazo, o tomador de serviço não pagou. É claro que o arquiteto tem um direito de crédito em relação ao tomador de serviço. Mas isso não constitui uma operação de crédito”, comparou o jurista Ricardo Lodi Ribeiro.
Ricardo Lodi negou que o governo tenha feito as tais pedaladas fiscais, mas afirmou que, mesmo se tivesse pedalado, isso só poderia ser considerado um desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal, e não crime de responsabilidade.
“É preciso lembrar que a lei do impeachment, a lei dos crimes de responsabilidade, em nenhum momento define, tipifica como crime de responsabilidade a violação da lei de responsabilidade fiscal. O que se pune é o atentado à lei de Orçamento. Não dá pra confundir a Lei de Orçamento com a Lei de Responsabilidade Fiscal”, completou o jurista Ricardo Lodi Ribeiro.
Os deputados que apoiam o governo da presidente Dilma elogiaram as explicações.
“Ficou absolutamente nítido que não só os decretos tinham a autorização legislativa pela Lei Orçamentária, como eles em nenhum milímetro atingiram ou ultrapassaram a meta fiscal do governo”, afirmou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).
Já a oposição, contestou.
“Assisti aqui o verdadeiro contorcionismo do ministro Nelson Barbosa na direção de justificar o injustificável”, disse o deputado Antonio Imbassahy (PSDB-BA), líder do partido.
A expectativa na comissão agora é em relação à apresentação da defesa da presidente Dilma Rousseff, que tem que ser feita até segunda-feira (4), é o último dia do prazo. O vice-líder do governo, deputado Paulo Teixeira pediu e presidente da comissão, Rogério Rosso, aceitou, que além de apresentar a defesa por escrito, o ministro da Advocacia-Geral da União, José Eduardo Cardozo, vá pessoalmente na segunda-feira à tarde para falar, dar detalhes sobre os argumentos que o governo está usando para defender a presidente Dilma Rousseff no processo de impeachment.
Depois que a defesa da presidente Dilma for apresentada, o relator da comissão especial tem o prazo de até cinco sessões para apresentar o parecer que será votado pelos deputados da comissão.