O frio que castiga, a seca que limita. Os caminhos, antes verdes, hoje, dão lugar à grama seca e pálida, amassada pelo ir e vir apressado dos brasilienses. Mas nem tudo é aridez no pedaço de chão que abriga a capital do país. É justamente quando a população se prepara para encarar o período de estiagem que pequenas pétalas de flores roxas surgem decorando os troncos tortuosos e galhos finos dos ipês da cidade. Com as delicadas folhagens, surgem também novos admiradores. Aqueles que antes passavam pelas plantas com um olhar avoado e preocupado, agora optam pelo andar calmo e desacelerado, em busca da maestria das árvores que colorem cada canto de Brasília. Tudo isso para encontrar e admirar as plantas roxas da cidade.
Diante da florada que surge, Patrícia decidiu dedicar um dia para sair em busca de atualizar o arquivo de fotos que tem com a árvore. “Quis tirar um tempo para fazer fotos com eles, abraçar uma árvore. Não chego a ser uma colecionadora de fotos, mas tenho várias que posto, mando para os amigos”, cita. Dentre as favoritas, a servidora pública cita o amarelo. “Me remete à luz e é um dos cartões postais da cidade, né? Ainda que não seja uma característica exclusiva daqui”, diz. Moradora do Jardim Botânico, Patrícia conta que a paixão é tamanha que decidiu, inclusive, plantar um ipê amarelo em casa. “Consegui uma muda e plantei. Mas tem dele em vários lugares do DF e sempre saio pra ver como estão. Gosto muito dos que têm na L4, e em frente à Catedral”, diz.
A paixão pela árvore fez com que servidora pública conhecesse sua xará, a nutricionista Patrícia Tavares, 40 anos. Enquanto faziam fotos, no ipê do Parque da Cidade, as admiradoras da planta se conheceram, fizeram amizade e tiraram a manhã para curtir a companhia das flores. A nutricionista conta que sempre vai até o local acompanhar o desenvolvimento da árvore. “Eu coleciono fotos desse ipê. Inclusive, tenho fotos dele na seca, florido, na época em que as flores estão bem verdes, gosto bastante. O tempo inteiro tiro foto e fico comparando, porque acho que a vida da gente é assim. Tem momentos floridos, outros estão mais secos, outros mais verdes. E aí fico pensando, sabe? Analisando a vida”, diz.
Moradora do DF há sete anos, Patrícia conta que é natural de Goiás e que lá não se vê tantas espécies de ipês como na capital federal. “Eu até já encontrei no meio do cerrado, mas nada se compara à quantidade que encontramos aqui, em Brasília”, diz. Apesar de ser fã do ipê roxo, a nutricionista diz que a cor favorita ainda é a branca. “Apesar de serem minoria aqui no DF, eu sei onde tem, mapeio todos eles e gosto demais”, explica. Dentre os pontos favoritos da nutricionista para fazer fotos, está o ipê em frente ao Sebrae, no Sia.
Contemplação
Contemplar pode ser, também, uma viagem no tempo. Diante do casco seco e das flores coloridas, pessoas como Patrícia enxergam, ainda, as dores e alegrias da vida. Para quem mora na capital, o ipê vai além de uma planta: é também história. O aposentado João Pinto, 84 anos, é exemplo disso. Acumulador de histórias, o morador do Sudoeste aproveita a beleza do ipê roxo que tem próximo de casa para admirar e recordar sua longa e bem vivida história. Para ele, a árvore se destaca em meio à flora do DF. “Na floresta, quando você viaja, por exemplo, os ipês dão destaque em tudo. Mas nunca vi, em outros lugares do Brasil, ipês como esses”, diz.
Enquanto caminhava para o mercado, João tirou alguns minutos para contemplar a árvore. O olhar, apaixonado, é reflexo do encantamento pela espécie de planta. “Vejo esses ipês florescendo todo ano, e meus favoritos são o roxo e o amarelo. Eu estava viajando para o interior, e quando voltei, vi esse (ipê). Tive que parar para admirar um pouco”, justifica. Para o aposentado, os moradores precisam valorizar mais a paisagem natural de Brasília. “Nós temos muitas árvores aqui”, justifica.
A rotina da aposentada Rita Dias, 74, não foi diferente da de João. A moradora do Cruzeiro também saiu, a pé, para ir ao mercado quando encontrou o ipê no meio do caminho. “Esse é o primeiro ipê grande que vejo nesses dias, é muito bonito”, diz. A aposentada, que mora há cerca de um ano na região administrativa, mudou-se para o Cruzeiro com o intuito de ficar mais próxima do filho. “Antes eu estava na Asa Norte e lá tem muitos ipês, sinto saudade”, garante. A história da aposentada também acumula uma série de vivências e, de acordo com ela, o ipê ajuda a recordar algumas de suas boas memórias. “Eu já vi no Piauí, onde eu nasci. Quando era mais nova, tinha uma avenida cheia de ipês. Mas nada se compara ao que encontramos aqui em Brasília. Apesar da lembrança, o ipê ainda me remete a Brasília”, diz.
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Por Correio Braziliense