Instituições particulares afirmam que não houve diálogo com educadores e que o texto é redundante. Secretaria de Educação vai à Justiça contra a lei.
Representantes das escolas particulares do Distrito Federal afirmam que a lei que institui conteúdos de educação moral e cívica na matriz curricular é redundante. O coordenador pedagógico do Mackenzie e membro do Conselho de Educação do DF, Marco Antônio Del Isola, afirma que os conteúdos já são abordados em momento exclusivos e também em disciplinas diversas.
No caso específico da escola, as crianças da educação infantil já participam de um “momento cívico”, com interação com o hino e a bandeira nacional, explica o educador. Os alunos do ensino fundamental têm contato direto com a Polícia Militar por meio do Programa Educacional de Resistência às Drogas, o Proerd. Del Isola afirma que, por isso, a instituição não deve mudar sua rotina.
Já a Secretaria de Educação, responsável pelas escolas públicas, informou vai recorrer à Justiça contra a lei pela mesma razão.
Publicada no Diário Oficial na última sexta-feira (9), a lei dá prazo de 120 dias para que o Conselho de Educação do DF faça a regulamentação para que conteúdos de moral e cívica estejam na grade curricular dos ensinos infantil e fundamental.
O projeto havia sido vetado pelo governador Rodrigo Rollemberg (PSB), mas a decisão foi revertida pela Câmara Legislativa que fez valer a lei de autoria do deputado Raimundo Ribeiro (PPS).
Outras escolas particulares
Ocoordenador do ensino fundamental do Colégio Pódion, César Berçott, afirma que a maioria das escolas possui conteúdos “de cidadania”, como conceitos básicos de trânsito e significado das bandeiras.
Segundo ele, esse seria o chamado “currículo oculto” – conjunto de conteúdos que não são explícitos na matriz curricular, mas são trabalhados em sala de aula.
“Na verdade é uma lei que chove no molhado, não está revolucionando nada, só tirando do currículo oculto e colocando no aparente.”
A coordenadora de educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental do Sigma, Maria Itelvina Prateado, afirma que a instituição também já trabalha os conteúdos de forma transversal. Ela lembra que há uma lei federal que determina a execução do hino nacional semanalmente, por exemplo –, e diz que isso é seguido pela escola.
A educadora aponta, ainda, que a instituição possui um programa de convivência ética e moral, realizado em parceria com a Unicamp, e que é necessário entender o que a nova lei muda.
“Esses conteúdos eram obrigatórios na época da ditadura militar. Como nós estamos em momentos históricos diferentes, precisamos ainda entender essa intencionalidade e como vai funcionar”, afirma.
Falta de diálogo
O coordenador do ensino fundamental do Pódion criticou o período destinado à regulamentação do texto – 120 dias após a aprovação da matéria. De acordo com ele, as escolas foram surpreendidas com a nova lei, que “age de modo autoritário”.
“Me surpreendeu ser obrigado a partir de julho. É uma coisa estranha para a escola, porque nós funcionamos com cronograma, com horário, existe um planejamento.”
Além do curto prazo, a lei já teria nascido ultrapassada, afirmou o coordenador pedagógico do Mackenzie, Marco Antonio Del Isola. Enquanto o texto fala em “grade curricular”, o termo mais usado por educadores, atualmente, trata da “matriz curricular”.
Del Isola indicou ainda que, de acordo com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), um conteúdo programático não pode ser imposto por meio de decreto. “Eu não vejo que seja o momento adequado, com a BNCC trabalhando competências gerais como respeito à diversidade e aprendizado da convivência com o outro”, disse.
O coordenador pedagógico observa que, hoje, existem pelo menos cem projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional para tornar disciplinas obrigatórias.
“Quem quer aprender tudo, nada aprende. Os melhores sistemas de ensino fazem uma simplificação dos saberes necessários. Nós vivemos na contramão do mundo civilizado.”