Uma em cada dez brasileiras contaminadas por HIV, o vírus causador da aids, é prostituta. Desde o início da epidemia no País, o grupo apresenta uma alta taxa de prevalência da doença: cerca de oito vezes maior do que entre a população em geral.
Embora seja apenas uma estimativa, os números demonstram as razões da preocupação de especialistas com o impacto da proibição feita na semana passada pelo Ministério da Saúde de campanhas de prevenção com linguagem que vai além do “use preservativo”.
“Prevenção é muito mais do que isso”, diz a diretora da Coordenação do Programa Estadual de DST/Aids, Maria Clara Gianna. E ela já avisa: materiais voltados para população específica, com linguagem própria e procurando ressaltar a autoestima, vão continuar. “Esse sempre foi o modelo usado no País. Ele é bem-sucedido e não há razões para querer alterá-lo”, diz.
Maria Clara conta que nesta semana comunicado de outros programas locais de prevenção de DST/aids deverá ser encaminhado ao Ministério da Saúde para defender a estratégia até agora usada. Ela diz ter ficado surpresa com a decisão do ministério de censurar a peça “Sou feliz sendo prostituta”.
Mensagem. O material, divulgado pelo Estado, foi suspenso pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, três dias depois de ser lançado. Como justificativa, ele afirmou que a peça não trazia mensagem de prevenção. “Esse não foi o primeiro material produzido com essa abordagem. Não são raras as mobilizações feitas com a participação de grupos específicos”, diz Maria Clara.
O pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) Alexandre Grangeiro diz temer o impacto da reação do ministério. “O veto sinaliza para a sociedade que o governo brasileiro está se filiando a uma estratégia contrária ao reconhecimento da prostituição como profissão. Isso acaba jogando o grupo à clandestinidade, o que as torna ainda mais suscetíveis à violência.”
Conhecimento
Grangeiro afirma haver um escasso conhecimento sobre a epidemia de aids entre as profissionais do sexo. “Ser soropositiva pode representar ficar sem trabalho. Há uma pressão para que elas deixem a atividade nessas condições”, diz.
O preconceito afasta as prostitutas dos centros de saúde. “O maior desejo delas é serem reconhecidas.” A estimativa é de que a prevalência de aids entre prostitutas seja de 6%. Na população em geral é de 0,56%. “Desde o início da epidemia, o grupo se mostrou vulnerável. Algo que nunca caiu e que apresenta agora tendência de agravamento”, diz Grangeiro. “Os números poderiam ser maiores. Os indicadores mostram ser necessário um reforço maior do que já vem sendo feito.”