A escritora brasiliense Gisele Gama vive uma ótima fase. Conhecida pela série de livros infantis Sara e sua turma — franquia protagonizada por uma criança negra e que aborda temas como inteligência emocional e diversidade —, nos próximos dias a escritora e educadora lança o primeiro livro voltado para o público adulto, recebe um importante título na Áustria e divulga o primeiro episódio do desenho animado em 3D do best-seller infantil do qual é autora. Tudo isso, enquanto dá um belo giro pela Europa de meados de outubro até o início de novembro e dias depois de ter sido anunciada como semifinalista do Prêmio Brasil Criativo — cuja a lista foi divulgada em 2 de outubro.
De 16 a 20 de outubro, a escritora participará do estande da Publisher na Feira Internacional do Livro de Frankfurt, a maior feira literária do mundo, realizada há mais de 500 anos na Alemanha.
Na ocasião, a escritora lançará o livro Preto no branco, uma coletânea de textos em que Gisele traz as temáticas já abordadas na série infantil para um universo, por assim dizer, mais maduro — a obra teve pré-lançamento na última sexta-feira (4/10) no Brasil, antes da escritora partir pra Europa. “Comecei escrevendo os livros da Sara e sua turma e, trabalhando com inteligência emocional, fui me envolvendo com pessoas e com as histórias dessas pessoas, e achei que já era hora de começar a escrever também falando com o coração destes adultos”, explica a escritora.
No livro, que transita livremente entre a prosa e a poesia, Gisele abandona a persona de “mãe da Sara”, como narradora, e passa a ser ela mesma. “Com as crianças, falo preocupada com a linguagem delas. Escuto muito as crianças para usar essa linguagem nos meus livros infantis. Já nos livros de adulto, falo de adulto para adulto, então é o meu pensamento revelado”, revela.
Temáticas habituais de Gisele são transportadas para uma outra linguagem, como direitos humanos e intelegência emocional, que, para ela, é uma das competências que mais fazem falta no mundo atual. “Não estamos muito preocupados, na educação, em lidar com questões que não são cognitivas e, hoje, somos consequência disso. Nós temos uma sociedade que não trabalhou a empatia, não se preocupa com os sentimentos do outro, e não se conhece. São pessoas que não se perguntam e não querem respostas sobre si mesmas”.
Para tanto, a escritora lança mão de um trabalho extremamente pessoal. “Entendo que não se fala de inteligência emocional sem envolver a criança, ou o adulto, nessa emoção. Cada livro (da série Sara) fala sobre uma coisa específica: sentimentos de inveja, mentira, receio quando chega um irmão novo, a perda de um ente, responsabildiade das crianças, autoconhecimento, autoestima, relacionamento com os outros e as diferenças. Todas essas coisas são temas da minha literatura. Com os adultos, falo de mim, e acho que, quando me apresento, também dou a possibildiade do outro se enxergar. Porque é isso que é o relacionamento: são os espelhos e a possibilidade da gente se entender”, destrincha.
“Na essência, ele é uma poetização daquilo que sinto, e colocando para fora me apresento. Fundalmentalmente, ele é a construção da minha inteligência emocional”, completa sobre a obra. O tema é ainda assunto para a palestra que Gisele fará em 19 de outubro na feira.
Embaixadora da paz em Viena
Saindo da Alemanha, a escritora parte para Viena, onde será agraciada como título de Embaixadora da Paz na Áustria, em reconhecimento aos serviçoes prestados à infância. “No Brasil, nós temos muros invisíveis a derrubar. Não tenho espaço para Sara e sua turma garantido nas livrarias e nas escolas, como tenho no mundo”, explica.
Entre 23 e 26 de outubro, além da cerimônia, ela fará algumas palestras e participará de reuniões técnicas para definir ações na Europa em 2020. “A Áustria conheceu o meu trabalho porque o Japão reverencia Sara e sua turma. Lá no Japão, conheceram o meu trabalho, entenderam a importância e resolveram fazer esse convite, e ele casou maravilhosamente bem com Frankfurt, então foi um encontro abençoado”, comemora.
Sara e sua turma
Com mais de 75 títulos publicados, um canal no YouTube com desenhos em 2D e com bonecos e uma série de jogos, a franquia Sara e sua turma ganhou também um desenho em 3D. Realizado em parceria com a produtora Plural, a maior do ramo na América Latina, o desenho terá o primeiro episódio lançado na feira em Frankfurt, onde será exibido de 16 ao 20 de outubro.
Depois disso, a animação segue com Gisele, já embaixadora, para Portugal, onde a autora lançará a produção em 31 de outubro, com sessão de autógrafos, e participará de uma reunião no Porto para divulgar a série. A artista ainda lançará Preto e Branco, em Leiria, e o desenho animado na Casa de Cultura de Sintra, com sessão de autográfos. Em 4 de novembro, participará ainda de uma reunião para definir ações para 2020 no país.
Muros invisíveis
Gisele faz questão de dizer que a viagem não seria possível sem o apoio da Secretaria de Cultura, que entendeu a relevância do trabalho e abraçou a causa, e reconhece também a parceria da Fundação Palmares, que viabilizou a participação na Feira. “A Fundação Palmares abraça as questões de igualdade racial, que são uma luta que tenho, e, também por isso, o livro se chama Preto no branco. A Sara é uma personagem negra, então a Fundação Palmares tem um espaço na Publisher e me convidou para fazer uma fala no dia 19, sobre identidade, inteligência emocional e auto estima” conta.
Por outro lado, uma vez mais, lamenta as dificuldades enfrentadas no próprio país. “Não conseguimos apoio da Ancine, e, no Brasil, é muito difícil trabalhar com inclusão, com personagens negros… Precisamos ter esse apoio de uma empresa que já trabalha no mundo para finalmente lançar o desenho. São muros invisíveis, como eu falei”, explica.
A menina que gostava de saber é o primeiro episódio de quatro que serão produzidos como piloto, para tentar negociar espaço com canais de televisão e outros veículos. A primeira temporada terá 12 episódios, mas Gisele adianta que o plano é produzir todos os 75 livros. Por enquanto, a série só será exibida no exterior, nas incursões da autora, que explica que produzir uma série de 12 episódios custa no mínimo R$ 3 milhões: “É uma coisa que não conseguimos fazer sozinhos”.