O bar e restaurante faz aniversário com muitas histórias para contar
Quem chega ao Feitiço Mineiro, mesmo sem tê-lo conhecido antes, de imediato vai perceber que está numa casa de música. A constatação é fácil de fazer: basta olhar para os painéis existentes na parte superior das paredes externas, para ver reunidas fotos de alguns dos maiores nomes da MPB – de Baden Powell a Dona Ivone Lara, de Fernando Brant a Claudete Soares, de Billy Blanco a Luisa Possi.
Todos esses grandes artistas e muitos outros mais passaram pelo palco do bar e restaurante da 306 Norte, no transcorrer dos 27 anos de existência, transformando-o numa referência de música de qualidade na capital federal. Nesse período incontáveis projetos, shows memoráveis, celebrações diversas ocorreram ali, estimulados por Jorge Ferreira, um misto de empresário, poeta e mecenas, onírico personagem da cultura brasiliense.
Quem não se lembra do Gente do Samba, projeto idealizado e dirigido por Sônia Alves que movimentou o Feitiço, entre 2000 e 2007? Durante a realização da série de shows, aquele espaço se tornava o centro das atenções na cidade. Todo mundo queria assistir às apresentações dos mestres Monarco, Nelson Sargento, Noca da Portela, Nei Lopes, Walter Alfaiate, Wilson Moreira, Wilson das Neves e de Dona Ivone Lara.
“Eu organizava a lista de convidados e, sentada com o Jorge na grande mesa do restaurante, definíamos quem tomaria parte na programação. Todos adoravam participar do Gente do Samba e com eles tínhamos ótima convivência. Os shows superlotavam a casa e havia total interação entre palco e plateia”, lembra Sônia. “Mas não era somente o pessoal da velha guarda que tomava parte do projeto. Novos sambistas, em início de carreira, como Mart’nália, Teresa Cristina, Diogo Nogueira, Pedro Miranda e os grupos Casuarina e Sururu na Roda vieram a Brasília pela primeira vez, para se apresentar no Feitiço”, acrescenta.
Clube da Esquina
Outro momento memorável foi o vivido nas comemorações dos 20 anos da casa. “Naquele ano, durante uma semana, o Feitiço se transformou numa filial do Clube da Esquina. Recebemos aqui, Lô Borges, Beto Guedes, Flávio Venturini, Fernando Brant, Tavinho Moura, Toninho Horta, Márcio Borges, Murilo Antunes. Embora tenha sido convidado, o único que não veio foi Milton Nascimento”, recorda-se Jerson Alvim, que desde dezembro de 2008 ocupa a função de diretor artístico do Feitiço. “O Jorge viveu momentos de encantamento, cercado por todos aqueles conterrâneos ilustres, que foram recebidos com entusiasmo pelo público”, complementa.
Jerson trouxe para o Feitiço a experiência adquirida durante os 27 anos que cuidou da parte artística do mítico Canecão, no Rio de Janeiro, convivendo com artistas renomados, como Bibi Ferreira, Roberto Carlos, Maria Bethânia, Alcione, Rita Lee e Lulu Santos. “Aqui nos últimos oito anos, tenho criado alguns projetos, voltados principalmente para artistas brasilienses”, diz. Ele destaca, entre outros, Elas têm feitiço e Eles têm feitiço.
Um outro feito de Jerson foi dar mais espaço para sambistas como Makley Matos, Renata Jambeiro e Dhi Ribeiro. Com o aval de Jorge Aragão, ele apresentou Dhi a José Éboli, presidente da Universal Music. Contratada pela gravadora, a cantora lançou em 2009 o CD Manual da mulher. Entre outras apostas desse especialista estão o percussionista Carlos Pial e a cantora Cely Curado. “Os dois fazem muito sucesso em Brasília e já deviam ter estourado nacionalmente”, afirma.
Hoje, às 21h30, Cely, ocupa o palco que considera “espaço de resistência”. No show Tem Minas no Feitiço, ela, Sandra Duailibi, Lúcia de Maria, Sandra Borges e Amanda Costa interpretam um repertório em que dão ênfase a canções de compositores mineiros. “Me a apresento no Feitiço há pelo menos 20 anos. Sempre o vi como um porto seguro para o meu trabalho; assim como para o de muitos outros artistas da cidade, que recebem ali tratamento semelhante aos de nomes consagrados da MPB”, enfatiza.
Quem também, há muito tempo, tem presença constante no local é a banda Let it Beatles. “Há 14 anos, intercalamos shows esporádicos com longas temporadas no Feitiço e costumamos ter casa lotada em nossos shows. Na plateia, há desde fãs do Beatles a pessoas que acompanham nossa carreira desde o começo, além de antigos frequentadores da casa que nos prestigiam”, ressalta Igor Karashima, baterista da banda cover dos Fab Four.
Para ele, com o fechamento do Gate’s Pub, o Feitiço Mineiro ficou sendo o “último reduto” para músicos, cantores e bandas da capital. “O Feitiço se caracteriza por oferecer programação musical variada, de segunda-feira a sábado, comida de altíssima qualidade e um serviço de primeira. E ainda conta com o Magela, um técnico de som muito bom, que inclusive trabalha com a Let it Beatles nos shows mos em outros lugares”, elogia.
Referência cultural
Mauro Calichman, um paulistano que há 12 chegou a Brasília, a convite de Jorge Ferreira, para gerenciar as casas do grupo, não demorou muito para ter uma “relação afetiva” com o Feitiço Mineiro. “O Jorge não escondia que o Feitiço era a sua menina dos olhos. Esse entusiasmo ele passava para nós que trabalhávamos com ele”, revela.
Calichman, hoje, não tem dúvida. “O Feitiço, ao longo de 27 anos de existência tornou-se uma referência na vida cultural da cidade. Embora originalmente seja um bar e restaurante, a casa entrou para a história como um tradicional palco de show. Por onde já passaram alguns dos mais importantes nomes da música popular brasileira. Foi aqui, por exemplo, onde Baden Powell fez seu último show em Brasília”, lembra.
O gerente faz questão de destacar também o fato do Feitiço ser um estuário para o trabalho dos artistas brasilienses. “O Jerson, responsável pela programação, tem criados projetos que acolhem instrumentistas, cantores e bandas da cidade. O funcionamento ali é contínuo. Abrimos as portas de segunda-feira a sábado, das 11h30 até o último cliente. No domingo, vai até as17h. Nisso, obviamente inclui o serviço de bar e restaurante.”