Catadores transferidos para galpões de reciclagem reclamam de redução na renda. Governo anuncia mudança em modelo de compensação aos trabalhadores.
Ofechamento oficial do Lixão da Estrutural, em Brasília, completa um mês nesta terça-feira (20). Um dia antes, na segunda (19), o governo do Distrito Federal (GDF) informou que vai mudar o modelo da compensação financeira paga aos 1,2 mil catadores que decidiram trocar a coleta no antigo depósito pelos galpões de reciclagem.
De acordo com o GDF, as quantias de R$ 360 paga aos trabalhadores, como uma forma de “compensar a transição”, assim como o valor cobrado pela tonelada de material coletado (cerca de R$ 300), serão pagos a cada 15 dias aos catadores e às cooperativas, respectivamente. Até então, os valores eram depositados uma vez por mês.
Para a diretora do Serviço de Limpeza Urbana (SLU), Kátia Campos, a mudança neste item do contrato é considerada um “salto muito grande” no processo pós-fechamento do lixão. O objetivo, segundo ela, é “escalonar o pagamento de forma que o trabalhador não fique o mês inteiro sem receber”.
“Como no lixão eles recebiam por dia, por mês é mais difícil para eles. O pagamento pela tonelada será feito de duas vezes, e a bolsa vai ser depositada em um período intercalado.”
Além disso, o GDF disse ainda que está aperfeiçoando o controle do pagamento da bolsa. A previsão é de que a quantia continue sendo paga por até seis meses. “Havia muitas pessoas homônimas e com CPF errado”.
“Estamos aperfeiçoando a lista de nomes de catadores [que estão em galpões] para que haja um menor número de erros possível.”
O que mudou para catadores
Para quem conviveu com o lixão por mais de 25 anos, os primeiros 30 dias após a desativação do local representou, principalmente, a queda nos rendimentos da família.
A ex-catadora de materiais recicláveis Selma dos Santos, de 40 anos, tem seis filhos. Ela contou à reportagem que desde janeiro, quando o local foi fechado, passou a buscar por “bicos” já, que segundo ela, “não havia espaço para trabalhar nos galpões”.
“Me cadastrei para ir, mas não tem espaço para mais de 600 pessoas nos galpões.”
Para não ficar sem renda, a moradora da Estrutural disse que trocou o trabalho com recicláveis por outro. Selma agora é manicure e afirma ganhar apenas 40% do que faturava no antigo lixão.
Já o GDF, esclarece que a afirmação não é verdadeira. A diretora do SLU garante que “há espaço nos galpões”. De acordo com o órgão, há cinco espaços destinados à separação de material em todo o DF, e que do total de 1,3 mil catadores cadastrados em cooperativas interessadas em prestar o serviço, 613 já atuam diariamente no local.
Já a catadora Zilma da Silva, de 53 anos, disse, que apesar da renda mensal ter diminuído de R$ 2 mil para cerca de R$ 600, a rotina de trabalho ficou “mais digna”. “A gente trabalha na sombra, não toma sol nem chuva”, conta.
E para outros moradores?
Uma líder comunitária da região da Estrutural contou ter mais de 100 vizinhos e amigos “desempregados”. A situação, segundo ela, se acentuou após o lixão ter sido desativado. Para a moradora, o fechamento do depósito interferiu no comércio da cidade e também no rendimento das famílias.
Questionada sobre a situação, a diretora do SLU, Kátia Campos, afirmou à reportagem que, apesar de muita coisa ainda precisar ser feita, a desativação foi uma “evolução enorme”. “Nenhum cidadão deveria admitir que outros seres humanos vivessem naquela situação”, pontua.
“Enquanto o problema ficava escondido embaixo do tapete ficava mais fácil da sociedade aceitar. Mas quando o desafio é exposto, o governo vai atrás para solucionar”, afirma. “Qualquer problema que está havendo na Estrutural hoje, existia enquanto ainda funcionava o lixão”, conclui Kátia.
“O lixão existia para esconder problemas sociais. Mas para enfrentar os desafios e dar solução a eles, é preciso que os problemas sejam mostrados.”
Sem resíduos domésticos
Apesar de fechado para o recebimento de resíduos domésticos, o Lixão da Estrutural continua recebendo os entulhos provenientes da construção civil. Em média, por dia, o local recebe cerca de 4,8 mil toneladas de material seco, considerados pelo SLU como “inerte”, e, portanto, “sem prejuízo ao meio ambiente e lençol freático”.
Balanças instaladas na entrada do antigo depósito fazem a pesagem dos caminhões que descarregam o entulho no local. De acordo com o GDF, uma mudança de atribuição da Agência de Fiscalização (Agefis) – que antes só multava – permitiu que o órgão passasse a apreender veículos que descartem materiais de construção em local irregular.
Ainda segundo o SLU, o entulho que chega ao local é aproveitado para ajudar na cobertura dos rejeitos domésticos que foram depositados no lixão ao longo de mais de 60 anos. A previsão é de que após uma licitação, o material seco seja gerido por uma empresa privada.
Após os 30 dias de inatividade, a lagoa de chorume que existe no local está com a metade da capacidade. O recipiente não foi desativado já que ainda há resíduos em decomposição no terreno. Enquanto isso, eventualmente, o líquido poluente é drenado por canos até a terra, evitando assim que a capacidade seja totalmente preenchida e transborde.
Coleta seletiva
Ainda na semana em que se completa um mês de fechamento do local, o GDF anunciou também que vai ampliar o número de regiões atendidas pela coleta seletiva. Até o último balanço, 16 regiões eram contempladas com a separação do lixo. A partir da próxima segunda (26), serão 25.