Grupo é acusado de lavagem de dinheiro, peculato, falsificação de documento público e dispensa de licitação. Caso será julgado pela 1ª Vara Criminal.
Ministério Público denunciou um grupo de 13 pessoas à Justiça suspeitas de articularem a contratação da Cruz Vermelha de Petrópolis pela Secretaria de Saúde do Distrito Federal. Para o MP, o acordo entre o governo do DF e a entidade foi feito de forma irregular.
O grupo – incluindo ex-gestores da secretaria, ex-membros do Conselho de Saúde, e a cúpula da organização social – é acusado de lavagem de dinheiro, peculato e dispensa de licitação. Pela legislação, os crimes preveem até 27 anos de prisão. Um dos suspeitos também é acusado de falsificação de documento público (veja o detalhamento da denúncia ao longo deste texto).
A denúncia é consequência das duas fases da operação “Genebra”, realizadas em junho, que contaram com busca e apreensão na Secretaria de Saúde e prisão preventiva ou condução coercitiva de alvos. Se a 1ª Vara Criminal aceitar a denúncia, o grupo passa a ser considerado réu. O G1tenta contato com a defesa dos acusados.
O objetivo é punir os responsáveis pelo desvio dos R$ 3,46 milhões repassados à Cruz Vermelha de Petrópolis, quando a organização foi contratada em 2010 para administrar as unidades de Pronto-Atendimento (UPA) do Recanto das Emas e de São Sebastião.
O acordo foi suspenso dois meses depois, e a organização social (OS) não prestou de fato nenhum serviço, afirma o MP. Corrigidos, os valores ultrapassam R$ 9,7 milhões.
Dispensa de licitação
De acordo com o MP, entre agosto de 2009 e agosto de 2010, o grupo se uniu para praticar “de forma livre e consciente atos a fim de dispensar licitação fora das hipóteses legais”.
Em 2009, a entidade pediu para ser reconhecida como organização social, sendo que “não possuía estrutura ou capacidade técnica para sequer se qualificar como OS”. Apesar dos obstáculos jurídicos, ela acabou conseguindo ser vista como OS pelo governo: primeiro passo para ser contratada.
Para as promotorias de Defesa da Saúde e do Patrimônio Público, foi tentado dar “ares de legalidade” na contratação da Cruz Vermelha. O MP argumenta também que a entitidade era munida de informações privilegiadas durante todo o processo.
Na denúncia, o MP menciona que a entidade articulou a publicação de trechos do edital em jornais de grande circulação, mas isso só ocorreu “muito tempo após a própria Cruz Vermelha filial Petrópolis demonstrar seu interesse em gerir UPAS no Distrito Federal [do Recanto das Emas e de São Sebastião]”.
“Resta evidente o direcionamento da licitação para favorecer a Cruz Vermelha filial Petrópolis. A dispensa ilegal de licitação só foi possível com a reunião e o concatenamento de inúmeras condutas criminosas praticadas por funcionários públicos do Distrito Federal, os quais contribuíram para beneficiar os dirigentes da Cruz Vermelha.”
Do lado da Secretaria de Saúde, o MP sustenta que ex-gestores da pasta buscaram “acelerar” a contratação da entidade apesar de pareceres jurídicos indicarem que havia necessidade de mais informações antes de fechar acordo.
A irregularidade, que poderia ter sido identificada no Conselho de Saúde, acabou referendada pelos conselheiros, dizem os promotores. Em uma das reuniões, os conselheiros leram um relatório da Procuradoria-Geral do DF dizendo que não foi respeitado o rito legal para que a Cruz Vermelha virasse OS. Ainda assim, o conselho aprovou a contratação.
“Todos os conselheiros, portanto, tinham plena ciência quanto a ilegalidade do procedimento adotado pela SES/DF em relação ao edital de chamamento público n° 01/2009.”
A dispensa de licitação para contratar a OS foi ratificada em 28 de maio de 2010. No mesmo dia, foram autorizados o pagamento e a emissão de notas de empenho.
“Dessa forma, verifica-se a pressa em pagar a Cruz Vermelha, já que a autorização de dispensa de licitação, a sua ratificação e o empenho foram todos realizados no mesmo dia.”
Documento falso
O MP argumenta à Justiça que a Cruz Vermelha de Petrópolis usou documento falso no processo para ser contratada.
A entidade apresentou o certificado de regularidade do FGTS, supostamente emitido pela Caixa, no qual constava que estava em situação regular perante o fundo de garantia.
Questionada pelo MP, a Caixa diz, no entanto, que não foi emitido qualquer certificado de regularidade para tal entidade entre 16 de setembro de 2009 e 13 de julho de 2010.
Peculato
Para o MP, o objetivo do esquema era desviar dinheiro público. Após a contratação, na época, a Secretaria de Saúde tentou reaver o dinheiro, mas a OS argumentou que já haviam sido feitos gastos e compromissos com o dinheiro público, e pediu reconsideração – sem juntar qualquer documento ou prova de que o dinheiro seria ou estava sendo usado na gestão das UPAs.
Lavagem de dinheiro
O Ministério Público afirma à Justiça que os denunciados “iniciaram a lavagem do dinheiro de que haviam se apropriado criminosamente, exatamente porque já tinham ciência de que os valores deveriam ser restituídos aos cofres do DF”, por ser fruto de crime.
Após o recebimento da verba do GDF, a cúpula da entidade passou a movimentar e transferir o dinheiro recebido para uma série de pessoas físicas e jurídicas desconhecidas. Ao todo, foram pelo menos 77 operações com objetivo de lavagem de dinheiro, de acordo com o MP e a Polícia Civil.
“O dinheiro desapareceu e nunca retornou aos cofres do DF, sendo ocultado e lavado por meio das operações ilegais.”
Possíveis novas fases
Ao fim da denúncia, o MP afirma que o material apreendido na segunda fase da operação “Genebra” (nome dado em referência à cidade suíça onde fica a sede da Cruz Vermelha Internacional) ainda está em análise. Por isso, pode haver novos desdobramentos da investigação.
Um dos alvos da última fase foi o setor de tecnologia da Secretaria de Saúde, com o objetivo de encontrar e-mails que pudessem servir como provas. Além disso, o MP diz na denúncia que a Justiça autorizou a quebra de sigilo bancário dos investigados. Estes dados também estavam em análise até a conclusão da denúncia do MP.