A comunidade médica recebeu com otimismo, mas também com cautela, o anúncio de que o estudo de fase 3 de um medicamento para Alzheimer conseguiu reduzir o declínio cognitivo e funcional provocado pela doença, em pacientes leves. A substância lecanemab, do laboratório Biogen, atingiu os objetivos do teste, segundo a companhia. O estudo será publicado em novembro e, por enquanto, a fabricante divulgou apenas dados preliminares em um comunicado para a imprensa e para investidores. As ações da empresa dispararam 46,6% em Nova York, após o anúncio.
O estudo tinha como desfecho primário a diminuição do declínio cognitivo e funcional dos pacientes, em comparação com o grupo placebo. Segundo o comunicado, ao fim de 18 meses, a redução foi de 27%. O principal objetivo secundário — níveis mais baixos da proteína amiloide no cérebro — também foi alcançado, disse a companhia. Enquanto essas alterações foram verificadas por exame de tomografia, a melhora clínica foi medida pela CDR-SB, escala numérica que avalia o desempenho em áreas como memória, orientação, julgamento, resolução de problemas e cuidados pessoais.
Com o aumento da longevidade, os casos de Alzheimer estão crescendo mundialmente. A organização Alzheimers’s Disease International, do Reino Unido, estima em 74,7 milhões os números globais em 2030. Atualmente, 55 milhões de pessoas vivem com algum tipo de demência. Apesar da intensificação, nos últimos 20 anos, das pesquisas nessa área, não existem medicamentos capazes de alterar o curso da doença. No ano passado, o Food and Drug Administration (FDA), órgão regulatório dos Estados Unidos, aprovou o aducanumab, também da Biogen, e sofreu críticas por isso, pois a substância não demonstrou qualquer benefício clínico nos testes.
O estudo Clarity AD foi realizado com 1.795 pessoas com Alzheimer precoce. Os participantes foram divididos entre tratamento e placebo, sendo que nem eles nem os médicos sabiam quem estava em qual braço da pesquisa. De acordo com a Biogen, a partir de seis meses já foi possível medir alterações positivas entre os que fizeram uso da substância. Em 18 meses, a tomografia apontou que 12,5% dos pacientes tratados tinham anticorpos que combatem a proteína beta-amiloide no cérebro. Esse percentual foi de 1,7% entre os demais.
“O anúncio dá aos pacientes e suas famílias esperança de o lecanemab, se aprovado, retardar a progressão da doença de Alzheimer e proporcionar um impacto clinicamente significativo na cognição e função”, disse Michel Vounatsos, CEO da Biogen. “É importante ressaltar que o estudo mostra que a remoção da beta-amiloide agregada no cérebro está associada a uma desaceleração da doença em pacientes no estágio inicial”, destacou, em comunicado. Uma das principais características dessa forma de demência é o acúmulo da proteína beta-amiloide, que vai criando placas no cérebro.
Peter Passmore, professor de envelhecimento e medicina geriátrica da Queen´s University, no Reino Unido, destaca que, como o estudo completo e revisado por pares ainda não foi publicado, é difícil, para médicos e cientistas, avaliar as informações fornecidas pelo comunicado da Biogen. “Inicialmente, é um resultado encorajador, pois há benefícios clínicos relatados, como o desfecho primário e todos os secundários sendo atendidos, ao que parece”, diz. Ele avalia, porém, que os benefícios, não detalhados na nota da companhia, não são tão grandes. “Parecem pequenos. Quando o estudo for publicado, o debate será em torno de quão clinicamente relevantes foram as mudanças na CDR-SB.”
Por Correio Braziliense