O câncer de pâncreas é especialmente difícil de tratar — apenas 8% dos pacientes ainda estão vivos cinco anos após o diagnóstico da doença. A quimioterapia e a radioterapia trazem benefícios limitados. E até mesmo a imunoterapia, que revolucionou o tratamento de outros tipos de tumores ao ativar o sistema imunológico para atacar células cancerígenas, se mostra ineficaz. Isso porque os cânceres pancreáticos têm meios de amortecer o ataque imunológico.
Agora, pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade de Washington, em St. Louis, e da Universidade Rush, em Chicago, ambas nos Estados Unidos, descobriram um composto químico que promove um vigoroso ataque imunológico contra esse câncer altamente letal. Sozinha, a substância reduz o crescimento do tumor pancreático, além das metástases, em camundongos. Mas quando combinada à imunoterapia, reduz significativamente os tumores e melhora dramaticamente a sobrevivência nos animais.
As descobertas, publicadas na revista Science Translational Medicine desta semana, sugerem que o composto poderia tornar os cânceres pancreáticos suscetíveis à imunoterapia e melhorar as opções de tratamento para os pacientes. “É uma doença altamente letal, e precisamos desesperadamente de novas abordagens terapêuticas”, frisa, em comunicado, o coautor David DeNardo, professor-associado da Escola de Medicina da Universidade de Washington. “Em estudos com animais, essa pequena molécula levou a melhorias muito acentuadas e foi até curativa em alguns casos. Estamos esperançosos de que essa abordagem possa ajudar pacientes.”
Na teoria, as imunoterapias para câncer de pâncreas parecem uma boa ideia. A técnica funciona liberando um freio em células imunológicas especializadas, chamadas células T, para que elas possam atacar o tumor. No passado, pesquisadores descobriram que podiam estimular as células T a matar os tumores de pâncreas. Mas, quando os médicos tentaram tratar os pacientes usando imunoterapias, menos de 5% deles melhoraram.
Esse fracasso da imunoterapia no câncer pancreático intriga os cientistas. Mas as células T não são o único jogador no ataque imunológico ao câncer. Células mieloides, outro tipo de soldado imune encontrado dentro e ao redor de tumores, podem conter ou aumentar a resposta imunológica. Elas atuam liberando moléculas que afetam as células T, impedindo a ação dessas contra o tumor. Nos cânceres pancreáticos, elas normalmente suprimem outras células do sistema imunológico, minando os efeitos da imunoterapia.
Reforço imune
DeNardo e os demais pesquisadores perceberam que acionar as células T pode não ser suficiente para tratar o câncer de pâncreas. Para tanto, seria necessário alterar o equilíbrio das células mieloides. A equipe identificou um composto, o ADH-503, que interfere na migração de células mieloides. Normalmente, os tumores pancreáticos estão cheios dessas estruturas, que suprimem a resposta imune. Mas quando os pesquisadores deram a substância a camundongos com a doença, o número de células mieloides dentro e perto dos tumores diminuiu, e as remanescentes foram do tipo que promoveu, em vez de suprimir, respostas imunes. Isso resultou em um número maior de células no tumor, crescimento do câncer significativamente mais lento e maior sobrevida.
Em seguida, os pesquisadores investigaram se, nesse cenário, os tumores ficariam suscetíveis à imunoterapia padrão. Primeiro, eles trataram camundongos com o chamado inibidor PD-1, usado para atacar outros tipos de câncer. Sem surpresa, eles não viram nenhum efeito. Mas quando deram aos camundongos a imunoterapia em conjunto com o ADH-503, os tumores diminuíram e os camundongos sobreviveram por mais tempo.
Em alguns experimentos, todos os cânceres desapareceram dentro de um mês de tratamento, e todos os ratos sobreviveram por quatro meses, quando os cientistas pararam de monitorá-los. Em comparação, os animais não tratados morreram dentro de seis semanas.
“Encorajador”
Vincent Gupta, coautor do trabalho, observa que, embora o câncer de pâncreas seja a terceira causa de morte relacionada ao câncer nos Estados Unidos, apenas cerca de 3% dos testes clínicos para imunoterapias contra o câncer visam esse tipo de tumor. “A promessa de imunoterapias para o câncer de pâncreas requer uma nova abordagem”, diz. “Acreditamos que esses dados demonstram que o direcionamento de células mieloides pode ajudar a superar a resistência a imunoterapias.”
A estratégia de aumentar a atividade imunológica antitumoral alterando o equilíbrio das células mieloide também melhorou a eficácia de outras terapias contra o câncer pancreático, segundo os pesquisadores. Os ratos tratados com quimioterapia ou radioterapia tiveram desempenho significativamente melhor quando o ADH-503 foi adicionado ao regime de tratamento. “Você não pode fazer uma tradução imediata entre estudos em animais e pessoas, mas isso é muito encorajador”, diz DeNardo. “Mais estudos são necessários para entender se o composto é seguro e eficaz nas pessoas, e é por isso que esse composto está entrando em fase I, que avalia a segurança em pesquisas com humanos, aqui em Washington”, adianta.