É possível que se olhe para os dias de hoje como um momento em que o Brasil começou a mudar. Mas, aqui e agora, não se nota nenhum ganho concreto
São Paulo — De um lado, nota-se que estão na cadeia na data de hoje, à espera de julgamento ou já condenados por corrupção e diversos crimes correlatos, um cidadão que até ser preso era o presidente da maior construtora de obras públicas do Brasil, um que foi duas vezes ministro (inclusive da Fazenda) nos governos dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff e outro, ainda, que foi governador do Rio de Janeiro.
Há um ex-presidente da Câmara dos Deputados e um ex-ministro da Casa Civil. Há ex-deputados, tesoureiros do partido que governou o Brasil durante 13 anos e ex-diretores da maior empresa estatal do país. Há dezenas de outros que passaram longas temporadas no xadrez e aguardam suas sentenças em prisão domiciliar. Há os que ainda não foram presos, mas correm alto risco de ser trancafiados em breve — um deles é o presidente do Senado Federal.
Há um ex-presidente da República respondendo a quatro denúncias penais. Há, enfim, uma horrorosa lista de acusados apresentada em delação pela já citada maior empreiteira de obras, que, por sinal, confessou a prática de uma penca de crimes por seus dirigentes e aceitou pagar uma multa de 6,7 bilhões de reais a título de compensação pelo que fez.
Essa lista inclui o atual presidente do Brasil, ministros de seu governo, peixes graúdos dos dois governos anteriores, senadores, deputados, governadores, prefeitos, situação, oposição — enfim, o difícil é achar alguém que esteja livre de acusações por algum tipo de ladroagem.
De outro lado, todos dizem: sim, mas as instituições estão funcionando. Então: copo meio vazio ou meio cheio? Essa discussão pode ir longe, mas na vida prática vai se tornando cada vez mais difícil achar algo de positivo nisso tudo que está acontecendo.
É como ver o lado bom do suicídio — não há, simplesmente, nenhum lado bom a considerar quando se constatam os efeitos materiais, neste momento, do processo de destruição causado diretamente pela corrupção maciça que controla o aparelho do Estado brasileiro desde 2003, com a chegada ao governo federal do ex-presidente Lula, de seu partido e de sua “base aliada”.
Esse processo, basicamente, consistiu na privatização do patrimônio e do rendimento públicos em favor de quem manda na máquina pública, de seus amigos e de sua clientela — e acabou por envolver todas as forças políticas em ação no Brasil, nos níveis federal, estadual e municipal, nas esferas do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.
É possível, no futuro, que se olhe para os dias de hoje como um momento em que o país começou a mudar, caso a reação contra o atual desastre político sirva para marcar o começo de reformas verdadeiras. Mas, aqui e agora, não se nota nenhum ganho concreto.
O que existe não é apenas uma calamidade moral. É uma devastação da economia que não encontra precedentes — e que não pode ser enfrentada, para valer e com possibilidade de sucesso, enquanto a política permanecer na situação em que está.
Estamos encerrando um terceiro ano seguido de recessão — ou de crescimento zero em 2014 seguido de recuos violentos em 2015 e 2016. Vamos, a não ser que aconteça algo de extraordinário (e logo), para um 2017 miserável. Isso jamais houve na história econômica do Brasil. As questões básicas em cima da mesa são bem evidentes. O nível de investimento atual na economia, por volta de 16%, é uma catástrofe.
A confiança no poder público é inexistente. As lideranças políticas não oferecem uma perspectiva mínima de estabilidade — como esperar algo de bom na economia se não se sabe, nem mesmo, se quem governa hoje estará governando amanhã?
Não é uma questão de política econômica, nem de qualidade da equipe que gere atualmente a economia, nem de posicionamento ideológico do governo; ao contrário, tem havido sucesso na aprovação de reformas indispensáveis para o país. É que falta um mínimo de condição política para o aparelho produtivo funcionar.
O copo está vazio.