Corpo vai ser cremado. Acidente com universitário, que militava por mobilidade, foi no sábado. Motorista tem 18 anos e ainda não prestou depoimento. Teste do bafômetro apontou que ele não estava embriagado.
Pai do ciclista da ONG Rodas da Paz que morreu no hospital um dia depois de ser atropelado por um carro, Helder Luís Rocha afirmou ver o caso como fatalidade e disse esperar que o motorista “supere” o ocorrido. Raul Aragão tinha 23 anos e estava a dois semestres de se formar em sociologia na Universidade de Brasília.
“Espero que o rapaz que continua vivo consiga superar isso, que vai ser uma coisa difícil para ele”, disse. “As pessoas, sempre que acontece uma coisa, querem vingança ou punição. Eu acho que não é o caso.”
“A culpa é de todos nós como sociedade, que, ao privilegiarmos o carro, a gente faz vias velozes para o automóvel, o que dificulta o deslocamento a pé ou de bicicleta.”
Acidente
O acidente aconteceu por volta das 14h30 de sábado (21) nas proximidades da entrequadra 406/407 Norte. Aragão voltava do restaurante universitário, onde havia ido almoçar, e pedalava em direção ao apartamento que dividia com a mãe. Ele atravessava a L2 Norte – cujo limite de velocidade é 60 km/h – quando foi atingido. O ciclista caiu no capô do carro.
O rapaz foi socorrido já desacordado pelo Samu. Ele foi transportado para o Hospital de Base, onde morreu às 4h10 deste domingo (22). O motorista, de 18 anos, permaneceu no local do acidente durante o resgate.
Em nota, a Secretaria de Saúde afirmou que “lamenta o falecimento de Raul Aragão”. Segundo a pasta, o jovem deu entrada no Hospital de Base às 14h10 de sábado (21) e, logo, foi internado na sala vermelha da unidade de saúde, em “estado gravíssimo”.
“O paciente apresentava traumatismo craniano, torácico e abdominal. Ao ser internado, apresentou uma parada cardiorrespiratória, foi reanimado e encaminhado ao centro cirúrgico. Raul foi operado, porém não resistiu”, detalhou a Secretaria de Saúde em nota.
O caso é investigado pela 2ª Delegacia de Polícia (Asa Norte). O motorista foi submetido a teste do bafômetro, que não indicou embriaguez. Não há informações sobre possível excesso de velocidade nem sobre se o condutor tinha ou não permissão para dirigir. O pai dele se apresentou na delegacia e pediu para que o depoimento do filho ocorresse em outra ocasião, porque o rapaz estava “muito abalado”.
O ciclista vai ser cremado. De acordo com a ONG Rodas da Paz, a cerimônia foi marcada para as 8h desta segunda-feira (23) na capela 5 do Cemitério Campo da Boa Esperança, na Asa Sul.
Amigo de Aragão, David Alexandre Melo diz que o jovem sempre esteve envolvido em causas relacionadas ao pedal e era “extremamente” engajado socialmente. Para ele, o rapaz foi “vítima daquilo contra o que sempre lutou”.
“Ele tinha carro, mas usava a bike majoritariamente. Sempre estava procurando criar novos eventos envolvendo a bike”, disse ao G1.
Aragão é de Recife (PE), para onde a mãe dele havia viajado. Ela retornou a Brasília às 20h deste sábado e recebeu o apoio de amigos e das duas irmãs do jovem. Melo, que conhecia o ciclista há dois anos e está hospedado na casa dele, disse que ninguém conseguiu dormir desde o ocorrido.
Entusiasta da bicicleta e estudante de sociologia, ele atualmente era responsável pela Coordenação de Contagens de Ciclistas da ONG Rodas da Paz. A organização surgiu em 2003 para “reagir à violência e ao crescente número de acidentes e mortes no trânsito”. Desde então, promove ações voltadas ao trânsito seguro.
Aragão também atuava na Bike Anjo, um coletivo de ciclistas que acompanham pessoas que querem começar a pedalar, dando dicas sobre comportamento e compartilhamento no trânsito e trazendo mais confiança para o iniciante. Ele costumava se caracterizar com nariz de palhaço nas ações.
O jovem participava atualmente de um levantamento sobre as condições das ciclovias no DF e se preparava para participar das Fixolimpíadas (evento de bikes fixas) em Recife entre 5 e 7 de novembro.
Reações
Em nota em redes sociais, a ONG Rodas da Paz lamentou o ocorrido. “Estamos muito, muito, muito tristes e isso não combina com a sua alegria. Ainda não dá, mas só queremos pensar no quanto foi bonito o nosso encontro. Em todas as fotos você está ou sorrindo ou compartilhando – carinho, informação, sua energia super positiva – ou, na maioria das vezes, as duas coisas ao mesmo tempo.”
“Valeu demais, Raulzito, um dos voluntários mais queridos e participativos da Rodas da Paz e de outros grupos voluntários. Assim que tivermos mais informações sobre as homenagens para ele, avisaremos. Mandem os melhores sentimentos e pensamentos para o Raul Aragão e sua linda família, a quem dedicamos todo nosso apoio. #VáemPazAmigo”
Também militante na causa, Uirá Lourenço se disse em choque com o ocorrido. “É um cara experiente, que usa a bicicleta no dia a dia há muito tempo, que ajuda, é voluntário tanto da Rodas da Paz quanto da Bike Anjo”, disse.
“É muito chocante. A imagem que tenho dele é do sorriso, de um cara alto-astral.”
Homenagens
O amigo David Alexandre Mello afirmou estar previsto um passeio ciclístico para 12 de novembro – dois dias antes do aniversário de Aragão – para homenageá-lo. A concentração vai acontecer no Museu Nacional.
Também deve haver uma homenagem na abertura da CPI da Previdência, na Câmara dos Deputados, nesta segunda-feira (23). A ONG Rodas da Paz informou em redes sociais que deve realizar eventos em memória ao jovem, ainda sem data definida.