Durante a investigação sobre uma organização criminosa com ramificações em pelo menos seis estados, a Polícia Civil e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) esbarraram em evidências de um ilícito ainda mais grave: a suspeita de que 17 policiais militares da capital do país se uniram no propósito de prender um traficante apenas para roubar o produto do crime. Essa apuração, realizada pela Divisão de Combate ao Crime Organizado (Draco), resultou nesta quinta-feira (6/6) na deflagração da Operação Dolus Manus, com a prisão preventiva de 13 PMs e o cumprimento de 17 mandados de busca e apreensão em vários endereços, como as residências dos policiais, os batalhões onde estão lotados, a Casa Militar do governo do DF e o Centro de Inteligência da Polícia Militar do DF.
A história é tão crítica que, embora o MPDFT e a PCDF tenham pedido a prisão temporária dos policiais militares, a Auditoria Militar, órgão do Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios, decretou a preventiva, que pode persistir até a conclusão do trâmite judicial. A apuração indica que os PMs em questão se esforçaram para prender o criminoso Antônio César Campanaro, o “Toninho do Pó”, porque queriam roubar parte da droga que o traficante pretendia vender. Havia a indicação de que ele transportaria um carregamento com 500kg de maconha e foi, então, montada uma operação para interceptá-lo.
Segundo os investigadores, os policiais militares criaram um grupo no WhatsApp com o nome de “Op. Five Hundred”, da qual participavam policiais militares da Patamo, de batalhões operacionais e do Centro de Inteligência da PM. Quatro policiais que trabalham nessa área também tiveram a prisão requerida na Operação Dolus Manus, mas a Justiça considerou que não havia por ora elementos para decretá-la. Eles, no entanto, foram alvo de mandados de busca e apreensão, segundo decisão dos juízes Henaldo Silva Moreira e Alessandro Marchió Bezerra Gerais.
A suspeita é de que Toninho do Pó fugiu algemado após ser preso por policiais militares. Uma vizinha, moradora da chácara onde houve apreensão da droga que pertenceria ao traficante, relatou tê-lo visto em uma viatura da PM na companhia de quatro policiais militares fardados. A cena despertou seu interesse, mas ela foi advertida por um dos PMs para que não se aproximasse, segundo depoimento que prestou à Polícia Civil.
Segundo a investigação, Toninho do Pó foi preso e torturado para que entregasse a droga. Ao registrarem ocorrência na 20ª DP, os policiais militares apresentaram apenas parte da apreensão. Dos 500kg de maconha, entregaram 203,5kg. Também não entregaram nenhum preso.
Tortura
A movimentação dos policiais militares apareceu em meio à investigação sobre a atuação de Toninho do Pó, a Operação Torre de Babel. Pessoas próximas ao traficante, que estavam com o telefone grampeado com autorização judicial, relataram o episódio. Sem saber que suas conversas eram interceptadas, a filha do criminoso contou para a tia que o pai havia sido sequestrado e torturado por policiais militares. “Queriam tipo uma propina para soltar ele, só que aí ele pegou e conseguiu fugir, fugiu algemado”, contou. Um suposto fornecedor de drogas também falou sobre o ocorrido e o transporte dos 500kg da droga.
Os policiais militares foram levados para um ala reservada a militares no sistema penitenciário de Brasília, no prédio conhecido como Papudinha. Eles vão responder por crimes de corrupção passiva, organização criminosa, embaraço à investigação de organização criminosa, tortura, tráfico de entorpecentes, prevaricação e fraude processual.
Os mandados de prisão e de busca e apreensão foram cumpridos por policiais da Coordenação de Combate à Corrupção, ao Crime Organizado, aos Crimes contra a Administração Pública e contra a Ordem Tributária (Cecor), promotores de Justiça do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e pela Corregedoria da Polícia Militar. A denúncia está sob a responsabilidade do promotor Nísio Tostes, da 1ª Promotoria de Justiça Militar do DF.