Governo diz que espaço serve como reuniões de trabalho; região está sob racionamento.
Mesmo sem ter nenhum morador desde o início de 2015, a Residência Oficial de Águas Claras – construída para funcionar como moradia do governador do Distrito Federal – custou, em dois anos, pelo menos R$ 823 mil aos cofres públicos da capital.
Atual chefe do Executivo, o governador Rodrigo Rollemberg não mora no local e usa o Palácio do Buriti, no centro de Brasília, para a maioria dos despachos. Em nota, a Casa Militar do DF afirma que, apesar disso, o espaço é usado para reuniões de trabalho da governadoria e de outros órgãos. O GDF não informou quantas reuniões foram feitas nos últimos dois anos, nem a quantidade de pessoas presentes nesses encontros.
O prédio fica próximo ao novo Centro Administrativo, que foi “inaugurado” (sem móveis e internet) no último dia do governo Agnelo Queiroz, mas nunca chegou a ser ocupado de fato. Os gastos com a residência oficial coincidem com um período de grave crise fiscal no governo do DF, com rombos – divulgados pelo próprio governo – na casa dos bilhões de reais.
Apesar do cenário caótico nas contas públicas do governo, apenas em 2016, R$ 317 mil foram desembolsados para manter a estrutura da residência oficial. Gastos com a água superaram R$ 104 mil, e as despesas com alimentação atingiram a cifra de R$ 119 mil. Já os serviços de manutenção na estrutura custaram R$ 94 mil ao erário, ao longo de 12 meses.
Em 2015, o custo estimado da Residência Oficial foi ainda mais alto: R$ 506 mil. Só com manutenção, o governo gastou mais R$ 259 mil. Água e alimentação custaram R$ 121 mil e R$ 126 mil, respectivamente.
Questionado sobre os itens que compuseram a lista de alimentos nos dois últimos anos, a Casa Militar limitou-se a dizer que os gastos se referem a “itens de consumo geral como arroz, feijão, café, óleo de soja, biscoitos, sucos, leite e etc…”. A quantidade de itens comprados e a especificação da cesta de alimentos não foram fornecidas pelo governo.
Conta cara
O especialista em administração pública da UnB José Matias Pereira avaliou que a situação da Residência Oficial de Águas Claras é “típica”, e se repete em outras regiões do país. “O que nossos representantes precisam entender é que eles têm que dar exemplo”, opinou o professor.
Segundo ele, quando o governador decidiu não mais usar a residência oficial como moradia, um plano deveria ter sido feito para “enxugar ao máximo” todas as despesas.
“A preocupação deveria ser apenas com a conservação do patrimônio público. Quem paga esse cenário totalmente inadequado é o contribuinte.”
Crise hídrica
Ao longo do último, a residência oficial consumiu cerca de 750 mil litros de água por mês. O volume corresponde ao esperado para 75 casas de médio porte, e seria suficiente para abastecer uma escola com até 500 alunos. A comparação foi feita pelo especialista em recursos hídricos e professor da UnB Sérgio Koi.
“Um ‘palácio’ como é aquele costuma gastar muita água, principalmente por conta da irrigação dos jardins. Mas, de toda forma, é inadmissível um consumo tão alto com água na residência oficial.”
Segundo o professor, o governo deveria adotar medidas para conter o consumo desenfreado de água. “Em primeiro lugar, os jardins deveriam ser substituído para ter plantas mais resistentes à seca. Não faz sentido gastar tanta água com irrigação. Depois, as tubulações deveriam ser trocadas. Deve ter muito desperdício por conta do material velho que são feitas”, disse.
Sobre o consumo de água, a Casa Militar afirmou que, na comparação entre 2014 e 2015, o governo conseguiu reduzir 37% dos gastos. A pasta disse ainda que as ações de economia de água têm sido intensificadas frente à crise hídrica.
Desde o último dia 16, regiões abastecidas pela bacia do Descoberto, a maior do DF, estão sujeitas a um regime de racionamento de água. Os cortes de 24 horas acontecem a cada seis dias, sendo que a água pode demorar até 48 horas para chegar às torneiras após o religamento. A região de Águas Claras, onde fica a residência oficial, faz parte do esquema de restrição.
Estrutura
A Residência Oficial de Águas Claras ocupa 60 hectares, com cerca de 5 mil m² de área construída. Segundo a Casa Militar, 22 servidores trabalham no local, sendo 2 militares e 20 civis.
Em julho, o governo lançou um projeto chamado “Residência Oficial de Portas Abertas”. O programa prevê a abertura do espaço ao público. Desde então, às segundas feiras, áreas internas (salas de jantar, estar e de reuniões e o gabinete privativo) e externas (capela, auditório e quadras, por exemplo) têm acesso liberado.
A residência oficial de Águas Claras foi construída em 1961, originalmente com o nome de “Granja-Modelo 05”. O primeiro morador foi o presidente da Novacap à época, Randall Espírito Santo. Antes de receber o atual nome, o local se chamou residência Vicente Pires e granja Águas Claras.
Durante a década de 1960, a residência de estrutura serviu de casa para funcionários do alto escalão da Novacap e da prefeitura do Distrito Federal. O imóvel passou a ser ocupado pelo prefeito de Brasília e, posteriormente, tornou-se residência do governador do DF.