Governo pretende levar a denúncia para ser votada em plenário na véspera do recesso para que a oposição não alcance os votos necessários
O presidente Michel Temer desembarcou em Brasília no fim de semana disposto a lutar até o fim para manter o mandato, apesar de todos os fatores adversos. Quem esteve com ele garante que nunca viu tanta valentia. Do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), Temer obteve o compromisso de que os deputados só entrarão em férias depois de decidirem se concedem ou não autorização para que seja processado no Supremo Tribunal Federal por corrupção passiva. O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), entretanto, avisou que, se a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) estiver pronta para ser votada em 17 de julho, ele colocará em pauta e aí, o recesso será automático. “Não desejo, em tempo de crise, fazer recesso branco”, disse. Com a espada da LDO estreitando os prazos e os deputados ávidos pelo recesso, o governo colocará a base para acelerar o passo na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara, apostando nas ausências em plenário na etapa posterior. O raciocínio do governo é simples: quem precisa ter 342 votos para autorizar o processo é a oposição. E, colocar a denúncia para ser votada no apagar da luzes, será o teste de fidelidade de Maia.
Com o cenário desenhado, Temer passou o dia ontem dedicado a cuidar dos votos e do quórum necessários para tentar ultrapassar o primeiro obstáculo: a Comissão de Constituição e Justiça. Ali, nos bastidores, o governo joga com o seguinte argumento: admitir que Temer seja investigado é votar a favor do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, aquele que quer processar o presidente da República, deputados, senadores, mas livrou o empresário Joesley Batista de qualquer problema. Nesse palco, em que o relator, Sérgio Zveiter (PMDB-RJ) apresentará hoje o parecer sobre a denúncia, o governo espera ter pelo menos 38 votos, apesar do quadro de desconforto com nomes de peso dentro do PSDB pregando que o partido entregue os cargos. Ontem, foi a vez do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e do prefeito da capital paulista, João Doria, engrossarem o coro pelo afastamento do PSDB do Executivo.
“Não defendo que o PSDB se mantenha no governo. Defendo que o PSDB tenha um olhar para o Brasil, e como fazer para que as reformas continuem”, afirmou Doria à Agência Estado. Alckmin, entretanto, foi mais brando ao dizer que o partido deve deixar o governo “depois das reformas”. Hoje, os tucanos farão novas reuniões para tentar unificar o discurso em relação à postura. Em conversas reservadas, deputados da sigla têm dito que o presidente em exercício da legenda, senador Tasso Jereissati (CE), e o vice-presidente do Senado, Cássio Cunha Lima (PB), se anteciparam ao defender que o PSDB abandone Temer à própria sorte. O raciocínio é que o PSDB pode até sair mais à frente, mas não pode ser acusado de ter sido o algoz do presidente no campo político e, com tantas declarações desencontradas, o partido está cumprindo esse papel.
Traição
A divisão no PSDB foi assunto ontem à noite no Palácio da Alvorada. Para os mais fiéis escudeiros de Michel Temer, está claro que os tucanos “traíram” e vão trair o governo, não só na CCJ, na qual o líder na Câmara, Ricardo Tripoli, já avisou que não trocará deputados nem para ajudar, nem para atrapalhar. A atuação chegou ao ponto de o presidente Temer telefonar para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso a fim de explicar a visão a respeito da denúncia de Rodrigo Janot e, ao mesmo tempo, tratar de presidente para presidente do desconforto de ver aliados entregando o governo à própria sorte neste momento tão difícil.
A avaliação é a de que, sem o PSDB, Temer terá de jogar todas as fichas nos partidos do Centrão e, ainda, cuidar para que o PMDB não se deixe levar pelo canto dos apoios eleitorais em 2018 a cargos majoritários. Ao presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), já foi oferecida vaga de candidato a governador de Minas Gerais por outras legendas. O que o governo deseja de Pacheco nesta segunda-feira é a garantia da leitura do relatório de Zveiter. Para ter quórum, todos os governistas da CCJ receberam ontem telefonemas de líderes que estavam no Alvorada com a ordem expressa: antecipem seus voos para ter número suficiente à tarde na comissão. Com quórum, Zveiter poderá ler o relatório. A presença hoje à tarde, aliás, é considerada o primeiro sinal de apoio ao governo. A contagem será possível porque a oposição, leia-se PT e partidos de esquerda, pretendem derrubar a sessão.
Paralelamente à busca do quórum de 34 deputados, metade mais um dos 66 integrantes da CCJ, o governo passou a tarde em construção de cenários. Se Zveiter apresentar um relatório contrário ao Planalto, os aliados de Temer prometem preparar outro em defesa do presidente. Embora seja difícil derrotar um parecer da lavra de um peemedebista, a ideia do Planalto é saber quem dali o governo poderá contar em qualquer circunstância. Afinal, se um deputado do PMDB apresentar um parecer favorável ao Ministério Público Federal e ao procurador Rodrigo Janot, vai ficar difícil o presidente convencer os outros partidos a permanecerem ao lado do governo.
342
Quantidade de votos para aprovar a admissibilidade da denúncia
O caminho na Câmara
Segunda-feira
» O presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), abre, às 14h, a sessão para leitura do parecer do deputado Sérgio Zveiter (PMDB-RJ) sobre o pedido para que o presidente Michel Temer seja investigado por crime de corrupção passiva. Terminada a exposição do relator, a defesa de Temer terá o mesmo tempo para apresentar as alegações. Feito isso, serão concedidas vistas coletivas aos membros do colegiado pelo prazo de duas sessões.
Quarta e quinta-feira
» Rodrigo Pacheco abrirá a fase de debates, na qual todos os 66 integrantes da comissão terão direito à palavra. Cada um terá o tempo de 15 minutos. Depois, será dada a palavra a outros 40 parlamentares não membros: 20 a favor e 20 contra, sendo 10 minutos para cada orador. Após esse período, que deve levar dois dias, o relator e a defesa terão mais 20 minutos cada.
Apreciação
» Se tudo correr dentro do cronograma, a votação ocorrerá, no mais tardar, na sexta-feira, deixando para a próxima semana a apreciação do caso no plenário da Câmara. Se houver atrasos, a votação na CCJ ficará para a semana que vem. Segundo Pacheco, é a dinâmica das sessões que ditará o ritmo dos trabalhos.