Audiência de instrução é nesta sexta, quando Justiça ouve todos os lados envolvidos. Decisão não tem data prevista; defesa afirma que “não houve ilícito” na atuação do delegado.
A Justiça do Distrito Federal começa a ouvir nesta sexta-feira (26) as partes do processo em que o delegado de Santa Maria, Rodrigo Larizzatti, é acusado de desobediência, de ignorar uma denúncia de estupro e de impedir acesso a arquivos. Não há prazo definido para que uma sentença seja divulgada no caso.
Essa primeira parte do julgamento é chamada de audiência de instrução. O objetivo é apresentar à Justiça os lados do Ministério Público, da defesa, das testemunhas e do próprio delegado, a fim de chegar a uma sentença.
O advogado do delegado, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Brasília, Juliano Couto, informou que “nenhum ilícito” foi praticado por Larizzatti na condução dos trabalhos. À época em que foi processado pelo MP, o delegado se disse surpreso com a denúncia e negou ter demorado para entregar documentos.
Sobre o crime de desobediência, o MP argumenta que o delegado se negou a abrir investigação para apurar um relato de violência sexual envolvendo uma criança e uma adolescente.
Em um segundo episódio, o MP diz que ele não deixou promotores conferirem a documentação sobre o caso de uma adolescente vítima de violência sexual, que engravidou e teve o filho do agressor (entenda as acusações abaixo).
A denúncia foi oferecida à Justiça pelo MP em dezembro de 2016. O delegado se tornou réu no fim de janeiro. Por decisão do juiz do caso, Germano Oliveira de Holanda, o processo foi desmembrado: ou seja, ele vai julgar as questões criminais. A suspeita de prevaricação – deixar de cumprir dever imposto pelo cargo – será apreciada pelo 2º Juizado Especial de Santa Maria.
Em abril deste ano, o delegado chegou a entrar com habeas corpus para encerrar este processo. Ele alegou que estava sendo perseguido, defendeu que não existia nada que justificasse uma condenação e ainda justificou que estava sobrecarregado na delegacia porque a Polícia Civil conta com o mesmo efetivo desde 1993.
O pedido dele foi negado pela 1ª Turma Criminal do TJ. Para a desembargadora Sandra De Santis, relatora do caso, existe sim base para a denúncia e justificativa para a continuidade do processo. “O trancamento da ação penal por habeas corpus é medida excepcional, cabível somente se inexistirem dúvidas sobre a ocorrência do ilícito ou se o fato for atípico.”
Entenda a denúncia
O MP diz que em 14 de setembro deste ano pediu para que a delegacia abrisse inquérito para apurar um relato de violência sexual envolvendo uma criança e uma jovem. “Em que pese a gravidade dos fatos e a urgência que exigia, o delegado ignorou e desobedeceu a ordem para abrir o inquérito”, afirmam cinco promotores que assinam a acusação.
No segundo caso mencionado, a Promotoria de Defesa da Mulher pediu ao delegado todos os arquivos relacionados ao caso de uma adolescente vítima de violência sexual, que engravidou e teve o filho do violentador. Segundo os promotores, “o delegado sonegou os documentos […] e demonstrou desprezo pelo ordenamento jurídico, pelas vítimas e pelas autoridades constituídas”.
No terceiro, o MP diz que o delegado deixou de praticar, indevidamente, um ato de ofício para “satisfazer interesses e sentimentos pessoais”. Segundo o órgão, uma mulher foi à delegacia pedir medida protetiva de urgência contra um agressor, mas ele sequer instaurou inquérito policial ou encaminhou ao MP o pedido da vítima.
“Diante da inércia do denunciado [Larizzatti] em cumprir suas obrigações legais, a vítima daquela ocorrência policial correu sério risco de que algo pior acontecesse, já que permaneceu sendo perseguida pelo ofensor e novos episódios de violência se sucederam, colocando em perigo não somente sua vida, mas também a dos filhos menores do casal”, afirmam os promotores.
Também na denúncia, o MP relembra que Larizzatti, quando esteve na Corregedoria da Polícia, arquivou um caso contra um policial por entender que faltavam provas que incriminassem um colega por extorsão. O policial foi depois condenado a 13 anos de prisão está detido na Papuda.
Naquele mesmo dia, ele estava fazendo campanha para a presidência da Associação dos Delegados de Polícia do DF e postou uma foto do compromisso particular nas redes sociais. Em nota, o sindicato disse que “não houve qualquer recusa, omissão ou sonegação” por parte do delegado e que há “arbitrário abuso de poder” praticado pelos promotores. Também na internet, ele compartilhou um post com críticas ao MP afirmando que o órgão “trouxe o terror institucional”.
Em janeiro, ele já tinha publicado em redes sociais um vídeo em que criticava a liberação pela Justiça de um casal suspeito de tráfico de drogas menos de 24 horas após a prisão em flagrante. Na mensagem gravada à época em que chefiava a 4ª DP (Guará), Larizzatti faz referência ao rito das audiências de custódia, aplicadas desde fevereiro no país e desde outubro na capital federal.
“Pasmem, [foram soltos] sem fiança. Trabalho árduo, passamos a madrugada na rua para prender traficantes de drogas, conseguimos uma prisão com filmagens, com drogas apreendidas. Crack, no caso. E um dia depois, os dois são colocados em liberdade porque são traficantes que não integram organização criminosa. Isso é uma vergonha, é um absurdo, é ridículo. Pois bem, esse é o país em que você vive”, diz o então delegado-chefe da unidade.