Quando chegou há dois anos em João Pessoa para fazer faculdade, o pernambucano Luiz Henrique Pessoa, de 21 anos, levava uma pequena mala e o dinheiro que recebeu de aulas particulares. “Se o processo de concessão de bolsas fosse demorado, teria de trancar a matrícula e voltar ao Recife. Confiei que daria certo, e deu”, diz o aluno de Medicina da Universidade Federal da Paraíba. Com o atual cenário de verbas restritas nas instituições, ele se esforça para manter o otimismo.
O receio de Luiz, assim como de milhares de alunos nas federais, é que faltem recursos para a assistência estudantil no próximo ano. A proposta do governo para o orçamento das universidades em 2020 inclui recursos que não estão em caixa. Diferentemente de outros anos, o montante previsto para as instituições só vai se materializar caso o governo receba aval do Congresso para “quebrar” a norma batizada de regra de ouro.
O mecanismo, criado para garantir a saúde das contas públicas, impede a contratação por parte do Executivo de empréstimos para pagar despesas correntes, como salários e contas de luz. É o primeiro ano em que o orçamento das universidades, de R$ 54 bilhões, mostra uma cifra que ainda não existe. Essa fatia corresponde a R$ 7,9 bilhões, 15% da proposta orçamentária para 2020.
Cenário
Reitores também estão preocupados. Presidente da Comissão de Orçamento da Associação Nacional dos Dirigentes de Institutos Federais de Ensino Superior (Andifes), Sérgio Cerqueira diz que aproximadamente 40% do orçamento discricionário das universidades, como são chamadas as despesas não obrigatórias, depende dessa segunda aprovação no Legislativo.
Nesse grupo, estão incluídas as despesas com serviços terceirizados, como segurança e limpeza, e também os programas de assistência estudantil. Os porcentuais variam conforme a universidade. Pelas contas da Andifes, com o orçamento “tradicional”, que não está condicionado a uma segunda votação de parlamentares, seria possível financiar as contas somente até setembro.
“O fato é que não estamos seguros com relação aos recursos que vão chegar”, constata Cerqueira. Embora R$ 7, 9 bilhões da proposta do orçamento de 2020 dependam de uma segunda rodada de negociações com parlamentares para a quebra da regra de ouro, o Ministério da Educação (MEC) considera que o recurso está garantido. Oficialmente, a pasta diz que no projeto para 2020 o orçamento das universidades terá aumento de R$ 5,2 bilhões, se comparado ao de 2019.
Mas para a maior parte dos reitores, o que vale é o que está no orçamento “real”. Por esse critério, o projeto de lei de orçamento de 2020 é R$ 2,8 bilhões menor do que o de 2019. A verba curta se soma ao problema que ocorre todos os anos – o contingenciamento (bloqueio).
“As dificuldades vão se somando e a situação, agravando-se ano a ano”, diz Cerqueira, reitor da Universidade Federal de São João Del Rei (MG). Para ele, não há dúvida de que isso acaba afetando a qualidade de ensino.
Tramitação
O MEC afirmou, em nota, que o Projeto de Lei Orçamentária para 2020 ainda está em tramitação no Congresso e, por isso, está sujeito a alterações por emendas de parlamentares. A pasta trabalha com valores totais da proposta apresentada ao Legislativo, incluindo valores descritos no orçamento “tradicional” e a proposta sob “supervisão” dos parlamentares — a fatia do orçamento que só poderá ser liberada caso haja autorização para a emissão de dívida.
Assim, para o MEC não há queda da verba para assistência. Na proposta de lei orçamentária, o orçamento para a assistência estudantil é de R$ 1,07 bilhão, mesmo valor de 2019.